terça-feira, junho 18, 2013

Caos na obstetrícia do RN: partos no Hospital Santa Catarina estão sendo realizados na sala de exames

Com enfermarias lotadas e três salas de partos ocupadas com parturientes, mulheres não tem para onde ir. Foto: Heracles DantasCom o fechamento da Maternidade Professor Leide Morais, o Hospital Doutor José Pedro Bezerra, conhecido como Hospital Santa Catarina, passou a ser a única unidade a receber as parturientes da zona Norte, principalmente aquelas do parto de risco habitual, ou seja, pacientes de baixo risco que deveriam ter o seu atendimento garantido pela rede municipal de saúde, bem com as dos municípios do litoral Norte do Estado. Na manhã de hoje (18), as três salas de parto do Centro Obstétrico do Hospital Santa Catarina estavam ocupadas com puérperas, pacientes que já tinham realizado o parto, mas como não tinha vaga nos leitos de enfermarias, permaneceram nas salas, impossibilitando a realização de novos partos.

No entanto, por volta das 10h de hoje, a dona de casa Maria da Conceição, que mora no município de Ceará-Mirim, grávida do décimo filho, entrou em trabalho de parto. Ela conta que procurou o Hospital de Ceará-Mirim na noite de ontem (17), e como tem 39 anos, a médica de plantão se recusou a fazer o parto e a encaminhou para o Hospital Santa Catarina. Ela chegou à unidade por volta da meia noite e ficou sentada em uma cadeira, que funciona como um leito, até a hora do parto. Com mais de nove centímetros de dilatação, o parto de Maria da Conceição tinha que ser realizado às pressas.

Como as três salas de parto estavam ocupadas, não houve outra escolha para a equipe médica: realizar o parto na sala de exames e triagem. O birô de atendimento dos médicos serviu como mesa de apoio para os equipamentos e material do parto.  A mesa de exame se transformou em mesa de parto. “A sala é um ambiente completamente inadequado para um parto, mas é necessário fazer”, afirmou a obstetra Walkiria Caldas, que fez o parto de Maria da Conceição.

O parto de Maria da Conceição durou mais de 30 minutos, em virtude de uma complicação. Enquanto a paciente ocupava a sala de exames, a estudante Clara Félix chegou ao Hospital tendo sido encaminhada pela Maternidade das Quintas. Aos nove meses de gestação, com uma gravidez de alto risco, em virtude de uma hipertensão gestacional, Clara teve que esperar por mais de uma hora para que os médicos a examinassem, já que os profissionais estavam realizando o parto de Maria da Conceição, uma gestação de risco habitual. Reclamando de fortes dores, Clara esperou atendimento em uma maca do Samu, que ficou presa no Hospital, por não ter leito para a paciente, já que a condição dela não permitiria que esperasse em uma cadeira.

“Eu moro na Redinha e fui para as Quintas porque já sabia que a situação estava precária aqui. Mas quando cheguei lá, me encaminharam para cá e agora estou aqui, com muitas dores, sem atendimento e em uma maca no chão. Isso é uma vergonha. Um momento tão esperado por mim está se transformando num momento de dor e tristeza”, desabafou a estudante Clara Félix.

A dona de casa Amanda Rochelle, de 22 anos, mora no bairro de Nossa Senhora da Apresentação, na zona Norte de Natal, e está grávida do terceiro filho. Desde sábado (15), ela está internada no Centro Obstétrico do Hospital Santa Catarina, pois está com o nível do líquido amniótico baixo. “Desde então, a única coisa que faço é tomar soro. Hoje eu consegui uma maca, mas até a madrugada estava sentada em uma cadeira, sem lençol, com frio e com fortes dores”, desabafa a gestante. Ela está no oitavo mês de gestação e conta que está apenas com 1,5 centímetro de dilatação. “Eles não querem fazer a minha cesárea e, enquanto isso, eu fico agonizado em dor, nessas péssimas condições”.

Hoje, o Centro Obstétrico conta com uma capacidade para 12 leitos de enfermaria, mas estava com 30 pacientes internadas. Com todos os leitos de enfermarias e pré-partos ocupados, as seis cadeiras que ficam dentro do Centro Obstétrico se transformaram em seis leitos improvisados, inclusive com os suportes de soro afixados próximo a cada cadeira.

Médicos relatam o caos

O obstetra Walmir Camilo conta que a situação nos últimos meses está sempre variando de “caótica a ruim”. “A nossa rotina é essa. Tem dias menos ruins (sic) e dias menos piores (sic), mas sempre superlotação, principalmente com pacientes vindos do interior. A nossa especialidade são as pacientes de alto risco, mas a grande maioria são pacientes de baixo risco e não podemos deixar de recebê-las”. Desde a quinta-feira [13], quando a Maternidade Leide Morais foi fechada, o médico disse que a situação continua o mesmo caos.

O médico foi taxativo ao dizer como é trabalhar em meio a esse caos: “estressante”, revela o obstetra. “Nós somos a única maternidade do Estado de alto risco e funcionamos numa situação física que é um corredor. Temos um espaço físico reduzido, com a presença de acompanhantes e às vezes chega a ficar mais de 60 pessoas num mesmo local, que não comporta, o que torna o ambiente ainda mais estressante. A nossa estrutura física é totalmente inadequada”, disse.

O obstetra Ildeberto Brito acredita que enquanto Estado e municípios não se unirem para criar um cinturão ao redor da Região Metropolitana de Natal garantindo a assistência obstétrica nos municípios, o problema só aumentará. “Se não colocarem pelo menos um obstetra, pediatra e anestesista de plantão nos hospitais dos municípios não conseguiremos resolver esse problema nunca”, afirmou o Ildeberto Brito.

O Hospital Santa Catarina fica localizado na zona Norte de Natal e tem o seu setor de Obstetrícia como referência estadual em gestação de alto risco. A unidade possui 237 leitos no total, sendo 61 deles de obstetrícia, especialidade que no período de 10 a 17 de junho realizou 347 atendimentos.  “O Hospital Santa Catarina sozinho não pode receber toda a demanda, pois se tentar fazê-lo a paciente de alto risco não vai ter onde ter o seu parto assegurado”, disse Luiz Roberto Fonseca, durante entrevista coletiva realizada ontem.

Atendimento na Maternidade das Quintas ainda é tranquilo

O movimento da Maternidade das Quintas, localizada na zona Oeste de Natal, esteve tranquilo durante toda a manhã de hoje. No entanto, segundo a direção da Maternidade, desde quinta-feira da semana passada, quando a Maternidade Leide Morais foi fechada, houve um acréscimo de aproximadamente 15%. Diante do crescimento da demanda, a unidade, que contava com 30 leitos obstétricos, abriu mais dez leitos e a expectativa é que até sexta-feira (21) mais sete leitos sejam abertos.  Para isso, profissionais e equipamentos da Maternidade Leide Morais estão sendo transferidos para as Quintas.

A diretora da Maternidade das Quintas, Aloma Tereza Fonseca, conta que a unidade é responsável por atender parturientes de risco habitual e que as gestantes com gravidez de alto risco estão sendo encaminhadas para a Maternidade Divino Amor, em Parnamirim, já que a Maternidade do Hospital Santa Catarina está superlotada. A diretora conta ainda que há um grande número de pacientes do interior do Estado, o que corresponde a cerca de 30% dos atendimentos.

A Maternidade das Quintas conta com um centro cirúrgico e duas salas de parto. Na manhã de hoje, durante o momento em que a reportagem esteve na unidade, não havia nenhuma mulher em trabalho de parto e as duas salas estavam desocupadas. “Estamos nos organizando para dar todo o suporte necessário nesse momento tão difícil para a assistência obstétrica do Estado, em especial Natal”, afirmou a diretora Aloma Tereza Fonseca.

Reprodução Cidade News Itaú

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