quarta-feira, abril 05, 2017

TJ do DF absolve três por fraudes no gramado do Mané Garrincha

Vista interna do estádio Mané Garrincha, em Brasília (Foto: Tony Winston/GDF)

A Justiça do Distrito Federal decidiu absolver três ex-gestores da Novacap, acusados pelo Ministério Público de obter vantagens ilícitas na contratação do gramado do estádio Mané Garrincha. O material foi instalado em 2013, quando a capital federal se preparava para receber a Copa do Mundo. Cabe recurso.
Segundo a ação do Ministério Público, os administradores "admitiram, possibilitaram e deram causa a modificações e vantagens, inclusive prorrogações contratuais, a favor da empresa". Na sentença emitida na última quinta (30), a juíza da 5ª Vara Criminal Ana Claudia Barreto disse não ver provas da conduta criminosa dos três citados.
"As alterações contratuais foram precedidas das verificações habituais, pelas áreas técnica e jurídica, inexistindo, portanto, prova de que os réus agiram dolosamente, provocando alterações contratuais que visassem prejudicar a administração pública, nem tampouco beneficiar a empresa Greenleaf", diz a sentença.
O G1 não conseguiu contato com a empresa Greenleaf e nem com os três ex-gestores citados no processo – o ex-presidente da Novacap Nilson Martorelli, a ex-diretora de obras Maruska Lima Holanda e o ex-gerente de fiscalização Luiz Rogério Gonçalves, que ainda tem cargo na empresa. Questionado nesta terça-feira (4), o MP não informou se pretende recorrer da decisão.
Na sentença, a juíza da 5ª Vara Criminal acata os argumentos de um técnico da empresa contratada, Greenleaf. Em depoimento, ele disse que a grama contratada inicialmente foi substituída por outra variedade – mais cara, e mais adequada ao clima tropical – com base em experiências negativas vistas no estádio do Grêmio, em Porto Alegre.

Colunas de sustentação da cobertura do estádio Mané Garrincha, em detalhe (Foto: Andre Borges/GDF)Colunas de sustentação da cobertura do estádio Mané Garrincha, em detalhe (Foto: Andre Borges/GDF)
Colunas de sustentação da cobertura do estádio Mané Garrincha, em detalhe (Foto: Andre Borges/GDF)

"É possível concluir que também não se adaptariam ao clima do nosso cerrado, especialmente com a acentuação do calor que todos temos notado (e mesmo sofrido!) na última década", diz a magistrada.
"Também se equivoca o Ministério Público ao comparar (fl. 1045) o preço da semente de grama com o do rolo de grama. Por óbvio que a semente é mais barata que o metro quadrado da grama já plantada em rolo!", afirma, em outro trecho, ao se referir a outras mudanças entre o projeto inicial e a obra executada.
Ao comentar outra suposta falha apontada pelo MP – a contratação de uma camada adicional de brita por R$ 200 mil para conter o excesso de água no gramado –, a juíza Ana Claudia Barreto afirma que a Greenleaf não tinha controle de outras obras em andamento no Mané Garrincha e, "por azar, ocorreram chuvas fortes" naquele período.
"Por incrível coincidência, esta sentença está sendo redigida também durante um ano absolutamente atípico no regime de chuvas, quando estamos vivenciando, pela primeira vez na história do Distrito Federal, um racionamento d'água. Todavia, nos últimos dias, notadamente no dia 28/3/2017, ocorreram chuvas fortíssimas, causando alagamentos em diversos pontos."
Série de irregularidades
Segundo a ação do Ministério Público, as irregularidades começaram antes mesmo do plantio da grama. A Greenleaf venceu a licitação, em 2012, e assinou contrato, em 2013, prometendo uma espécie de grama que não tem registro no Ministério da Agricultura. Também disse que faria o plantio por semeadura – técnica que dá mais trabalho, mas tem custo menor.

Gramado do Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília (Foto: Lucas Magalhães/Globoesporte.com)Gramado do Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília (Foto: Lucas Magalhães/Globoesporte.com)
Gramado do Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília (Foto: Lucas Magalhães/Globoesporte.com)

Nada disso foi cumprido. O contrato passou por termos aditivos e a Greenleaf acabou plantando outro tipo de grama, mais cara, e pela técnica do "maxi rolo" – os tapetes eram plantados em uma lavoura e transplantados até o estádio. Neste caso, a grama viajou 1.700 quilômetros entre Neópolis, em Sergipe, e Brasília.
As mudanças, segundo o Ministério Público, foram definidas pela própria empresa e receberam apenas um aval da Novacap, que não contestou as quebras de contrato e o encarecimento progressivo das obras. Para o MP, isso também prejudica as empresas que foram derrotadas na licitação, competindo com regras que não foram cumpridas.
Além do gasto extra, as mudanças contrariaram recomendações da Fifa, organizadora da Copa do Mundo. Em documento técnico de fevereiro de 2012, a federação proibia expressamente o uso de "rolos ou leivas de grama" para as arenas que sediariam a Copa das Confederações e a Copa do Mundo nos anos seguintes.
"O que se percebe é a incoerente postura da Novacap [...] ao ir, em verdade, de encontro às orientações da Fifa, a despeito da alegação de pretenso atendimento às recomendações da entidade futebolóstica, o que serviu de embasamento para diversas decisões antieconômicas tomadas pela companhia em contratos do Estádio Nacional de Brasília", dizia o MP.
Preço nas alturas
Com todas as mudanças em relação ao plano original, o gramado do Mané Garrincha ficou 663,95% mais caro do que o previsto, segundo o MP. O metro quadrado de grama, previsto em R$ 12,44 no contrato, acabou saindo por R$ 82,60.


Foto aérea do Estádio Nacional de Brasília mostra a arquibancada, painel eletrônico e gramado (Foto: Reprodução/Tv Globo)Foto aérea do Estádio Nacional de Brasília mostra a arquibancada, painel eletrônico e gramado (Foto: Reprodução/Tv Globo)
Foto aérea do Estádio Nacional de Brasília mostra a arquibancada, painel eletrônico e gramado (Foto: Reprodução/Tv Globo)

As irregularidades não ficaram restritas à cobertura vegetal. A canaleta de escoamento de chuvas também foi trocada por outro modelo, "a um custo muito maior". Durante a instalação da grama, a Greenleaf solicitou uma camada adicional de brita de R$ 200 mil por causa das chuvas.
"Ocorre que o período de chuvas em Brasília é bem demarcado, inicia-se em outubro e finaliza-se em abril, período compreendido pelo cronograma físico-financeiro da obra. Portanto, não pode o gestor público alegar imprevisibilidade quanto a tal fato notório", diz trecho da ação do MP.
Após a instalação, a manutenção do gramado do Mané Garrincha também foi contratada a "preço de ouro". Enquanto o Botafogo pagava R$ 38.540,72 mensais à mesma Greenleaf para manter o campo do Engenhão, em 2012, o GDF pagava R$ 97.087,88 por mês.
A reconstrução do estádio Mané Garrincha para os eventos da Fifa foi a mais cara, entre as 12 cidades-sede da Copa do Mundo. O custo é estimado pelo Tribunal de Contas do DF em R$ 1,7 bilhão.

Fonte: G1

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