domingo, setembro 29, 2013

Queda no número de doações de órgãos deixa pelo menos 170 pacientes na fila de espera no RN

Semana Nacional de Doação de Órgãos teve como objetivo principal conscientizar a população. Foto: Divulgação
Uma decisão importante, em um momento de extremo sofrimento, pode ajudar a salvar a vida de dez pessoas, em alguns casos. Detectada a morte encefálica, quando o cérebro para de funcionar, a família se vê diante de dilema, em meio a dor da perda do ente querido, e tem dois caminhos a seguir: pedir para desligar os aparelhos e sepultar o familiar ou decidir deixar aproveitar os órgãos para que a vida do paciente continue, de uma certa forma, em outras pessoas, salvando e melhorando a condição de vida de outra. Essa decisão tem que ser tomada nas primeiras horas após o anúncio da morte encefálica, o que aumenta a chance de captação dos órgãos.

A decisão de doar os órgãos pode ajudar zerar uma fila angustiante e penosa, que pode durar meses, e em alguns casos os pacientes sequer aguentam esperar a sua vez. Atualmente, no Rio Grande do Norte há, pelo menos, 170 pessoas à espera de órgãos, sendo que 85 à espera de transplante de córnea, 83 esperando por um rim e dois na fila por um transplante de fígado. Isso sem contabilizar os pacientes que necessitam de transplante de coração e de medula óssea. Essa fila varia diariamente. Os casos mais graves são os pacientes que precisam de transplante de fígado e de coração, que pela gravidade dos casos, muitas vezes, morrem sem sequer realizar o transplante.

A demora na captação de órgãos acontece, quando o paciente tem a morte cerebral comprovada, mas não comunicou a família o desejo de ser um doador de órgão. Em 2012, o Estado conseguiu 192 doadores de múltiplos órgãos. Este ano, até o mês de agosto, apenas 31 doações de múltiplos órgãos foram realizadas. Diante da queda no número de doadores, o Ministério da Saúde, a cada ano, intensifica as ações de sensibilização com uma semana dedicada à doação de órgãos, que termina neste domingo (29), para reverter esse quadro.

Conforme dados do Registro Brasileiro de Transplantes (RBT), no primeiro semestre de 2013, o Rio Grande do Norte registrou um total de 48,6 potenciais doadores por milhão da população (pmp), número superior à média do Brasil (44,3 pmp). Já o número de doadores efetivos no Estado foi de 13,9 pmp, enquanto que no país foi de 13,3 pmp. Além disso, no RN o número de transplantes renais, nesse semestre, correspondeu a 17,7 pmp, o de córneas a 55,6 pmp e o de medula a 16,4 pmp, o terceiro maior do Brasil. O Brasil é o segundo país do mundo no número de transplantes, só perde para os Estados Unidos. Atualmente, o Rio Grande do Norte realiza cinco tipos de transplantes: rim, córnea, coração, medula óssea e de fígado, que estava parado há mais de cinco anos e recomeçou a ser feito este mês.

Na Semana Nacional da Doação de Órgãos, o Ministério da Saúde divulgou os dados do balanço de transplantes do primeiro semestre deste ano. Nos últimos dez anos, o Brasil dobrou o número de doadores, passando de 7.500 para 15.141 cirurgias. Apenas no primeiro semestre de 2013, foram realizados 11.569 procedimentos.  O Brasil é responsável pelo maior sistema público de transplante do mundo, com 27 centrais de notificação, captação e distribuição de órgãos, 11 câmaras técnicas nacionais, 748 serviços distribuídos em 467 centros, 1047 equipes de transplantes e 71 organizações de procura por órgãos.

De acordo com o Ministério, mais de 50% das famílias brasileiras, ao perder um ente, são favoráveis à doação de órgãos. Em 2010, havia 59.728 na fila aguardando no Sistema Brasileiro de Transplantes. Eram pessoas que já estavam prontas para a cirurgia e em avaliação médica. Já em 2013, houve uma redução de 35% neste número, passando para 38.759 (até junho) pessoas em espera.

De acordo com a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), no entanto, ainda há um longo caminho a percorrer. “Se considerarmos todos os fatores que impedem que uma notificação de potencial doador se concretize em uma real doação, como contraindicação médica, a recusa familiar ainda representa quase a metade deles”, relata José Medina Pestana, presidente da ABTO. “Embora pesquisas comprovem que a vontade de ser um doador é muito maior do que o número real, é triste saber que, na maioria dos casos, esse último desejo não se realiza simplesmente pela falta de diálogo familiar. Vencer essa barreira depende de um gesto simples. Converse com a sua família e ajude a salvar milhares de pessoas que hoje esperam por uma doação”, reforça o médico.

Artenise Revoredo, coordenadora da Central de Transplantes do RN, conta que o grande desafio é sensibilizar as pessoas a fim de aumentar o número de doadores, para que possa zerar a fila de pessoas que esperam por um órgão. A grande dificuldade no processo de doação de órgãos, segundo Artenize, é vencer o medo e o desconhecimento por parte da população. A coordenadora conta que o número de doações no Estado vinha aumentando desde 2009, mas este ano, a doação teve uma queda, daí a preocupação e a necessidade das campanhas de conscientização.

“O Sistema de Transplante no Brasil é uma das instituições do país que funciona muito bem e a população deve dar essa credibilidade, e um sistema que funciona quase 100% feito pelo SUS. Além disso, é importante explicarmos para a população que morte encefálica não tem volta e que ninguém vai ser morto para doação. Quando a pessoa entra em morte encefálica, que é quando existe a possibilidade de doação de órgãos, esse é um processo irreversível, pois o cérebro é quem comanda todo o nosso corpo. Se o coração não parar imediatamente, ele vai parar de qualquer jeito. Esse processo que a pessoa entra em que se confirma a morte encefálica, que é igual a morte, conceito aceito pela Organização Mundial de Saúde, e não há dúvida de que a pessoa possa retornar. Isso é diferente de coma”, explicou Artenise Revoredo.

O Brasil adota além de dois exames clínicos, que veem reflexos neurológicos, recomendados pela Organização Mundial de Saúde para detectar a morte encefálica, um exame complementar que vai examinar o cérebro pela atividade elétrica, como um eletroencefalograma, ou um Doppler, para analisar a circulação sanguínea. Para a captação de órgãos é necessário que o paciente esteja com morte encefálica, mas a captação de córnea, aqui no Rio Grande do Norte, pode ser feita com o coração parado, até seis horas.

A coordenadora ressalta que, depois de detectada a morte encefálica, a decisão tem que ser tomada o mais rápido possível, pois quando mais o tempo passa maior a possibilidade de os órgãos diminuírem a função ideal. Porém, infelizmente é comum a perda de órgãos, pois as pessoas não comunicam à família, em vida, o desejo de ser um doador de órgãos, já que esta é voluntária. “Enfatizamos que é necessário que isso seja um assunto conversado com a família. A morte faz parte do ciclo natural da vida e se a pessoa diz que tem a vontade de doar os órgãos, na hora da dor da perda do ente querido, vai ser menos sofrido e a família, mesmo na dor dela, termina por respeitar a decisão e dizer um sim na hora da doação e as pessoas que estão esperando terão uma nova vida, com qualidade de vida e serão salvas várias vidas”, destacou Artenise Revoredo.

Artenise explica que há casos, como as pessoas que necessitam de transplantes de coração, pulmão ou fígado, onde a espera por um órgão tem que ser mínima, já que o paciente debilitado, muitas vezes, não consegue esperar pelo órgão e acaba morrendo. Para quem precisa de transplante de rim ainda existe a terapia substitutiva que é a hemodiálise, apesar do sofrimento do processo. “O paciente que precisa de transplante de fígado, pulmão ou coração rapidamente evolui, e muitas vezes, para a morte”, afirmou.

Quando o órgão não é aproveitado no Estado, explica Artenise, porque não há compatibilidade, o órgão é ofertado para a Central Nacional de Transplantes, que fica localizada em Brasília, de forma que possa salvar a vida de pessoas de outros estados. “Nós nunca sabemos de que lado nós vamos estar. Hoje estou saudável, mas amanhã posso estar do outro lado precisando que essas pessoas decidam pela vida e de continuar a vida, doando os órgãos dos entes queridos na hora que eles vierem a falecer”, destacou a coordenadora da Central de Transplantes do RN. Toda doação de órgãos tem que ter a assinatura do responsável e mais duas testemunhas. No caso de pacientes menor de idade é obrigatório o consentimento do pai, da mãe e a assinatura de mais duas testemunhas.

Reprodução Cidade News Itaú

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