segunda-feira, outubro 20, 2014

Ex-diretor da CBF revela bastidores da Copa:”Tentei conciliar vários interesses”

Rodrigo Paiva atuou pela CBF em quatro Copas do Mundo. Foto: Divulgação Após trabalhar 23 anos seguidos no futebol, Rodrigo Paiva está se refazendo do impacto de sua demissão da CBF. A aparente
reformulação com a saída de Luiz Felipe Scolari e Carlos Alberto Parreira respingou também no então diretor de Comunicação. Paiva aproveita agora para fazer reflexões profissionais e também pessoais depois da vexatória participação brasileira na Copa do Mundo de 2014.

Tido como “assessor celebridade”, Paiva se notabilizou por estar sempre próximo dos holofotes e também colecionar algumas polêmicas nos 13 anos em que ficou na CBF: brigou com um jogador do Chile em pleno Mineirão, foi alvo de críticas por permitir a gravação de um programa do apresentador Luciano Huck, favorecer a emissora detentora dos direitos de transmissão e, por último, ser suspenso por uma partida.

Depois de perder a mãe pouco tempo depois do Mundial, Paiva deu um tempo e se manteve longe de entrevistas. Pela primeira vez desde então, topou falar em um bate-papo franco. Confira os melhores momentos da entrevista exclusiva:

O que você tem feito após a sua demissão da CBF?

Rodrigo Paiva: Estou querendo dar uma parada por enquanto. Foram muitos anos direto no futebol. Primeiro o Flamengo, depois o Ronaldo e então a seleção. Faz apenas três semanas que saí da CBF. Perdi minha mãe neste período. Éramos muito ligados. Agora estou tentando refazer minha vida, reestruturar a família. Minha intenção é fazer alguns cursos que não sejam ligados ao futebol. Tenho pesquisado em alguns lugares interessantes, como a Casa do Saber, e estou empolgado com a possibilidade de me aprofundar em outras áreas, como artes ou cultura em geral.

R7: Há algum projeto que você já tenha em vista? Recebeu alguma proposta de trabalho?

Paiva: Ainda não. Quero esperar até o fim do ano para ter alguma definição. Mesmo porque apareceram poucas propostas. Mas o que eu quero agora é ampliar alguns horizontes para fora do futebol, que é um ambiente muito monotemático. Eu mesmo não tenho amigos no futebol. Claro, gosto de muita gente nesta área. Mas meus amigos mesmo, os de jantar fora e de frequentar a casa, são os do tempo de colégio e de outras esferas. Tenho mais artistas que são meus amigos do que pessoas ligadas ao futebol. (Paiva teve um relacionamento de três anos com a atriz Maitê Proença).

Depois que você deixou a CBF, muita gente que, antes dava tapinha nas costas, não mais o procurou?

Paiva: Engraçado, eu esperava que isso fosse acontecer. Minha expectativa era de que muita gente iria sumir. Mas não. Ocorreu o contrário. Muita gente que conviveu comigo neste período, durante as coberturas, me mandou mensagem de solidariedade. Até quem eu nem conhecia tão bem. Recebi mais de 200 mensagens no Whatsapp, por exemplo. Fiquei emocionado. A melhor coisa que me aconteceu após eu deixar o cargo foi isso. Não esperava, mas muitos jornalistas me procuraram.

Como você lidou com a pressão do cargo durante os anos em que atuou na CBF?

Paiva: Quando se faz o que se gosta, a pressão se torna prazerosa. Não tem como ser diferente. Nunca senti o trabalho como um fardo. Sempre busquei manter a tranquilidade, mesmo diante de um desafio árduo. Nesta Copa, houve a maior cobertura jornalística da história do Brasil, tenho certeza. Foi algo sem precedentes. Eram 900 jornalistas por dia atrás de informações aqui, com pico de 1,2 mil jornalistas. Com duas pessoas, eu e o Vítor, conseguimos lidar com a demanda. Fizemos, auxiliados por outras quatro pessoas, todo o trabalho operacional, de conteúdo e de novas mídias, atingindo, por exemplo, o recorde de 6 milhões de seguidores no Facebook.

R7: Como você lidou com o que se chama de pressão da TV Globo para ter exclusividade em entrevistas?

Paiva: A TV Globo nunca me pressionou em nada. Durante os anos em que atuei na CBF não me senti pressionado para favorecer a emissora em alguma situação.

Mas a Globo tem os direitos de transmissão das partidas da Copa. Isso não influenciou a comissão técnica em alguma decisão de permitir a entrada da emissora em entrevistas especiais?

Paiva: Nesta Copa, fiz um papel de embaixador, tentei conciliar vários interesses, tanto da detentora dos direitos quanto dos que não podiam transmitir jogos. Houve um consenso geral, sempre com limites, buscando-se um equilíbrio que não prejudicasse nenhuma das partes. Uma coisa é o direito de transmitir. A outra é a cobertura jornalística do evento. Deixávamos esta questão dos direitos de transmissão para a Fifa. Dentro da CBF, respeitamos esses direitos, mas também abrimos para os não detentores. Não poderíamos isolar órgãos jornalísticos, principalmente do país, da cobertura de uma Copa do Mundo no Brasil.

Isso não aconteceu, por exemplo, naquele famoso episódio em que o Luciano Huck, apresentador da Globo, entrou na concentração e interrompeu um treinamento para realizar uma filmagem…

Paiva: O Huck entrou uma vez, ficou parecendo que ele morava na concentração do Brasil. Mas outros entraram também. O CQC teve espaço para exclusivas muitas vezes. O Smigol, do SBT, também teve abertura para entrevistas. Alguns programas tiveram até mais espaço que o do Huck. Atendemos também a Band, Fox, Bandsports e outras emissoras. No mesmo local. O problema é a visibilidade. A Globo tem maior visibilidade e por isso as críticas vêm em maior volume.

Mas já houve mais rigidez em outras Copas do Mundo.

Paiva: Sim, em outras competições houve mais rigidez, inclusive de nossa parte. A Copa do Mundo no Brasil, porém, aumentou nosso desafio. Seria muito mais cômodo restringirmos a cobertura, até para facilitar nosso trabalho, já que o volume de jornalistas brasileiros era muito maior do que em outras Copas. Trabalhei em um total de quatro Copas do Mundo e sei das dificuldades que esta última ofereceu. Mas mesmo assim procuramos buscar o equilíbrio e acho que conseguimos.

O fato de a seleção ter ficado muito exposta durante o Mundial, com jornalistas acompanhando os treinamentos e jogadores recebendo vários dias de folga, contribuiu para o péssimo resultado do Brasil nas últimas partidas da Copa do Mundo?

Paiva: Não tenho condições, nem poderia atribuir responsabilidades neste sentido. Estaria falando como torcedor. É importante destacar que o Brasil não chegava a uma semifinal, desde 2002, e conseguimos neste Mundial. Tivemos estrutura, o trabalho foi feito, não faltou nada fora de campo. Só sei que fiquei muito, muito triste com o resultado, como fiquei em 2010.

Poderia explicar o que houve em relação à briga nos vestiários, no intervalo do jogo contra o Chile, pelas oitavas, em que você foi acusado de agredir o atacante Maurício Pinilla e acabou suspenso por quatro jogos?

Paiva: Não causei briga, não provoquei ninguém. Cheguei, a pedido do Parreira (Carlos Alberto), para separar uma discussão. Então fui agredido com uma cotovelada na barriga. Instintivamente, revidei. Arrependo-me de ter revidado, não deveria ter feito isso. O certo seria não reagir e deixar que as instâncias adequadas tomassem providências. Acontece que o quarto árbitro só viu meu revide. A Fifa tinha as imagens de tudo, mas só utilizou aquela em que eu revidei. Nenhum jogador chileno, nem o que reclamou depois, falou nada durante as entrevistas normais. As queixas só vieram três dias depois. Em toda minha carreira, nunca tive este tipo de problema.

Nos dias que antecederam a partida contra os chilenos, você tomou a palavra, durante coletiva, e desabafou contra as declarações de que a Copa estava arranjada para o Brasil. Foi sua a iniciativa?

Paiva: Fui designado para estar lá pelo Felipão, pelo Thiago Silva e pelo próprio presidente José Maria Marin. A seleção brasileira passava por uma pressão grande. Disse que o Brasil já havia ganho cinco Copas e não precisaria de nenhuma ajuda deste tipo. Fui a pedido deles, com o intuito de poupar os jogadores e a comissão técnica deste imbróglio, adotando uma posição firme. Mas não ofendi ninguém do Chile.

Você teve alguma participação na conversa que o técnico Scolari teve na concentração, com alguns jornalistas mais próximos a ele, depois do jogo contra o Chile?

Paiva: Não tive participação nenhuma. Foi iniciativa do Felipão, não foi nada organizado pela CBF, que não teve nenhum envolvimento. Não me incomodei em nada com isso. Foi um momento dele, as pessoas têm direito à individualidade, o comando era dele. Na Copa, nossa função era deixar o técnico com as melhores condições de trabalho. Essa prática do Felipão, porém, não foi surpresa. Em um ano e meio, ele teve este tipo de conversa com frequência. Na Copa, novamente, ele quis conversar com amigos, que eram mais próximos, e tinha esse direito. Tentou outras duas ou três vezes conversar, na sala de conveniência, mas não conseguiu em razão do batalhão de fotógrafos que estava por lá. Na Copa, a repercussão para este tipo de iniciativa é bem maior.

Você foi contratado na gestão de Ricardo Teixeira, com quem se sentia mais à vontade. A nova dupla de comandantes da CBF, o atual presidente Marin e o futuro, Marco Polo Del Nero, não parecia tão próxima a você. Você ficou decepcionado com eles de alguma maneira, inclusive em relação à sua demissão?

Paiva: Não tenho o que falar deles. Foi uma opção legítima a minha demissão. Não tenho reclamações. A CBF fez um investimento alto nesta Copa e nosso trabalho só deu certo por causa disso. Eles me deixaram trabalhar com liberdade e eu sempre me dirigi a eles com relatórios, prestações de contas. Pedia orientações nos momentos necessários. Houve respeito hierárquico das partes e saio sem ressentimentos. Digo que minha missão foi cumprida. Para mim a CBF é uma etapa encerrada. Agora, o trabalho é de outros e torço para que dê tudo certo.

Fonte: R7

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