quarta-feira, dezembro 07, 2022

Deputados bolsonaristas tentam acelerar projeto que impede aborto até em casos de estupro

A menos de um mês para o fim do atual governo, deputados bolsonaristas tentam acelerar na Câmara um projeto que cria o Estatuto do Nascituro – proposta que, na prática, impede o aborto em situações atualmente previstas em lei, como nos casos de estupro.


Deputado Emanuel Pinheiro Neto é o relator do Estatuto do Nascituro — Foto: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados


O projeto foi colocado em pauta em uma comissão nesta quarta-feira (7), mas a votação foi adiada após pedido de vista – mais tempo para análise do texto – apresentado pela oposição. A proposta pode ser votada na próxima semana.


A deputada bolsonarista Policial Katia Sastre (PL-SP), que preside a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, pautou essa proposta como item único no colegiado. O texto é discutido na Câmara desde 2007 e, com frequência, volta à pauta a pedido de parlamentares conservadores.



Mais cedo, a bancada evangélica elencou a proposta como uma das prioridades entregues ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que busca apoio à recondução para a principal cadeira da Casa no ano que vem.


Segundo o parecer do relator da matéria, deputado Emanuel Pinheiro Neto (MDB-MT), o nascituro é o "indivíduo humano concebido, mas ainda não nascido". Ou seja, nascituro é um sinônimo para feto.


A proposta garante ao feto "o direito à vida, à saúde, ao desenvolvimento e à integridade física" e proíbe "qualquer dano ao nascituro". Ainda segundo o parecer publicado, o feto resultante de violência sexual terá os mesmos direitos dos demais nascituros.


Segundo deputadas da oposição, o dispositivo impedirá o aborto em caso de estupro, hoje garantido em lei.


A legislação atual também permite o procedimento quando há risco à vida da gestante ou quando há um diagnóstico de anencefalia do feto – possibilidades que também seriam atingidas com a proposta em discussão.


O relator afirma em seu parecer que "mesmo em casos como a anencefalia, há o normal desenvolvimento físico do feto".


"Todos os bebês nascerão e a curta duração da vida de alguém não autoriza o seu assassinato", disse Emanuel Pinheiro Neto.

Para a deputada Natalia Bonavides (PT-RN), o projeto é "nocivo para mulheres e para crianças vítimas de violência sexual". "Temos um país que a cada 10 minutos uma mulher é estuprada", afirmou.


"Lamentamos o nível dessa sessão, tantas agressões, violências, desrespeitos a prerrogativas, tudo isso para tentar aprovar um projeto que ataca os direitos das mulheres, que eram para ser os mais elementares. Muito aqui se fala em proteger vulneráveis. É muito indignante como não se tem a menor compaixão, empatia com aquelas mulheres em situação de extrema vulnerabilidade que sofreram estupro, é inacreditável que haja parlamentares dispostos a aprovar esse Estatuto do Estuprador", completou a petista.

A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) criticou o fato de a proposta ser levada à votação no fim da legislatura – período de quatro anos no Legislativo.


"[A comissão] quer nos 45 minutos do segundo tempo, numa legislatura que está acabando, pautar um projeto de retrocesso ao direito das mulheres. Vem aqui um monte de homens ou fundamentalistas falar que estão preocupados com a vida das mulheres e querem propor um projeto que torna o estuprador pai, que obriga a menina a gerar o fruto da violência", disse Fernanda Melchionna.


Já a aliada do presidente Jair Bolsonaro, a deputada Chris Tonietto (PL-RJ) defendeu a aprovação da proposta e disse que o nascituro "sequer cometeu algum crime e não pode responder pelo crime de terceiro".


"Não existe direito de matar, a menos que se fale em legítima defesa, neste caso para preservar a sua vida e a vida de terceiro. Agora, não existe direito ao aborto. O que existe por exemplo no Código Penal são as escusas absolutórias, ou seja, excludente de punibilidade", disse a deputada bolsonarista durante a sessão.

A reunião na comissão foi marcada por ofensas e um tumulto nos corredores da Câmara. Uma manifestante contrária ao projeto registrou um boletim de ocorrência na Polícia Legislativa, afirmando que um homem favorável à proposta teria começado a filmá-la e tentado agredi-la.


Fertilização in vitro

Outro ponto polêmico no projeto é o que prevê as mesmas garantias de direito à vida a indivíduos "concebidos in vitro", mesmo antes da transferência para o útero da mulher.


O dispositivo também é criticado pelas deputadas, uma vez que, segundo elas, o procedimento de fertilização in vitro exige descartes de embriões.


"Talvez o senhor, [Emanuel Pinheiro Neto], não entenda como é uma fertilização in vitro", disse a deputada Erika Kokay (PT-DF) ao relator. "A fertilização in vitro pressupõe a possibilidade de descarte", afirmou.


Fonte: g1

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