quarta-feira, janeiro 30, 2013

Com '11 de Setembro' gaúcho, boate vira 'marco zero' de Santa Maria


"Meu Deus", "que tragédia", "quanta tristeza". Quem visita a boate Kiss, no centro de Santa Maria (RS), não consegue dizer mais do que algumas dessas interjeições. Desde domingo (27), o local virou ponto de peregrinação de parentes, vítimas e moradores da cidade. Com a imprensa local comparando a tragédia ao 11 de setembro dos nova-iorquinos, a casa noturna virou uma espécie de "marco zero" dos santa-marienses.

A polícia ainda não liberou totalmente o acesso à rua onde fica a boate. Um cordão de isolamento ainda separa a população. Quem quiser prestar uma homenagem pode chegar um pouco mais perto e depositar flores ou cartazes em uma espécie de memorial.

A maioria das pessoas, porém, prefere ficar parada, observando a boate. "Quando olho para o prédio, imagino a cena dos guris tentando fugir", afirmou Rubilar dos Santos, 52.

Como todo cidadão santa-mariense, Santos tem sua própria relação com a tragédia. Seu sobrinho está internado em estado grave no Hospital de Caridade, também no centro da cidade. "Quando tentava sair, ele caiu e desmaiou. Alguma alma santa o resgatou. Mas ele inalou muita fumaça", contou.

Clandio Machado, 42, foi acompanhar o filho, Rooney Machado, 19. O jovem sobreviveu ao incêndio e, três dias depois da tragédia, finalmente teve coragem de voltar ao cenário do dia mais triste de sua vida. 

"Ele trouxe um buquê de rosas e colocou no memorial, mas se emocionou tanto que precisou sair", disse. Machado trazia consigo a comanda com aquilo que seu filho consumiu no dia da tragédia. "De saúde, meu filho está bem. Mas o psicológico está totalmente abalado. O rapaz chora do nada, come pouco e quase não dorme", lamentou.

A boate fica em uma rua estreita, bem no centro da cidade, atrás de um supermercado. É ponto de passagem obrigatório de quem cruza essa região.  


Arte UOL
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Morador de Santa Maria desde que nasceu, Elvis Eduardo Oliveira, 50, se lembra de quando o prédio abrigava um depósito de bebidas. "A frente da boate é nova, mas o prédio é muito antigo. Há alguns anos, ali era um depósito de bebidas", relembrou.

Para ele, a população visita o local da tragédia porque tem tanta intimidade com o centro da cidade que fica difícil acreditar que um lugar tão popular tenha se tornado um ponto de tanta dor.  "É um lugar que simplesmente ficou diferente. O pesar e a tragédia deixaram isso aqui irreconhecível", disse.

Revoltado com os donos da boate, Oliveira disse que perdeu dois primos na tragédia. "Um isolamento acústico barato tirou a vida de dois primos mais jovens", afirmou.  Os irmãos José Manuel Rosa Cruz, 18, e Mirella Rosa Cruz, 20, não conseguiram escapar do prédio e morreram dentro da boate. Eram estudantes e não tinham mais irmãos. "Meus tios perderam os únicos filhos que tinham. A Mirella era linda. Chegou a ser rainha do Carnaval. Uma perda absurda", disse, antes de dar as costas à boate e voltar para casa. 

Boate atrai legião de curiosos
Não para a romaria de curiosos ao ponto da maior tragédia do Rio Grande do Sul. Na madrugada desta quarta-feira (30), na porta da boate Kiss, gente que não conhecia os mortos estava lá chorando, rezando, levando flores, acendendo velas e exibindo mensagens de protesto.

Tem gente que veio de longe só para ver a Kiss destruída. É o caso de Verônica Andrea da Silveira, 16, de Montenegro (a 200 km). Ela e o namorado Gregory Flores Chaves, 19, vagavam entre os curiosos. 

Os dois não conhecem ninguém, nunca foram na boate, mas estavam comovidos: "Eu quero que a prefeitura faça uma praça, um memorial no lugar", pede Verônica – mesmo que o terreno da Kiss fique numa descida, espremido entre dois prédios.

Dona Tiene, 20, trouxe a filha Ana Luíza, 2, para olhar o agito – a menina ficou o tempo todo no carrinho.  Um homem que não quis se identificar rezou ajoelhado. Disse que é cigano e paulista. Ele não conhecia ninguém entre os mortos na tragédia.

Um jovem motoqueiro largou o capacete para acender cinco velas.  Alguém pintou o nome de Heitor de Oliveira no asfalto, em memória.

Reprodução Cidade News Itaú

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