quinta-feira, fevereiro 20, 2014

Depoimentos de PMs sobre Amarildo tinham várias versões, diz delegado

Major Edson e outros 24 PMs respondem pelo sumiço de Amarildo (Foto: Káthia Mello)A audiência de instrução do major Edson Santos e de outros 24 policiais militares, todos acusados de participar da tortura e do sumiço do pedreiro Amarildo de Souza na
Rocinha, começou por volta das 14h30 desta quinta-feira (20) no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), no Centro. Eles respondem pelos crimes de tortura, ocultação de cadáver, fraude processual e formação de quadrilha.
Com a presença dos 25 réus, o primeiro a ser ouvido pela juíza Daniela Alvarez Prado foi o delegado Rivaldo Barbosa, diretor da Divisão de Homicídios (DH) da Polícia Civil, responsável pelo inquérito entregue ao Ministério Público. Em três horas de perguntas e respostas, ele disse que a investigação falhou ao não realizar perícia atrás da sede da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), onde Amarildo teria sido torturado.
Rivaldo falou também que a primeira investigação indicava que o ajudante de pedreiro havia sido morto pelo tráfico. "O inquérito inicial apontava que Amarildo foi morto por traficantes. A ação dos policiais foi manobra ardilosa para imputar a terceiros a tortura contra o Amarildo."
Ainda de acordo com o delegado, os depoimentos dos policiais eram contraditórios. Nas escutas, a policia percebeu que o major Edson Santos, então responsável pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, pressionava os PMs a dar a mesma versão. Saio daqui com a consciência tranquila e com a certeza de que a Divisão de Homicídios fez o seu trabalho. Agora é com o poder judiciário e com o Ministério Pblico" , disse Rivaldo Barbosa ao sair do
depoimento.
Após Rivaldo, a delegada-adjunta da DH, Ellen Souto, foi chamada como testemunha. Segundo ela, existem provas técnicas de que Amarildo não saiu da UPP por livre e espontânea vontade. Ellen disse também que a "Operação Paz Armada" foi um fracasso. "Poucas e inexpressivas prisões e nada de drogas e crimes", disse.
PMs compravam falsas testemunhas
Segundo ela, o major Edson e outros policiais ajudavam falsas testemunhas para manter a versão de que Amarildo foi morto pelo tráfico. De acordo com relato de Elle, eles prometeram casas, compravam fraldas e davam dinheiro.
Nesta primeira sessão, será feita a colheita oral de provas em juízo. Ao todo, são 19 testemunhas de acusação, segundo a promotora Carmem Elisa Bastos, e 200 de defesa, de acordo com o advogado Saulo Salles, que defende o major Edson. A previsão é de que outras audiências sejam marcadas para haver tempo de todos serem ouvidos.
Juíza atuou em caso de protestos
A juiza Daniela Alvarez Prado, da 35ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), é a mesma que determinou a liberdade provisória de 20 dos 64 presos durante um protesto no dia 15 de outubro de 2013, no Centro. Desde que o ajudante de pedreiro sumiu, no dia 14 de julho, a pergunta "Cadê o Amarildo?" virou um símbolo em manifestações, principalmente pelas críticas à Polícia Militar.

Relembre o caso
Amarildo sumiu após ser levado por policiais militares para ser interrogado na sede da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) durante a "Operação Paz Armada", de combate ao tráfico na comunidade, entre os dias 13 e 14 de julho de 2013.
Na UPP, teria passado por uma averiguação. Após esse processo, segundo a versão dos PMs que estavam com Amarildo, eles ainda passaram por vários pontos da cidade do Rio antes de voltar à sede da Unidade de Polícia Pacificadora, onde as câmeras de segurança mostram as últimas imagens de Amarildo, que, segundo os policiais, teria deixado o local sozinho — fato não registrado pelas câmeras.

Após depoimentos, foram identificados quatro policiais militares que participaram ativamente da sessão de tortura a que Amarildo teria sido submetido ao lado do contêiner da UPP da Rocinha. Segundo informou o Ministério Público, testemunhas contaram à policia sobre a participação desses PMs no crime. Após seis meses de buscas pelo corpo do pedreiro, a Justiça decretou a morte presumida de Amarildo.
A morte presumida substitui o atestado de óbito, que só pode ser emitido quando há o corpo — o cadáver de Amarildo nunca foi encontrado —, e permite à família receber pensão ou indenização, entre outras funções. Na primeira instância, a ação declaratória havia sido julgada improcedente.
Tortura
De acordo com a promotora Carmem Elisa Bastos, do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), o tenente Luiz Medeiros, o sargento Reinaldo Gonçalves e os soldados Anderson Maia e Douglas Roberto Vital torturaram Amarildo depois que ele foi levado para uma "averiguação" na base da UPP. Ainda segundo eles, outros PMs são suspeitos de participar ativamente da ação.
Enquanto, segundo a promotora, o ajudante de pedreiro era torturado por quatro policiais, outros 12 ficaram do lado de fora, de vigia. Oito PMs que estavam dentro dos contêineres que servem de base à UPP foram considerados omissos porque não fizeram nada para impedir a violência.
Outros cinco policiais que decidiram colaborar com as investigações disseram que o major Edson, então comandante da UPP, estava num dos contêineres, que não têm isolamento acústico, e podia ouvir tudo.
Segundo o MP-RJ, mais 15 policiais militares, entre eles três mulheres, foram denunciados pelo órgão, totalizando 25 acusados pelo crime.

PMs presos
O major Edson Raimundo dos Santos, ex-comandante da UPP Rocinha, e o tenente Luiz Felipe de Medeiros, subcomandante da unidade, tiveram a prisão decretada em outubro, após denúncia do Ministério Público que constatou a participação dos dois no desaparecimento e morte do pedreiro Amarildo de Souza.
Os policiais foram levados inicialmente para a Unidade Prisional da PM, em Benfica, na Zona Norte, juntamente com outros oito denunciados, mas, a pedido do Ministério Público, os oficiais foram transferidos para Bangu 8.

Os dois tiveram o pedido o pedido de habeas corpus negado pela 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, na tarde desta quarta-feira (23). Os dois vão permanecer na penitenciária Bangu 8, no Complexo de Gericinó, na Zona Oeste do Rio. Outros 13 policiais envolvidos no caso também foram presos.

Reprodução Cidade News Itaú

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