quinta-feira, março 25, 2021

MP vai investigar distribuição de 'kit Covid' a pacientes da Prevent Senior em SP

Fazendo upload: 348067 de 348067 bytes.


O Ministério Público de São Paulo abriu uma investigação para apurar a distribuição de receitas de "kits Covid" por parte da Prevent Senior, uma das maiores operadoras de saúde do país, contra a Covid-19 para seus clientes.


A entrega da receita com os medicamentos, que não têm eficácia comprovada para a Covid-19, é feita antes mesmo da consulta e sem analisar o perfil dos clientes. A lista traz hidroxicloroquina, ivermectina, azitromicina (antibiótico), predinisona (corticoide), vitaminas e suplementos alimentares, como whey protein.


A investigação foi aberta pelo promotor Artur Pinto Filho, da área de Saúde Pública, que determinou nesta quarta-feira (24) a instauração de um inquérito civil para investigar o caso.


As primeiras medidas tomadas pelo promotor serão determinar ao Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e ao Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo (Coren) que apurem as condutas éticas dos profissionais que administram esses kits aos pacientes.


O MP pediu ainda à Vigilância Sanitária que inspecione as unidades da Prevent para saber como a distribuição das receitas e dos remédios está sendo feita.


O que chamou a atenção do promotor foi o fato de as receitas serem padronizadas e assinadas pelo mesmo médico, Rafael Souza da Silva, diretor-executivo da Prevent, que, apesar de prescrever, não foi quem atendeu os pacientes.



Nos últimos dias, a reportagem da Globonews conversou com 12 pacientes ou familiares de pacientes que receberam o kit. Muitos deles acabaram testando negativo para Covid-19 posteriormente. A oferta é feita até mesmo para quem está assintomático. A prescrição desta forma fere o parecer do Conselho Federal de Medicina.


Segundo os relatos, os medicamentos são oferecidos antes mesmo da realização da testagem para Covid-19, seja no atendimento presencial ou por teleconsulta, normalmente por um enfermeiro ou atendente, sem que haja conhecimento sobre o quadro clínico e o histórico da pessoa.


Em março de 2020, a operadora anunciou o uso experimental de cloroquina e azitromicina a pessoas com Covid. Um mês depois, funcionários da rede passaram a receitar cloroquina mesmo a pacientes que não tivessem a confirmação da doença, contrariando a recomendação do Ministério da Saúde.


Em nota sobre o protocolo atual, a Prevent Senior alegou que “tem monitorado os resultados e evidências clínicas de mais de 130 mil beneficiários testados para Covid-19 nos últimos 12 meses” e que “os resultados trazem evidências robustas que o conjunto de tratamentos com diversas medicações evita o agravamento da Covid-19”. (veja a íntegra no final da reportagem)


Receitas idênticas

A reportagem teve acesso a cinco receitas idênticas, assinadas pelo mesmo médico, o cardiologista Rafael Souza da Silva, diretor-executivo da Prevent Senior. Esses cinco pacientes, que não se conhecem, foram atendidos em dias diferentes, lugares distintos e possuem perfis clínicos diversificados. Nenhum deles disse ter sido atendido por Rafael, seja presencialmente ou por teleatendimento.


A gerente operacional Roseneide Machado da Gama estava com sintomas de gripe e decidiu fazer uma teleconsulta. Ela afirma que a enfermeira que a atendeu ofereceu o kit. Os medicamentos chegaram à casa dela no dia seguinte, antes do resultado do teste para Covid, que deu negativo. Roseneide conta que não tomou os remédios porque foi alertada pelo filho, que é fisioterapeuta, e porque é alérgica a muitos medicamentos.



“Eu fiquei com receio de tomar por alguns motivos. Eu não tinha o resultado do exame, não sabia se era Covid. Segundo, porque eu sou uma pessoa muito alérgica a medicações. Os meus tratamentos são acompanhados por alergistas porque eu tenho problemas sérios. Então, isso me causa medo.”


O gerente comercial Edson Nascimento Clemente foi com a mãe até uma unidade da Prevent Senior na Zona Leste da capital neste mês. Segundo ele, uma enfermeira ofereceu o kit ainda na triagem, mas a mãe negou porque não aceitaria se medicar com cloroquina. A oferta, de acordo com o gerente, foi antes do teste para Covid. No dia seguinte, durante uma teleconsulta, houve uma nova oferta do kit. Eles aceitaram para aproveitar as vitaminas que vêm junto.


“Todo mundo que entrava pra fazer o teste – e o resultado só sai no dia seguinte, porque é PCR – saáa, ia pra uma outra sala, assinava algo em uma prancheta e saía com o kit. No tempo que eu fiquei lá, pouquíssimas pessoas saíram sem o medicamento.”


O que diz o Conselho Federal de Medicina

O parecer do Conselho Federal de Medicina, de abril do ano passado, diz que a cloroquina só deve ser administrada “em pacientes com sintomas leves, no início do quadro clínico, em que tenham sido descartadas outras viroses (como influenza, H1N1, dengue), e que tenham confirmado o diagnóstico de Covid-19".


A reportagem teve acesso a um diálogo entre uma cliente, que não quis se identificar, e uma médica da Prevent Senior. A conversa aconteceu no último fim de semana, em um drive-thru de testagem de Covid promovido pelo plano na capital paulista.


Cliente: Mesmo sendo assintomático vocês recomendam tomar esse tratamento?


Médica: Mesmo sendo assintomático a gente passa. Que é o tratamento precoce.



Nesta terça-feira (23), a Associação Médica Brasileira (AMB) e outras 80 entidades médicas e científicas pediram o banimento da prescrição dos medicamentos usados no kit. “Reafirmamos que, infelizmente, medicações como hidroxicloroquina/cloroquina, ivermectina, nitazoxanida, azitromicina e colchicina, entre outras drogas, não possuem eficácia científica comprovada de benefício no tratamento ou prevenção da Covid-19 quer seja na prevenção, na fase inicial ou nas fases avançadas dessa doença, sendo que, portanto, a utilização desses fármacos deve ser banida”, diz o documento.


Chefes de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) de hospitais de São Paulo afirmam que o uso dos medicamentos do kit está piorando o quadro clínico de pacientes que desenvolveram quadros graves do coronavírus.


Reportagem publicada nesta terça-feira (23) pelo “Estado de S. Paulo” mostrou que já há pacientes que precisam de transplante de fígado por causa de hepatites provocadas pelo uso excessivo dos medicamentos do kit.


“Essa prescrição é absolutamente inadequada na medida em que o tratamento das pessoas com Covid precisa ser individualizado. Não existe comprovadamente nenhuma droga antiviral que possa mudar a história da doença”, afirma o infectologista Jamal Suleimani. “Isso cria uma sensação ruim de uma segurança que não existe para o doente.”


Veja a íntegra da nota enviada pela Prevent Senior :


“Por meio do seu instituto de ensino e pesquisa, a Prevent Senior tem monitorado os resultados e evidências clínicas de mais de 130.000 beneficiários testados para Covid-19 nos últimos 12 meses. Os resultados trazem evidências robustas que o conjunto de tratamentos com diversas medicações evita o agravamento da Covid-19 por reduzir a inflamação provocada pelo vírus. Desde o início da pandemia, o modelo de atendimento e o acompanhamento diário dos pacientes fez com que as internações de pacientes de mais de 60 anos caíssem drasticamente. Além disso, a taxa de óbitos por Covid dos pacientes acima de 60 anos da operadora é cerca de 50% menor do que a média estadual. Ou seja, a taxa de mortalidade dentre os pacientes desta faixa etária é de 7%, contra 14% apurados no âmbito do Estado de São Paulo. Os dados de atendimento estão à disposição de qualquer instituição de pesquisa que queira examiná-los. Recentemente, 20 coordenadores de pesquisa de outras instituições brasileiras independentes fizeram a análise dos dados e confirmaram os resultados. Nossa missão de fornecer atenção preventiva e de alta qualidade está mantida. A prescrição de tratamentos para cada paciente é prerrogativa única e exclusiva do médico.”


Fonte: G1

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sua opinião é muito importante para nós, comente essa matéria!