segunda-feira, novembro 25, 2013

Ex-espião da seleção tenta retomar cargo na Justiça para auxiliar Scolari

"Ninguém tem mais experiência do que eu". É assim que Jairo dos Santos, 68 anos, explica por que deve ser reintegrado à comissão
técnica da seleção brasileira o mais rápido possível. O militar reformado trabalhou como "espião" para a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) por 33 anos, municiando treinadores do time nacional com informações estratégicas sobre adversários em oito Copas do Mundo. Hoje, briga na Justiça para auxiliar Luiz Felipe Scolari e Carlos Alberto Parreira na preparação para o Mundial de 2014

Voltar a trabalhar pela seleção é o principal pedido de uma ação trabalhista que dos Santos move contra a CBF desde 2010. O observador técnico foi dispensado pela entidade em 2008, durante a era Dunga. Entretanto, alega que tinha direito a estabilidade em seu emprego na confederação baseado em leis trabalhistas anteriores à Constituição de 1988. Por isso, quer ser reintegrado imediatamente.

"Até 1988, um empregado que não tinha FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e permanecia no mesmo emprego por mais de dez anos, não podia mais ser demitido", afirma o advogado Waldir Passos, que representa dos Santos. "Ele começou a trabalhar na CBF em 1977 e não tinha FGTS. Tinha direito a estabilidade", completa.

Esse direito foi negado ao ex-espião da CBF em um julgamento de primeira instância na Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro, em maio de 2012. A juíza Maria Gabriela Nuti entendeu que dos Santos assistia a jogos de futebol e preparava relatórios sobre outras seleções por hobby. Portanto, não era funcionário da entidade.

O diretor jurídico da CBF, Carlos Eugênio Lopes, é o dono dessa tese. Diz que dos Santos nunca teve um vínculo formal de emprego com a confederação e, por isso, não tem direito a estabilidade em qualquer posto na entidade.

Mesmo assim, dos Santos recorreu à segunda instância da Justiça do Trabalho. Lá, em julho deste ano, o desembargador Luiz Alfredo Mafra Lino reconheceu que ele era sim empregado da CBF. Determinou ainda que a primeira instância da Justiça do Trabalho decida se a CBF tem que reintegrar o antigo espião ao seu quadro de funcionários ou indenizá-lo pela demissão. Só de salários não pagos, dos Santos teria direito a R$ 1,2 milhão.

Existe também a hipótese de um acordo entre CBF e dos Santos. Segundo o antigo observador, aliás, esse acordo poderia ser fechado facilmente já que Parreira, atual coordenador-técnico da seleção, gostaria que ele voltasse ao seu antigo posto.

"Antes de o Parreira assumir, eu estive na casa dele. Ele me disse: 'estou voltando para a seleção e quero você com a gente'. A CBF não me deixou voltar por causa do processo", conta dos Santos, ao receber a equipe do UOL Esporte no escritório de seu advogado, em edifício no centro do Rio de Janeiro. "Parece que preferem perder a Copa a me ter de volta."

"Braço perdido"

Dos Santos diz que processar a CBF é como "perder um braço" para ele. Apesar da batalha judicial, sua paixão pelo futebol e pela seleção brasileira é latente. O ex-espião guarda com zelo centenas de objetos coletados durante os 33 anos de serviços à confederação. Parte deles virou até prova no processo que dos Santos move contra a entidade.

O observador técnico tem recortes de jornais, relatórios e mais de 30 credenciais emitidas em seu nome por organizadores de torneios e amistosos realizados em vários países. Só de Copas do Mundo, dos Santos guarda oito identificações: Argentina-1978, Espanha-1982, México-1986, Itália-1990, EUA-1994, França-1998, Japão e Coreia-2002 e Alemanha-2006. Todas cadastrado como membro da comissão técnica.

"Eu fiz parte da comissão técnica dos últimos dois títulos do Brasil em Copas do Mundo [1994 e 2002]", afirma orgulhoso dos Santos. "Fui pioneiro nesse trabalho de observação aqui no Brasil. Ajudei muitos técnicos da seleção."

O primeiro deles foi Cláudio Coutinho. Foi ele quem deu a primeira chance a dos Santos na seleção brasileira, durante a preparação para a Copa do Mundo de 1978. Até a 'era Dunga', o observador técnico estima ter assistido cerca de mil jogos trabalhando para a CBF. Com base neles, elaborou alguns relatórios que considera decisivos para conquistas do time.

"Na disputa de pênaltis da final de 1994, o Taffarel sabia que o Baggio [da Itália] esperava o goleiro sair para escolher o canto da batida", conta dos Santos. "Isso estava no relatório que eu fiz. O Taffarel não saiu. Isso pode ter confundido o Baggio."

"Em 2002, quando o Ballack [da Alemanha] tomou o terceiro cartão na semifinal, sabia que íamos ser campeões", lembra. "Já tinha estudado a Alemanha a pedido do Felipão. Sabia que o time deles não ganharia sem o principal jogador."

Pós-CBF

A história de dos Santos na seleção, contudo, não foi suficiente para mantê-lo na CBF na era Dunga. Ele conta que chegou a analisar 40 jogos em um mesmo fim de semana a pedido de Jorginho, auxiliar-técnico do Brasil na época. Mesmo assim, em 2008, sem qualquer aviso, a espionagem de dos Santos foi dispensada.

O observador técnico continuou no futebol. Chegou a trabalhar no Flamengo, onde foi gerente de futebol durante a passagem de Ronaldinho Gaúcho pelo clube. Chegou a elaborar uma cartilha para coibir excessos do meia nas noites do Rio de Janeiro, mas fracassou. Deixou o Rubro-negro, apesar da admiração de conselheiros.

"Jairo dos Santos é incorruptível", diz Luiz Augusto Veloso, ex-presidente e ex-diretor de futebol do Flamengo. "Ele é uma freira no meio do futebol."

Após o Flamengo, dos Santos voltou a se dedicar somente a observação tática e técnica do futebol. Trabalhou em vários estudos com Thiago Larghi, que é o atual analista de desempenho da CBF. "O Thiago foi meu pupilo", diz dos Santos. "Ele começou analisando jogadas de bola parada junto comigo, trabalhando para mim."

A relação com Larghi é, segundo dos Santos, mais uma evidência de que sua volta à seleção seria fácil e produtiva caso concretizada. Já no final da conversa de mais de uma hora com o UOL Esporte, ele veste a jaqueta de um agasalho da CBF e volta a argumentar. "Eu ainda tenho muito a contribuir."

Carlos Eugênio Lopes, da CBF, disse que a entidade não conta com dos Santos. Parreira, com quem dos Santos conversou antes da atual comissão assumir, não fecha as portas para o antigo colaborador. 

"Ele falou [comigo], mas no momentos nós temos o Thiago, que está fazendo um grande trabalho. Se a gente precisar de um segundo nome, ele pode ser utilizado, mas no momento estamos só com o Thiago", disse Parreira à reportagem do UOL Esporte na terça, após a vitória do Brasil por 2 a 1 sobre o Chile. 

Reprodução Cidade News Itaú

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