terça-feira, agosto 10, 2021

Em 5 horas de depoimento à CPI, coronel evita perguntas e não dá detalhes de reunião com a Davati



Ao longo das pouco mais de cinco horas de depoimento à CPI da Covid nesta terça-feira (10), o coronel da reserva Helcio Bruno de Almeida recorreu cerca de 50 vezes ao direito ao silêncio para não responder a perguntas dos senadores.


O militar da reserva foi questionado sobre


o envolvimento com a venda de vacinas contra a Covid-19 ao governo;

a relação com uma empresa suspeita de tentar dar um golpe com a venda de vacinas;

a propagação de notícias falsas e sobre sua relação com membros do governo que lhe permitiram participar de uma reunião no Ministério da Saúde.

Ele obteve um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal que garantiu o direito de ficar em silêncio diante de perguntas que poderiam incriminá-lo. “Por orientação dos meus advogados, permanecerei em silêncio”, repetiu diversas vezes aos senadores.


Helcio Bruno é presidente do Instituto Força Brasil, uma instituição conservadora criada em 2014 e que se define como “pró-vida”, “pró-família”, “pró-armas” e “pró-liberdade”.


Na página que mantém na internet, o instituto também diz representar uma "união de patriotas" e oferecer "subsídios para o fortalecimento dos movimentos ativistas conservadores". O site não aponta nenhuma vinculação direta do Força Brasil com a área da saúde.


O militar da reserva entrou na mira da CPI após ter sido indicado como o responsável por abrir as portas do Ministério da Saúde para um encontro com o então-secretário executivo do ministério, Elcio Franco, e três supostos intermediários da empresa Davati, que ofertava, em meio à escassez mundial e com sobrepreço, 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca.


'Preocupação' com crise sanitária

Aos senadores, o militar da reserva disse que a “grande preocupação” com a crise sanitária levou o instituto a passar a defender a possibilidade de empresas e entidades privadas participarem da imunização no país – antes, publicações da entidade difundiam tratamentos ineficazes e questionavam a eficácia das vacinas, conforme apontaram senadores.


“Pelo que nós estamos vendo aqui, há uma outra conversão que precisamos registrar: o presidente de um instituto negacionista que vendia vacina. Isso é de uma contradição inacreditável”, ironizou o relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL).


Helcio Bruno de Almeida afirmou que teve uma reunião no Ministério da Saúde em março deste ano com o objetivo de tratar da compra de vacinas pelo setor privado.


Entre os participantes do encontro estavam o então secretário-executivo Elcio Franco, responsável pela aquisição de vacinas pelo governo, e também os supostos vendedores de vacina Cristiano Carvalho e Luiz Paulo Dominghetti, que se diziam representantes da empresa Davati. Ele revelou também que uma empresa interessada participou do encontro.


A reunião em 12 de março no ministério é considerada relevante pela CPI porque Dominghetti acusa que, duas semanas antes, o então diretor de Logística da pasta Roberto Dias cobrou propina em troca do negócio entre a Davati e o governo brasileiro. Dias nega a acusação.


De acordo com Helcio Bruno, quando a reunião já estava confirmada pelo ministério, o reverendo Amilton Gomes de Paula, fundador de uma organização evangélica, foi ao IFB e falou do interesse da Davati em ofertar vacinas ao governo. Após o pedido do reverendo, disse Bruno, a agenda foi compartilhada com os vendedores.


O militar, porém, evitou detalhar como conheceu o reverendo Amilton e como se deram os contatos com os participantes da reunião.


Helcio Bruno também não quis responder sobre como foram “tramitadas” as negociações para a agenda com Elcio Franco no ministério e se negou a responder quem teria “facilitado” ou “possibilitado” a realização de reuniões com membros do Ministério da Saúde.


O militar se limitou a dizer que nunca teve “relação de amizade” com Elcio Franco e que apenas pode ter se encontrado com ele “em alguma solenidade militar” de que não se recorda.


“Nunca frequentei a sua residência, não conheço a sua família e jamais almoçamos ou jantamos juntos. Não fomos contemporâneos na Aman e tampouco servimos juntos”, disse.


A ausência de respostas motivou críticas por parte de senadores.


“O seu instituto nós não sabemos quem financia. E, pela estruturação, ele não é barato. Tem dinheiro alto aqui nesse instituto, e o senhor não diz de quem é nem demonstra com transparência de onde vem esse dinheiro. Lamento que o senhor pratique completamente diferente daquilo que o senhor fala e do que o senhor posta e estimula: nenhuma transparência sobre o financiamento do site, nenhuma transparência sobre a sua atuação nessa malfadada negociação com o Ministério da Saúde”, afirmou o senador Eduardo Braga (MDB-AM).


Presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que o silêncio do coronel não impediria os trabalhos da comissão.


“Nós não iremos parar um segundo enquanto não soubermos quais são os recursos que entram na sua conta pessoal, em todas as contas que o senhor tem. Nós mandamos quebrar o seu sigilo fiscal, bancário, e não creio que alguém do Supremo vá nos proibir de investigar esse crime contra a nação brasileira. Podem até lhe dar um habeas corpus para o senhor não falar, mas daí a impedir de nós sabermos quem está financiando esse tipo de publicação [não]”, disse Aziz.


Fake news

Helcio Bruno foi confrontado com publicações feitas anteriormente pelo IFB, as quais difundiram tratamentos ineficazes e notícias falsas sobre a pandemia do coronavírus – inclusive contrárias à vacinação.


Um dos núcleos de investigação da CPI apura justamente a propagação de notícias falsas sobre a pandemia, quem financiou o disparo dessas mensagens e as empresas que teriam sido beneficiadas com a propagação de medicamentos sem eficácia para a Covid-19.


“As investigações desta CPI já provaram que o Instituto Força Brasil possui uma relação direta com a disseminação de fake news e apoio às redes que atuaram na pandemia contra medidas de isolamento, vacinas, máscaras e tantas outras que poderiam salvar vidas. Seu vice-presidente, Otávio Fakhoury, é investigado no inquérito de fake news”, afirmou o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL).


Fakhoury é um empresário bolsonarista e vice-presidente do Instituto Força Brasil. Conforme mostrou a TV Globo, relatório parcial da Polícia Federal sobre os atos antidemocráticos encaminhado à PGR no início de janeiro indica que Fakhoury bancou quase R$ 50 mil em material para campanha.


Os gastos não constam na declaração à Justiça Eleitoral. À CPI, Helcio Bruno também evitou responder perguntas sobre seu braço direito no instituto.


Relação com Bolsonaro

Em meio à negativa sobre sua relação com diversas autoridades do governo, o coronel Helcio Bruno admitiu que conhece o presidente Jair Bolsonaro.


Ele disse ter sido contemporâneo do presidente na Academia Militar – Bolsonaro era da turma de 1977, enquanto o coronel foi da turma de 1978. Apesar disso, contou, eles não tiveram contato nesta época.


O contato teria ocorrido em 2016, após o presidente manifestar que concorreria à Presidência da República.


“Aproveitei, fiz uma visita e declarei a ele que nós poderíamos ajudá-lo dentro da nossa esfera de ação. Criei um grupo de trabalho JB18, e reunimos algumas pessoas para colaborar com ele”, contou.


O militar relatou ainda um encontro com Bolsonaro em 2018, durante a campanha, e com o presidente já eleito, em maio de 2019 com a presença de militares.


“Quando eles fizeram essa visita, e eu solicitei, de maneira que eu pudesse participar e cumprimentar o presidente. Foi a última ocasião que estive com ele. O presidente não é da minha relação próxima, e é isso que eu tenho que declarar”, afirmou.


Fonte: G1

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