terça-feira, março 27, 2018

STJ nega habeas corpus a bispo de Formosa, preso acusado de liderar esquema de desvio de dízimos

Bispo de Formosa, Dom José Ronaldo, foi preso durante operação do MP, em Goiás (Foto: Reprodução)O desembargador Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou o pedido de habeas corpus feito pelo bispo Dom José Ronaldo, preso acusado de liderar um esquema que desviou mais de R$ 2 milhões em dízimos e doações à Diocese de Formosa. A decisão é liminar (provisória) e foi assinada na tarde desta segunda-feira (26).

O G1 conversou por telefone com o advogado dele, Ulisses Borges de Resende, que informou que a defesa continua preferindo não se manifestar sobre o assunto.

O juiz eclesiástico Tiago Wenceslau, que de acordo com o Ministério Público de Goiás (MP-GO) fez vista grossa às denúncias de fiéis e cobrou de padres “fidelidade” ao bispo, também solicitou liberdade ao STJ. Advogado dele, Thiago Santos Aguiar de Pádua disse à reportagem que ainda não havia sido informado sobre a decisão do ministro em relação ao seu cliente.

O bispo, o juiz eclesiástico, quatro padres e dois empresários estão presos em uma ala isolada no presídio de Formosa desde o dia 19 de março. Investigações do MP-GO apontam que o grupo teria comprado uma fazenda, carros e uma casa lotérica com recursos desviados. A operação foi batizada de Caifás e culminou com apreensões em Formosa, Posse e Planaltina.

Nesta segunda, as defesas de dois empresários, do vigário-geral, Epitácio Cardozo Pereira, e dos párocos de três igrejas nas três cidades também entraram com pedidos de liberdade, mas no próprio Tribunal de Justiça de Goiás.

Ao G1, eles informaram que a análise dos habeas corpus – distribuída à desembargadora Carmecy Rosa Maria de Oliveira – ainda não ocorreu. As defesas deles dizem ainda que as prisões preventivas são ilegais e desnecessárias e que provará a inocência dos réus.

As investigações começaram no ano passado, após denúncias de fiéis. Eles afirmaram que as despesas da casa episcopal subiram de R$ 5 mil para R$ 35 mil desde a chegada do bispo Dom José Ronaldo. Na ocasião, o clérigo negou haver irregularidades nas contas da Diocese de Formosa.


Operação Caifás
O nome da operação foi escolhido considerando que Caifás era o sumo sacerdote quando Jesus foi condenado a morrer na cruz. O MP-GO fez à Justiça pedido de 13 mandados de prisão temporária e 10 de busca e apreensão em residências, igrejas e um mosteiro.

O juiz Fernando Oliveira Samuel concluiu haver necessidade de prisão em nove casos:

José Ronaldo Ribeiro, bispo de Formosa
Monsenhor Epitácio Cardozo Pereira, vigário-geral da Diocese de Formosa
Padre Moacyr Santana, pároco da Catedral Nossa Senhora Imaculada Conceição, Formosa
Padre Mário Vieira de Brito, pároco da Paróquia São José Operário, Formosa
Padre Tiago Wenceslau, juiz eclesiástico
Padre Waldoson José de Melo, pároco da Paróquia Sagrada Família, Posse (GO)
Guilherme Frederico Magalhães, secretário da Cúria de Formosa
Antônio Rubens Ferreira, empresário suspeito de ser laranja da quadrilha
Pedro Henrique Costa Augusto, empersário, suspeito de ser laranja da quadrilha
As prisões temporárias (com validade de cinco dias) aconteceram no dia 19 de fevereiro. Cinco dias depois, o mesmo juiz aceitou a denúncia do MP-GO e os nove, além de outras duas pessoas, se tornaram réus no processo. Além disso, o secretário da Cúria foi liberado, embora continue respondendo ao processo.

Vídeo divulgado pelo MP-GO mostra o momento em que o bispo Dom José Ronaldo e o juiz eclesiástico Tiago Wenceslau são avisados sobre a prisão. A gravação mostra o momento em que Dom José Ronaldo questiona a operação, dizendo suspeitar de um “equívoco muito grande”.

“Não há nenhum equívoco, nenhum engano. A decisão consta o nome do senhor mesmo. [...] Nós estamos cumprindo uma medida judicial proferida pelo juiz, doutor Fernando Samuel, da 2ª Vara Criminal de Formosa, e ela prevê três dispositivos em relação aos senhores: o primeiro deles é uma busca aqui na residência [...], o segundo ponto é um mandado de prisão”, diz o promotor Douglas Chegury.

“O senhor [bispo] está sendo preso, vai ficar preso por cinco dias, temporariamente, podendo esta prisão temporária ser prorrogada. Com relação ao senhor, Thiago Wenceslau, o senhor também está preso temporariamente”, diz o promotor.

Dinheiro escondido em guarda-roupa
Ao todo, foram apreendidos R$ 148 mil, incluindo dólares e euros, além de outros bens, como cordões de ouro e relógios. A Justiça bloqueou ainda R$ 388 mil da conta do padre Waldson José de Melo.

Do total apreendido, R$ 90 mil estavam escondidos no guarda-roupas do monsenhor Epitácio Cardozo Pereira, segundo a hierarquia da diocese.

Vídeo mostra quando os policias entram na casa e vão até um armário, guiados pelo vigário-geral. Eles abrem o móvel e encontram três caixas de celulares e um notebook. Um dos policiais civis começa a tirar os objetos das prateleiras enquanto o religioso diz: “Esse dinheiro é da Paróquia, não é meu não. Isso é para pagar as despesas da Paróquia”.


'Mesada' por paróquias mais rentáveis
A investigação aponta ainda que padres de Formosa, Posse e Planaltina pagavam ao bispo de Formosa, Dom José Ronaldo, para que fossem mantidos em paróquias mais lucrativas. O valor mensal da "mesada" variava entre R$ 7 mil e R$ 10 mil.

Ministério Público de Goiás cumpre mandados na Igreja Católica em Formosa e Planaltina (Foto: MP-GO/Divulgação)
Ministério Público de Goiás cumpre mandados na Igreja Católica em Formosa e Planaltina (Foto: MP-GO/Divulgação)

"As informações que nós obtivemos é que, para permanecer nas paróquias que davam mais dinheiro, os padres pagavam uma mesada, em dinheiro, ao bispo. Um pároco, que contribuiu com as investigações, inclusive, chegou a ver esse repasse", disse o promotor Douglas Chegyry ao G1.

‘Juramento de fidelidade’
Convocado após denúncias de desvios de dízimos e doações na Diocese de Formosa, o juiz eclesiástico Tiago Wenceslau forjou um relatório das contas questionadas anunciando que “auditoria rigorosa” apontou não haver nenhuma irregularidade, de acordo com o MP-GO.

“[O juiz eclesiástico] Veio [de São Paulo] com um objetivo: intimidar de forma definitiva os padres e fazer com que eles fizessem, como de fato muitos fizessem, um juramento de fidelidade ao bispo [Dom José Ronaldo, apontado como líder do esquema]”, explicou o promotor Douglas Chegury.

“Chamados nominalmente, [os padres] deveriam responder se estavam com o bispo ou contra o bispo, não era com a igreja ou contra igreja. Isso aconteceu em uma reunião a portas fechadas”, completou.


Escutas telefônicas
O contador Darcivan da Conceição Serracena, responsável pelas contas da Diocese de Formosa, no Entorno do Distrito Federal, disse que eram "constantes" repasses financeiros da Cúria para a conta pessoal do bispo Dom José Ronaldo.

"Eram as transferências bancárias da cúria para conta pessoal do bispo, em torno de R$ 500, R$ 1 mil, R$ 2 mil, R$ 3 mil. Era constante. Como não tinha nota para eu prestar conta, eu lançava nota como ajuda de custo para o bispo", disse.
Questionado porque não quis denunciar o que estava acontecendo, ele respondeu: "Eu não tinha força, sozinho, para denunciar".

Em uma interceptação telefônica autorizada pela Justiça, Darcivan explica como justificava o dinheiro no balanço das igrejas.

"Eu faço uma carta aqui, boto eles para assinar falando que lá não tem o dinheiro, aí eu mando eles declarar que lá não tem o dinheiro e baixo isso aqui na contabilidade".

Segundo a promotora Fernanda Balbinot, uma das responsáveis pela operação, afirmou que o contador simulava que o valor desviado não existia.

"Ao invés de serem apresentadas notas fiscais e recibos competentes dos gastos efetuados com aquele montante era produzido um documento dizendo que aquele dinheiro não existia", destaca.

Em outro trecho, o padre Moacyr Santana, pároco da Catedral Nossa Senhora Imaculada Conceição, em Formosa, fala com o empresário Antônio Rubens confirmando se a compra de carros havia dado certo. Ambos estão presos.

“Ainda bem que os carro pagou direitinho, né Rubinho? (sic)”, questiona o padre na ligação. Em seguida, o empresário concorda.

Fonte: G1

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