quarta-feira, julho 23, 2014

Ex-delegado diz que transportou 13 corpos para incineração na ditadura

Cláudio Guerra observa foto de acidente que causou a morte da estilista Zuzu Angel (Foto: Felipe Néri / G1)O ex-delegado do Departamento da Ordem Política e Social (Dops) do Espírito Santo Cláudio Antônio Guerra, envolvido em assassinatos cometidos durante a ditadura militar
(1964-1985), afirmou nesta quarta-feira (23) que carregou em seu carro, para serem incinerados, os corpos de 13 perseguidos pelo regime mortos por agentes policiais.
Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV), ele reconheceu as imagens de 19 vítimas da ditadura. De acordo com Guerra, desses 19 corpos, 13 foram carregados por ele para incineração na Usina de Açúcar de Cambaíba, em Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro. Dos 13, disse ter sido o autor do assassinato de um. O ex-delegado também afirmou ter matado outras cinco ou seis pessoas.
Segundo Guerra, os corpos eram retirados de um quartel onde as vítimas eram torturadas, no Rio de Janeiro, e da Casa da Morte, em Petrópolis, também destinada a ações de tortura e assassinato.
O ex-delegado disse que carregou as vítimas no porta-mala de seu próprio carro, um Chevette, entre 1975  1977. Apesar de afirmar ver os corpos com frieza na época dos assassinatos, Guerra se disse arrependido.

“Eu olhava os corpos de curiosidade […]. Vinham num saco plástico. O nosso ser humano, a gente, é curioso. Embora fosse uma coisa macabra, eu não sentia nada. Hoje, olhar para pessoas... O senhor não calcula como eu estou por dentro, como é ruim pra mim. Mas é dever meu fazer esse papel de colocar a cara para apanhar, sem interesse algum a não ser o interesse na verdade”, disse Guerra
O ex-delegado foi chamado para prestar depoimento para que a Comissão Nacional da Verdade pudesse checar informações prestadas por ele anteriormente sobre o paradeiro das vítimas da chamada Casa da Morte de Petrópolis; sobre o caso da bomba que explodiu no estacionamento do Riocentro, no Rio; e sobre a morte da estilista Zuzu Angel. Os três episódios foram abordados em relatórios preliminares da CNV, divulgados nos últimos meses.
Cláudio Guerra está entre os seis denunciados pelo Ministério Público Federal por envolvimento na explosão no estacionamento do Riocentro, na Zona Oeste do Rio, em abril de 1981. A bomba explodiu dentro de um carro no estacionamento e matou o sargento Guilherme Pereira do Rosário.
Segundo a denúncia do MPF, formulada em abril deste ano após dois anos de investigação, o então delegado integrava uma das equipes operacionais encarregadas de efetuar prisões de falsos acusados a fim de envolvê-los com o atentado.
Morte de Zuzu Angel
Em seu depoimento, Guerra também disse que o coronel Freddie Perdigão, apontado por ele como o mandante de vários crimes cometidos durante a ditadura, teria confessado ter planejado o acidente de carro que matou a estilista Zuzu Angel, em um túnel no Rio em 1976. Perdigão foi amigo pessoal de Guerra e morreu em 1998, segundo o ex-delegado.
Guerra levou para a comissão foto que teria sido usada pela perícia na época do acidente. A imagem, no entanto, está recortada e não revela todo o ambiente, mas segundo o ex-delegado, Perdigão aparece junto à equipe de resgate no local onde Zuzu Angel morreu.

“Ele narrava para mim que ele tinha planejado, obedecendo a ordens, essa simulação do acidente dela. E ele estava preocupado porque achava que a perícia tinha fotografado imagem dele sem querer”, explicou.
“Foi autoria dele [o acidente]. Ele não falou qual carro foi usado para bater no dela. Só falou que ele estava lá e conferiu. Estava lá para conferir e foi fotografado no local”, completou Guerra.
Para o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Pedro Dallari, a revelação sobre as participações do coronel na morte de Zuzu Angel é um dos principais avanços no depoimento de Guerra. Segundo ele, a informação deverá se somar a outros elementos na investigação para determinar se a morte da estilista foi assassinato.
“É importante o reconhecimento que ele [Guerra] faz da presença de Freddie na cena do acidente de Zuzu Angel. Até hoje, as Forças Armadas negam participação. A figura de Freddie na cena do aciedente estabelece ligação entre o acidente de Zuzu Angel e o sistema de repressão”, declarou Dallari.
Nesta quinta-feira (24), a CNV deverá ouvir novamente Cláudio Guerra. Em reunião fechada, os membros do colegiado questionarão o ex-delegado sobre a morte de cada uma das vítimas da ditadura identificadas por ele.
“Ao final das investigações, teremos um capítulo sobre cada uma das mortes identificadas. Vamos procurar saber melhor de cada caso reconhecido por ele”, disse o coordenador.

Reprodução Cidade News Itaú via G1

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