domingo, abril 09, 2023

'O Sinte está sendo intransigente e penalizando o aluno', diz secretário de Planejamento

Aguardando nomeação para a diretoria de Planejamento do Banco do Nordeste, o secretário de Finanças e Planejamento do Rio Grande do Norte, Aldemir Freire, se prepara para deixar a pasta nos próximos dias. Em entrevista exclusiva à TRIBUNA DO NORTE, Aldemir aproveitou para pontuar os principais feitos de sua gestão e detalhar a situação fiscal do Estado. O economista diz que se orgulha de ter alcançado o equilíbrio nas contas, mas reconhece que o Rio Grande do Norte ainda está longe de ter um caixa plenamente saudável.


Alex Regis
Aldemir Freire, secretário de Planejamento


Aldemir afirma que encontrou um déficit acumulado de quase R$ 4 bilhões da gestão anterior e conseguiu implementar um ajuste fiscal que culminou em resultados superavitários. Segundo o chefe das contas estaduais, o Rio Grande do Norte ainda enfrenta dificuldades para quitar dívidas do passado e sofreu um baque com a desoneração do ICMS na segunda metade de 2022. Ele defende que o reajuste de impostos seja mantido, mesmo após compensações federais, para que o Estado não termine o ano no vermelho.


Na conversa, Freire criticou ainda a ação judicial impetrada por entidades produtivas do Estado contra o aumento de impostos e negou que o Rio Grande do Norte irá perder competitividade. Além disso, o economista subiu o tom contra o sindicato dos professores estaduais, classificando-o como intransigente. Ele considera que a despesa com os professores é a questão central das contas do Estado. Em greve há um mês, a categoria reivindica o pagamento integral do novo piso do magistério, o que Freire diz ser “impossível” de atender, sob pena de atrasos salariais. Confira:


Que balanço o sr. faz da sua gestão?


A coisa mais importante que a gente fez foi reverter uma tendência. O estado do Rio Grande do Norte vivia um histórico de déficit orçamentário acumulado. De 2014 até 2018 o Estado acumulou um déficit orçamentário de aproximadamente R$ 3,7 bilhões. E o que é isso? Se eu pegar as receitas de cada ano e as despesas de cada ano e somar, nós vamos ter quase R$ 4 bilhões. O Estado vinha numa trajetória de déficit seguido, que estava virando uma bola de neve e não era um déficit orçamentário saudável. O estado se endividar para fazer investimento com instituição financeira que leva 30 anos para pagar não é um problema, o problema é que o estado vinha se endividando e vinha acumulando déficit orçamentário junto com fornecedores e com servidores, então o Estado vinha numa trajetória de ladeira abaixo. A gente funcionava com uma âncora, puxando o desenvolvimento do estado para baixo, na medida que não tinha política de desenvolvimento e atrasando salário. Desde que a gente assumiu, nós dissemos que iríamos fazer um ajuste fiscal, mas ele não seria um ajuste fiscal brusco, como uma virada de 180 graus. Primeiro o estado já tinha um problema de custeio, que já estava praticamente no osso, já não fazia investimento. Tinha deficiência de pessoal em várias áreas. Eu dizia lá atrás que nós precisávamos segurar nosso crescimento das despesas e deixar que as receitas crescessem mais do que as despesas, ao contrário do que vinha acontecendo. Todo ano se gastava mais do que arrecadava. Essa foi a principal virada que fizemos e a partir de 2020 a gente passou a ter superávit orçamentário. Ter superávit orçamentário não é necessariamente uma vantagem se fosse um período normal, mas para a gente é. Para a gente ele foi necessário nesses três anos da nossa gestão. Foi necessário porque você tinha que pagar as dívidas do passado e nós ainda precisamos manter superávit pelas próximas duas gestões, nós precisamos mais ou menos de oito anos mais para frente com o Estado mantendo superávit para ter um Estado plenamente saudável. Nós equilibramos as contas.


E para onde foi esse superávit?


Para pagar as contas passadas. Nós ainda estamos num processo de pagar contas passadas, mas ainda não concluímos. Daí a necessidade de mais superávit pelos próximos anos. Isso resultou, por exemplo, no pagamento das folhas em atraso e ter reduzido o débito com fornecedores e com credores em geral. O grande norte que a gente fez foi ter virado essa chave de um estado permanentemente deficitário para um estado com orçamento equilibrado. Esse processo não se encerrou, é um processo lento que ainda vai levar alguns anos. Isso que Haddad está fazendo, nós fizemos lá atrás, uma PEC dizendo que as despesas, salvo saúde e educação, cresceriam apenas 70% do crescimento das receitas. Com o aumento do nível de investimentos, com a reforma que nós fizemos no programa de incentivos fiscais do Estado, nós já podemos dizer que o Estado já é um dos motores do crescimento da economia do Rio Grande do Norte.


O sr. está de saída da pasta de Finanças do Estado porque foi indicado pela governadora para ocupar a diretoria de Planejamento do Banco do Nordeste. Quais serão os principais projetos do novo cargo?


Ainda não há nomeação, portanto sou secretário. É uma honra, mas não posso falar sobre o assunto.


Pode adiantar algo? O RN terá grandes investimentos?


Não posso falar pelo cargo que ainda não assumi.


Se o Estado está com as contas equilibradas, com sucessivos resultados superavitários, por que a necessidade de aumento de impostos?


Quando terminamos o primeiro semestre do ano passado, o Estado estava com um superávit orçamentário da ordem de R$ 700 milhões a R$ 750 milhões. Nós terminamos o ano com superávit de R$ 167 milhões, ou seja, significa que o segundo semestre foi negativo em quase R$ 600 milhões. O efeito da medida que desonerou o ICMS continua presente. O superávit que a gente obteve no ano está mascarando um déficit que nós estamos registrando desde o segundo semestre do ano passado. Se nós não mudarmos a trajetória, corremos o risco de ter um déficit no final desse ano porque nós perdemos efetivamente R$ 80 milhões por mês. Aquele superávit serviu para cobrir o déficit que a gente passou a ter a partir da edição da lei [LC 194/22]. Essa perda continua, mas não perdemos só o ano passado. Nós perdemos no ano passado cerca de R$ 480 milhões e já perdemos esse ano R$ 80 milhões/mês em três meses. Ou seja, já perdemos R$ 240 milhões e se jogarmos para 12 meses vamos perder R$ 1 bilhão. Admitir que nós vamos conseguir acomodar R$ 1 bi nessa conta é uma ingenuidade.


A necessidade se mantém mesmo com a compensação do Governo Federal?


A medida vai compensar apenas uma parte das nossas perdas, nós vamos ter compensados aproximadamente R$ 270 milhões, que é menos do que a gente perdeu no ano passado e não vai compensar as perdas desse ano. Além disso, vai ser uma parte nesse ano e uma parte no próximo ano. Vai ser uma compensação das dívidas que a gente tem com a União.


As entidades produtivas do Estado pedem a derrubada do reajuste do ICMS na Justiça. O que pensa sobre isso?


A judicialização tem um erro bárbaro. A lei é clara. A lei diz que havendo compensação o Estado pode suspender os efeitos da lei e a lei entra pela noventena, pela regra, em validade após 90 dias da sua promulgação. No momento atual não existe nenhum mecanismo legal que garanta a compensação. Existe um documento assinado por 27 governadores, mas não existe homologação do Supremo Tribunal Federal. Legalmente não existe compensação. Chega dia 1º de abril e existe uma lei, que diz que os efeitos desta lei serão suspensos se existir a compensação. Hoje não existe nenhuma compensação. Não existe nenhum instrumento legal que compense, então não há outra alternativa. O Governo não pode escolher qual lei ou não aplicar. A lei existe e dia 1º ela teria que necessariamente ter entrado em vigor. É onde está, inclusive, o erro da judicialização. Judicializaram uma lei que o Estado é obrigado a cumprir. Os requisitos para a suspensão da lei não estão postos. Não existe um juiz que vá dar, nesse momento, a suspensão da lei porque não existem os requisitos para a suspensão da lei, o que é previsto na própria lei. O juiz, inclusive, poderia ter delegado de cara.


Os empresários apontaram ainda possível perda de competitividade para outros Estados. Como analisa isso?

Ponto um: nós não fomos o único estado do País que fizemos [reajuste]. Ponto dois: a grande perda de competitividade que nós teremos é um estado quebrado. Ponto três: não há possibilidade de qualquer empresa do Rio Grande do Norte se transferir para outros estados porque o ICMS vai subir temporariamente por nove meses. A possibilidade é zero. Isso porque o custo de transferência é muito mais caro do que isso, então nós não vamos perder competitividade porque, diferentemente de outros estados que fizeram, nós somos um dos que fizeram transitório. Outros fizeram definitivo.


A exemplo do secretário Carlos Eduardo Xavier, o sr. já declarou que em caso de compensação, a governadora irá rediscutir o assunto com os deputados. O que significa “rediscutir”? A lei que aumentou o ICMS de 18% para 20% será mantida ou derrubada?

 Na prática, a compensação, quando estiver valendo a lei, nós vamos poder compensar apenas R$ 4 milhões por mês. Porque a compensação não é auto aplicada completamente. Se nós formos compensar, do jeito que está lá na lei, sem a necessidade de outros outros instrumentos, fora do que estão lá, nós vamos poder compensar apenas as dívidas que nós temos com a União. Então nós vamos conseguir compensar R$ 4 milhões/mês. Se a gente ficar nessa compensação, vai levar quase 72 meses para compensar o recurso todo. Então a discussão que eu faço é: vamos abrir mão integralmente da lei apenas para receber R$ 4 milhões/mês?


Portanto é uma sinalização de que o reajuste será mantido?

A data de hoje é simbólica [último dia 5]. Normalmente entravam no dia de hoje, aqui na Seplan, R$ 150 milhões. Hoje entraram R$ 70 milhões. Então não tem como a gente acomodar isso porque isso é dinheiro que iria para Saúde, Educação, Segurança, pagar fornecedor, pagar salário.  Aquele equilíbrio que a gente tinha conseguido nas contas está seriamente ameaçado por esse sistema. O maior prejuízo que nós podemos voltar a ter é um Estado quebrado, como ele era anteriormente. É preciso ter responsabilidade. Não é só uma responsabilidade do Estado. A Assembleia Legislativa precisa ter responsabilidade, os representantes públicos no Congresso Nacional do Rio Grande do Norte precisam ter responsabilidade. E não, irresponsavelmente, até meio que por ignorância - no sentido de falta de saber jurídico - judicializar uma lei onde os pré-requisitos da própria lei ainda não estão nem postos.


Qual a solução para afastar os riscos de atrasos salariais e perdas de investimento em virtude de um possível déficit em 2023?

Tem dois dois fatores-chave para não terminarmos o ano no negativo. Primeiramente são os plenos efeitos desse acordo [de compensação]. Os plenos efeitos desse acordo não serão de imediato, vão levar pelo menos uns 90 dias para os efeitos serem sentidos no caixa do Estado. A gente precisa disso. Outro elemento importante que a gente precisa equacionar é o piso dos professores, que é outra discussão grande.


Durante a campanha de reeleição, a governadora Fátima Bezerra destacou que os recursos utilizados para quitar as folhas atrasadas do governo Robinson estariam “livres” para investimentos, sobretudo em estradas, em um segundo mandato. Essa promessa está ameaçada?

Os investimentos ficam comprometidos por esses dois fatores, por um lado você precisa fazer a recuperação da receita e pelo outro você precisa definir a questão do piso dos dos professores.


Sobre o piso dos professores, a categoria encaminhou uma nova contraproposta para encerrar a greve. É viável para o Governo aceitar?

Não. Eles permaneceram com a mesma ideia de que tudo precisa ser pago em 2023. Eu faço uma conta simples: terminou o primeiro trimestre agora, eu fiz umas continhas. Entre o primeiro trimestre de 2022 e o primeiro trimestre 2023, as receitas cresceram 4,28%, abaixo da inflação acumulada para o período. Nossa receita não está crescendo nem acima da inflação. Os professores estão pedindo 14,95%. Se eu pegar esse 4,28% e aplicar na receita corrente líquida do Estado, a receita vai subir R$ 600 milhões neste ano. Só o piso deste ano custa R$ 580 milhões. Nós estamos pagando um parcelamento do piso do ano passado de R$ 30 milhões por mês, o que dará perto de R$ 300 milhões. O resto do piso dos professores, que foi de 33% do ano passado, mais o desse ano, dá cerca de R$ 680 milhões. A receita do estado só vai subir R$ 600 milhões. É o dinheiro que nós teremos para tudo. De onde é que nós vamos tirar dinheiro para isso? Não é uma discussão se a demanda dos professores é justa. Nós não estamos discutindo nem o piso em si, mas sim o reajuste. Nós não temos problema nenhum em pagar o piso para quem ganha abaixo do piso. O problema é dar quase 15% de aumento para toda a carreira, retroativo a janeiro, extensivo aos inativos. Não estamos dizendo que não vamos dar os 14,95%. Estamos dizendo que vamos dar, mas nós vamos fazer com que esses 14,95% caibam no orçamento. Não faz nenhum sentido deixar de aumentar gastos com saúde, manutenção das escolas, resolver o problema das estradas porque eu vou pegar o dinheiro todinho e entregar aos professores. Estamos propondo um parcelamento que não afete as outras demandas da sociedade. Há sim uma incapacidade do Sinte de diálogo. O Sinte não avançou no diálogo e foi a categoria mais beneficiada nessa gestão. O sindicato que está sendo intransigente e está penalizando o aluno.


O fato da governadora Fátima Bezerra ter sido uma líder sindical do próprio Sinte e uma das principais defensoras do piso não cria um constrangimento para o Governo?

A governadora não é a governadora dos professores. A governadora é governadora da população do Rio Grande do Norte. Ela não vai fazer uma gestão pensando apenas numa categoria em particular. Nós já avançamos muito, nós não estamos na primeira proposta, já avançamos nas propostas. O sindicato insiste [em manter a pedida inicial] e isso não vai acontecer por uma questão simples: não cabe. Alocar R$ 580 milhões esse ano para pagar o piso e pagar mais R$ 300 milhões [referente ao parcelamento do piso do ano passado] não tem como. Não tem esse dinheiro. É simples. Essa é uma discussão que eu acho que o sindicato teria que fazer com a população. A população do Rio Grande do Norte quer isso? Quer que o estado pegue hoje R$ 850 milhões, mais do que o vai ter de aumento de receita, e entregue a uma única categoria? É uma questão social. O sindicato está sendo intransigente. Isso é impossível de ser atendido. Se atender [a demanda], o Estado vai atrasar salário de todo mundo. Do ponto de vista das despesas do Estado, nenhuma despesa tem um impacto maior do que essa do piso dos professores. Ela é central.


Fonte: Tribuna do Norte

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