segunda-feira, abril 03, 2023

Em grupo de WhatsApp, funcionárias da Petrobras relatam assédio de chefes e abusos sexuais: 'a gente botava cadeira na porta à noite porque era proibido trancar'

Em um grupo de WhatsApp, funcionárias da Petrobras relataram dezenas de episódios de assédio sexual cometido por colegas de trabalho e superiores hierárquicos quando estavam embarcadas em plataformas e também em outras unidades da empresa, como o Centro de Pesquisas (Cenpes).


Edifício-sede da Petrobras, no centro do Rio — Foto: Marcos Serra Lima/g1


As denúncias de assédio foram reveladas por Ancelmo Gois, colunista do jornal "O Globo".


A GloboNews teve acesso a um compilado de 53 mensagens com relatos espontâneos de pessoas que foram vítimas dos abusos ou também testemunhas de agressões contra as trabalhadoras, como alguns exemplos abaixo:


"A gente botava cadeira na porta à noite porque era proibido trancar… Uma amiga passou por uma situação bizarra. Chegou no camarote e tinha um cara mexendo nas calcinhas dela."


"Voltando de um evento da gerência à noite, dividi o Uber com o meu gerente imediato. Quando chegou na casa dele, ele começou a me agarrar. Depois de conseguir fazer com que ele parasse, ele veio insistir que queria ir para minha casa, obviamente não deixei."

"Embarquei uma única vez, no curso de formação. Me colocaram num quarto com um químico. No começo fiquei de boa pq a gente tinha horário trocado e nunca via ele no quarto. Até um dia que entrei e ele estava deitado assistindo a um filme pornô na tv do quarto. Saí na mesma hora para falar com o fiscal que não ficaria mais naquela situação."


"A recepcionista da gerência que eu trabalhava teve o seio apalpado por um petroleiro, dentro da empresa. O caso virou o escândalo da gerência e todo mundo soube do caso, mas a chefia não fez nada. A moça foi transferida de área."


As mensagens foram compartilhadas depois que a GloboNews revelou que funcionárias terceirizadas do Centro de Pesquisas da Petrobras, na Ilha do Fundão, Zona Norte do Rio, denunciaram um petroleiro por assédio sexual em 2022.


O Ministério Público do Rio denunciou o agressor por assédio e importunação sexual contra uma mulher, que prestava serviços à empresa. Segundo o MP, o agressor, "esfregou por três vezes o pênis nas nádegas da vítima, conforme registro de ocorrência feito pela vítima" e tentou forçar relações sexuais com ela.


Além disso, usando de sua condição de superior hierárquico, o petroleiro "balançava seu crachá e passava a constrangê-la de forma insistente, mesmo com a sua recusa, tendo por fim surpreendido a funcionária, enquanto a mesma realizava a limpeza de uma pia, a abordando pelas costas e esfregando o pênis em suas nádegas", afirmou o MP. As denúncias de outras duas auxiliares de limpeza contra o mesmo petroleiro também foram feitas à Polícia Civil.



Já o Sindicato dos Petroleiros do Rio (Sindipetro-RJ) comunicou a gerência da unidade, a ouvidoria e o departamento de RH da Petrobras, em novembro de 2022, que quatro trabalhadoras da área de limpeza de uma empresa terceirizada tinham sido assediadas sexualmente pelo petroleiro, sendo uma delas vítima de estupro, dentro do Cenpes. O ofício do SindiPetro, ao qual a GloboNews teve acesso, "diante da gravidade da situação e da insegurança gerada, uma das vítimas pediu demissão". No documento, o sindicato cobrava proteção das mulheres e celeridade na apuração das denúncias.


A diretora do sindicato disse nesta segunda-feira (3) que o petroleiro foi demitido após a denúncia do MP. Mas que, até então, a ouvidoria da Petrobras havia arquivado o caso alegando não ter encontrado provas contra o funcionário. Durante o processo de investigação interna, o petroleiro teria sido transferido de setor, mas mantido na mesma unidade onde os abusos ocorrem e onde as vítimas também trabalhavam.


O Ministério Público do Trabalho (MPT) aguarda a remessa dos documentos por parte do Ministério Público Estadual para abrir uma investigação trabalhista sobre o caso. Isso deve acontecer ainda nesta segunda-feira.


A Petrobras confirmou que o petroleiro foi demitido após a denúncia do MP - apesar de a ouvidoria ter aberto investigação em 2022 - e que o processo segue em andamento na Justiça.



"Imediatamente após receber as denúncias, a Petrobras abriu uma apuração interna e adotou as medidas cabíveis dentro do âmbito administrativo. A Petrobras reafirma que não tolera qualquer ato de violência, agressão, atitudes de assédio moral ou sexual ou atitudes e comportamentos discriminatórios contra qualquer pessoa", disse a empresa.


A nova gestão da companhia iniciou imediatamente uma análise minuciosa dos mecanismos de combate e prevenção ao assédio e violência nos ambientes de trabalho. A partir disso, medidas rigorosas e diligentes podem ser apresentadas para fortalecer esses mecanismos.


'Processo de proteção masculina'

Para a diretora do Sindipetro-RJ e integrante do Grupo de Trabalho Diversidade e Combate às Opressões, Natália Russo, a empresa ainda vive um processo de proteção masculina quando os assédios ocorrem. Do quadro da Petrobras, 17% são mulheres, segundo a entidade. Mas nas refinarias, a proporção é bem menor. "Nas refinarias, na área operacional, a realidade é ainda pior porque você tem 2... 3 mulheres em um universo de 200 homens. E quando as mulheres conseguiram denunciar, os homens não tinham punição e não perdiam o cargo. Só eram transferidos de setor. Isso aconteceu em muitos casos", afirmou


Como o blog publicou, Jean Paul Prates, presidente da Petrobras, disse que a empresa vai fortalecer medidas de combate ao assédio após tomar conhecimento de relatos de mulheres. Em mensagem divulgada neste sábado (1º), Prates afirmou que tomou conhecimento "de novos relatos, além dos anteriormente divulgados, de que mulheres que, em diferentes momentos da história da companhia, viveram situações de assédio, constrangimento e violências por gênero."



Na mensagem, Prates afirmou que se solidariza com as mulheres que foram vítimas e que fez uma reunião com alguns gerentes executivos para propor ações mais firmes e célebres de enfrentamento.


Fonte: Blog da Andréia Sadi

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