domingo, maio 30, 2021

Dois homens atingidos pela PM com balas de borracha nos olhos perdem parte da visão; eles não participavam de protesto contra Bolsonaro

Os dois homens atingidos nos olhos por balas de borracha atiradas pela Polícia Militar, durante o protesto contra o presidente Bolsonaro (sem partido) no Recife, perderam parte da visão. A operação truculenta dos policiais ocorreu na manhã do sábado (29), no Centro do Recife. Segundo parentes, as duas vítimas foram ao Centro da cidade para trabalhar, e não participavam do ato.


Daniel da Silva perdeu parte da visão após ser atingido no olho por bala de borracha atirada pela PM em protesto contra Bolsonaro — Foto: Hugo Muniz


Um dos feridos foi o adesivador de táxis Daniel Campelo da Silva, de 51 anos, que perdeu o globo ocular e foi atingido, também, nas costas.


Ele mora no bairro dos Torrões, na Zona Oeste do Recife, e foi ao Centro da cidade buscar material de trabalho. Precisou descer do ônibus na Rua Sete de Setembro, devido à interdição da Avenida Conde da Boa Vista. Na Ponte Duarte Coelho, foi surpreendido pela repressão da PM.


"Ele não estava nem no protesto. Tinha encomendado material para adesivar os táxis, porque, para ele, não tem feriado nem fim de semana. Ele trabalha todos os dias. Tem uma filha recém-nascida e um filho autista que dependem dele. Só tem essa renda, dos táxis, para tudo", afirmou o filho de Daniel, o vigilante Júlio Campelo.


"O dano que o estado fez com meu pai é irreversível. Ele está sentindo muita dor", disse o filho de Daniel.

Daniel foi socorrido por um amigo taxista ao Hospital da Restauração, no Centro do Recife. No local, foi transferido para a Fundação Altino Ventura, unidade de saúde referência em tratamentos oftalmológicos. No entanto, devido ao inchaço do olho, os médicos não puderam fazer nenhum procedimento.



Daniel Campelo da Silva perdeu o olho após ser atingido por bala de borracha atirada pela PM, no Recife — Foto: Reprodução/WhatsApp


"Ele voltou para a Restauração. Não tem muito mais o que fazer, mas o médico disse que é preciso fazer uma limpeza, para não infeccionar. Ele disse que, na manifestação, não tinha nenhum tipo de truculência e, do nada, os PMs começaram a atirar", declarou o filho da vítima.



'Não tem desculpa'

Além de Daniel, outras duas pessoas foram socorridas ao Hospital da Restauração devido à ação da PM. Uma foi Ednaldo Pereira de Lima, de 58 anos, atingido por bala de borracha na perna esquerda.


A outra foi o arrumador Jonas Correia de França, de 29 anos. Ele foi atingido no olho esquerdo e, segundo a esposa, a dona de casa Daniela Barreto de Oliveira, a situação é irreversível. Vídeos enviados ao WhatsApp da TV Globo mostram o arrumador no chão da Ponte Duarte Coelho, chorando, depois de ser atingido no olho.


"Há 99% de chances de que ele perca totalmente a visão. Ele saiu do trabalho, passou no Mercado de São José, comprou a carne que eu pedi e estava voltando para casa, de bicicleta. Ele me ligou para dizer que ia demorar, porque estava esperando o protesto passar. Quando desligou o telefone, os policiais fizeram isso com ele. Não deram assistência nem socorreram e queriam impedir que eu e meu cunhado passássemos de carro para levar ele ao hospital", afirmou Daniela.


Jonas Correia de França foi atingido por balade borracha no olho pela PM, no Recife — Foto: Reprodução/WhatsApp


Jonas Correia de França, que mora no bairro de Santo Amaro, no Centro da cidade, foi levado ao Hospital da Restauração pelos familiares e transferido à Fundação Altino Ventura. Ele precisou retornar ao HR para esperar que o olho desinchasse.


"Um policial, ontem, foi até o hospital pedir desculpas. Ele disse 'não tem desculpa para o que vocês fizeram comigo, eu sou um pai de família'. Agora, Pedro Eurico [Secretário de Justiça e Direitos Humanos] disse que vai me buscar amanhã [segunda-feira, 31 de maio] para conversar comigo, em nome do governador", afirmou Daniela.

"O estado fez isso com meu marido e, no hospital, nem remédio tinha para dar para ele. Meu sogro teve que comprar. Meu filho de 9 anos está arrasado. Nós dependemos dele para tudo, porque só ele trabalha e traz o ganha-pão", declarou a esposa.


O G1 entrou em contato com a Secretaria Estadual de Saúde (SES) para saber sobre a falta de remédios para atender o paciente, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.


Resposta do governo

Por meio de nota divulgada neste domingo (30), o governo de Pernambuco se manifestou sobre as duas vítimas atingidas no olho.


No texto, disse que o governador Paulo Câmara (PSB) determinou que a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SJDH) "acompanhe a assistência médica aos dois homens feridos no rosto" e acionou a Procuradoria Geral do Estado para "iniciar o processo de indenização aos atingidos".


"Assim como estamos acompanhando a investigação que está sendo realizada pela Corregedoria, também vamos seguir de perto a assistência às pessoas que resultaram feridas", disse o governador.


Ainda na nota, disse que a Corregedoria-Geral da Secretaria de Defesa Social começou a ouvir depoimentos sobre a ação truculenta da polícia.


No sábado (29), o governador afastou o comandante da operação da PM no protesto e quatro policiais militares envolvidos na agressão à vereadora do Recife Liana Cirne (PT), que foi atingida com spray de pimenta no rosto por policiais.


Antes, a vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos (PCdoB) postou um vídeo no Twitter em que afirmou que a ação policial não foi autorizada pelo estado.


Manifestação era pacífica

Organizado por centrais sindicais e movimentos sociais, o ato realizado no sábado (29), no Recife, era contra Bolsonaro e a favor da aceleração de medidas de prevenção à Covid-19, como a campanha de vacinação e auxílio emergencial de, ao menos, R$ 600. A manifestação fez parte de uma mobilização nacional.


O grupo de pessoas se reuniu na Praça do Derby, no Centro do Recife. Também houve, durante a concentração para a manifestação, distribuição de máscaras do tipo PFF2, nomenclatura brasileira que é equivalente à americana N95, cujo potencial de filtragem é maior que máscaras de pano.


Com faixas compostas de mensagens como "estou na rua porque Bolsonaro recusou mais de 150 milhões de vacinas" e "fora Bolsonaro genocida", os manifestantes seguiram em caminhada pela Avenida Conde da Boa Vista, na mesma região da capital. Eles se organizaram em filas, para tentar respeitar um distanciamento social mínimo e prevenir o contágio pela Covid.


Por volta das 11h30, a manifestação chegou à Ponte Duarte Coelho. No local, a Polícia Militar começou a dispersar os manifestantes. Bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha foram atiradas contra os participantes do ato.


Houve correria e gritaria e, ao menos, três pessoas foram socorridas para o Hospital da Restauração. O cantor Afroito foi arrastado e detido por policiais militares durante o protesto, sendo liberado após pagar fiança de R$ 350.


Fonte: G1

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