quinta-feira, outubro 31, 2019

Número de alunos negros reprovados nas escolas do Brasil é duas vezes maior que o de brancos, diz Unicef

Dos 2,6 milhões de estudantes de ensino fundamental ou médio que reprovaram de ano em 2018, 48,41% são negros (pretos ou pardos). Segundo estudo da Unicef, o número de reprovados neste grupo é duas vezes maior que o de brancos, somando, em 2018, mais de 1,2 milhão de estudantes reprovados.

O levantamento divulgado na tarde desta quinta-feira (31) foi feito com base nas informações das matrículas nas escolas públicas estaduais e municipais brasileiras. Ele faz parte da estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar, mantida pelo Unicef em parceria com o Instituto Claro e que inclui a divulgação de dados sobre a qualidade da educação e um curso online para educadores em um portal na internet, além de cadernos com recomendações para escolas estaduais e municipais enfrentarem o problema, e suporte individual a redes de ensino pelo Brasil.


Segundo Ítalo Dutra, chefe de Educação do Unicef, o foco do estudo foi na vulnerabilidade de alguns grupos de alunos com maior propensão à reprovação. Por isso os dados comparam os resultados segundo a raça/cor, o gênero, a localização da escola e o fato de os alunos terem ou não deficiência.

Estudantes que repetem de ano
O estudo, feito com base nos dados do Censo da Educação Básica de 2018, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em janeiro deste ano, mostra ainda que a raça não é o único critério que pode deixar os alunos mais vulneráveis à reprovação e a ficarem atrasados em relação à idade, o que aumenta o risco de abandonarem a escola.


Segundo o Unicef, outros recortes, como gênero, portadores de deficiência ou localidade da escola podem aumentar ou não a probabilidade de reprodução. As comparações feitas pelo órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que:

11,3% dos meninos reprovaram de ano em 2018, contra 6,9% das meninas;
Já entre os estudantes com alguma deficiência, a taxa de reprovação foi de 13,82%. No grupo de alunos sem deficiência, ela cai para 8,68%;
Nas escolas rurais, um a cada dez alunos não passou de ano (10,29%). Considerando os estudantes da zona urbana, a taxa foi de 8,96%.

Alunos do ensino médio  — Foto: Eduardo Apolinário/TV Globo
Alunos do ensino médio — Foto: Eduardo Apolinário/TV Globo

Estudantes atrasados
A reprovação faz com que os estudantes acabem atrasados em relação aos colegas da mesma idade. Em 2018, segundo o Unicef, o Brasil tinha 6.474.641 alunos com dois ou mais anos de atraso escolar. Isso representa 22% do total de matrículas nos três níveis de ensino.


Essa é a chamada "distorção idade-série". Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), a meta definida em 2014 e aprovada por unanimidade no Congresso Nacional prevê que, até 2024, 95% dos adolescentes de 16 anos tenham concluído pelo menos os oito anos do ensino fundamental, e que 85% dos adolescentes de 15 a 17 anos estejam matriculados no ensino médio.

Os dados analisados pelo Unicef indicam que, no Brasil, esse problema varia conforme as regiões e vai piorando conforme aumenta a idade do estudante: no ensino fundamental I (anos iniciais), 13% dos alunos estão com dois ou mais anos de atraso, um índice que salta para 28% e 31% no fundamental II (anos finais) e no médio, respectivamente.

Entre os meninos, mais uma vez as taxas são mais altas: 26,2% deles estavam atrasados em pelo menos dois anos em 2018. Considerando as alunas meninas, esse índice cai para 18,31%;
A distorção é ainda maior entre os estudantes com deficiência: 48,67% deles estavam matriculados em duas séries atrás do esperado para a idade, no mínimo; entre os estudantes sem deficiência, essa defasagem foi de 22,16%;
Já na zona rural, essa taxa foi de 27,3%, comparado com 21,5% na zona urbana.
Estudantes que abandonam a escola
Em 2018, o Unicef aponta que 912.524 estudantes matriculados no ensino básico desistiram da escola, sendo que metade deles já estavam no ensino médio quando abandonaram.

Segundo o Unicef, os dados representam os índices de abandono escolar divulgados pelo próprio Inep.

Mais uma vez, os índices são mais elevados na Região Norte em todos os níveis de ensino. De acordo com o estudo, metade dos estudantes que abandonaram a sala de aula são pretos e pardos.

Estratégia de melhorias
Segundo Ítalo Dutra, chefe de Educação do Unicef, atualmente muitos estudantes enfrentam uma "cultura de fracasso" nas escolas. "O ciclo que acontece é reprovação, distorção idade-série, abandono. Então era importante a gente ter todo o painel", explicou ele.


A análise feita pelo fundo foi além dos microdados públicos divulgados pelo Inep. Um pesquisador do Unicef solicitou acesso à chamada "sala segura", para poder buscar dados na base completa do Censo -- o Inep permite esse tipo de estudo, desde que os resultados não sejam detalhados a ponto de que um estudante possa ser identificado.

Além do panorama nacional, o Unicef também levantou iniciativas bem sucedidas para atender aos milhões de alunos que estão atrasados na escola. Dutra afirma que o Unicef encontrou grande demanda das próprias redes em rever projetos e buscar soluções melhores.

Segundo ele, são três as principais recomendações feitas às redes:

Entender que a educação sozinha não resolve o problema e, por isso, é preciso pensar em articulações em rede com outros setores sociais;
Conhecer com profundidade a situação, escutando e engajando os próprios alunos que estão enfrentado problemas de reprovação;
Mudar o currículo. Nesse caso, ele explica que não se trata especificamente do conteúdo dado na sala de aula, mas expandir a relação das atividades da escola com a comunidade, além de desenhar ações exclusivas para esse grupo de estudantes, "e depois avançar para a escola toda".
Segundo ele, executar ações pensadas especificamente para esses alunos pode envolver até separá-los dos demais estudantes daquele ano, e reuni-los com alunos repetentes de outros anos também.


Apesar de alguns fatores sejam citados como prováveis causas comuns da reprovação e da evasão (como racismo e gravidez na adolescência), o especialista diz que o objetivo é "não fazer um diagnóstico prévio nem massificado" do problema, e sim identificar o que acontece em cada localidade.

Para Daniely Gomiero, diretora de Comunicação Interna e Responsabilidade Social Corporativa da Claro, e vice-presidente do Instituto Claro, além de reunir e publicar dados que mostram a realidade do problema, iniciativas como o curso online do programa são importantes para ajudar a capacitar professores para usar esses dados e a tecnologia disponível em "atividades mais assertivas".

Segundo ela, "o uso de dados é super importante para a gente refletir para o futuro", diz ela.

Fonte: G1

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