segunda-feira, março 16, 2015

Dunga diz que faltam referências na seleção brasileira: "Só temos o Neymar"

http://cidadenewsitau.blogspot.com.br/Dunga está preocupado com o protagonismo precoce de Neymar. Aos 23 anos, o atacante do Barcelona já usa a camisa 10 e a faixa de capitão da seleção brasileira. Além disso, anotou sete dos 14 gols feitos pela equipe nacional depois da Copa do Mundo de 2014. Para o treinador, esse papel de destaque não reflete apenas o desempenho individual; em vez disso, é uma reação à falta de referências do futebol nacional.

"Antes tínhamos jogadores que eram referência, e hoje deixamos de ter essas figuras. Tínhamos nomes como Careca, Ronaldo, Rivaldo, mas o futebol se equiparou muito. Isso tem incomodado um pouco. Não tem um que se sobressai muito. Só temos o Neymar", opinou Dunga nesta segunda-feira (16), no canal fechado "Sportv".

A preocupação da comissão técnica com o protagonismo exacerbado de Neymar já havia aparecido no anúncio dos convocados para os amistosos contra França (26 de março, no Stade de France, em Saint-Denis) e Chile (29 de março, no Emirates Stadium, em Londres). Jairzinho, tricampeão mundial com a seleção em 1970, foi escolhido para ser auxiliar pontual nessas partidas. Naquela ocasião, Dunga explicou optou por ele porque o atacante soube ser importante numa equipe que tinha Pelé como protagonista.

"Temos de respeitar a formação. Hoje em dia, todo mundo está preocupado com o sistema. Na maior parte do tempo, a bola fica com os zagueiros no ataque. Por isso, estamos buscando a parte técnica. Deixamos de fazer o que é a nossa qualidade, que é o drible. Essa é a maior qualidade do jogador brasileiro, e nós precisamos dar essa liberdade", opinou Dunga nesta segunda-feira (15).

"O excesso de aplicação tática na base atrapalha a criatividade. Você tem de dar leitura para o jogador e tem de fazer isso com posicionamento. Esse tipo de leitura é possível trabalhar com o menino, mas tem de deixar ele jogar e errar. Essa paciência de corrigir você tem de ter", concluiu o treinador.

A participação do treinador da seleção brasileira foi a principal atração do "Seleção", novo programa vespertino do Sportv. Sabatinado por Ricardo Rocha, Roger, Mauricio Noriega e pelo apresentador Marcelo Barreto, Dunga dominou totalmente o assunto da atração. A conversa discutiu formação da seleção, jogadores convocados e resultados do país no futebol de base, por exemplo.

Veja alguns dos principais trechos da entrevista de Dunga:

Os problemas de formação no futebol brasileiro
Essa é uma coisa que temos de explicar bem: as pessoas têm de entender que a seleção brasileira não é formadora de atletas. Os clubes são formadores. É preciso ter uma integração com os clubes. O jogador da seleção de base vem, fica 20 dias e volta. Temos de ter um convívio mais direto com a base da seleção e explicar aos jogadores que eles têm um caminho para andar. É preciso vir para a seleção, retornar ao clube e jogar. Dificilmente acontece de um jogador vir para a seleção se não atuar no clube. Conversamos com o Gilmar, com os treinadores, mas a seleção não é formadora.

Temos jogadores de muita qualidade. Não podemos colocar uma carga em cima dos meninos. É preciso fazer um trabalho.

No Brasil, é preciso dar dois passsos atrás para dar um passo à frente. Não é só na seleção, mas em todos os clubes. O sub-15, o sub-17, temos a mania de dar regalias como se fossem profissionais. Temos de colocar o jogador no seu devido lugar. Ninguém ganha nada sozinho, e se não houver um coletivo forte, não adianta. Para jogar na Europa ou na seleção, os jogadores precisam entender isso.

Metodologia de trabalho
O Barcelona tem uma metodologia. A gente tem de ter humildade, e eu fui ver o Chile. A gente não entendia como eles tinham baixinhos, mas os baixinhos cabeceavam pra caramba. Tem a ver com exercício de coordenação. Falta fundamento específico. Temos de martelar no fundamento específico. A geração de hoje é diferente, e temos de dizer o motivo de dar certo ou errado. O treinador não pode se ofender quando o jogador questiona. Nas Olimpíadas aconteceu comigo, e aí eu mostrei. Só falar não adianta.

Hoje em dia, o jogador chega na linha de fundo e não sabe cruzar porque só treina em campo reduzido. Antigamente, fazíamos muitos coletivos, e o cara tinha de ter visão. Hoje isso é considerado ultrapassado, mas o jogador precisa ter amplitude do campo.

A debandada de jogadores
Temos de ver se temos jogadores no Brasil que merecem ir para a seleção brasileira. Temos que analisar o jogador pelo que ele está fazendo, e não pelo que ele pode fazer no futuro. Às vezes usamos muito "se" no futebol, e o futebol não é feito de "se".

[A saída de jogadores] prejudica bastante. Não podemos fugir da nossa escola. Hoje todos os treinadores, independentemente da categoria, têm o nível do Guardiola ou do Mourinho. Temos de respeitar a formação. Hoje em dia, todo mundo está preocupado com o sistema. Na maior parte do tempo, a bola fica com os zagueiros no ataque. Por isso, estamos buscando a parte técnica. Deixamos de fazer o que é a nossa qualidade, que é o drible. Essa é a maior qualidade do jogador brasileiro, e nós precisamos dar essa liberdade.

A manutenção de Gallo no comando da seleção sub-20
Foi uma conversa com todos. Foi uma integração, e nós chegamos ao acordo de ter pessoas experientes nas diferentes funções. Fizemos um organograma para realizar da melhor maneira possível, com cada um fazendo uma função apenas.

O pós-Copa e o grande jogo entre Chelsea e Paris Saint-Germain
Não podemos dizer que está tudo perdido na seleção brasileira. Depois da Copa do Mundo, dos dez gols que tomamos nos dois últimos jogos, acharam que estava tudo errado. Não se pode pensar assim. Vejam o jogo entre Chelsea e Paris Saint-Germain, por exemplo: os 20 minutos finais foram bons, mas não o jogo todo. Eles ficaram grande parte no meio-campo, um respeitando o outro, sem atacar.

A Copa de 2014
O resultado é o que fica porque o Brasil é uma escola de futebol. O Brasil é uma referência, e aí o bicho pega. Temos que tirar um pouco da pressão sobre os jogadores, mas eles têm de mostrar um pouco, também. Com o tempo o jogador vai se acomodando, e na seleção isso não pode acontecer. É preciso estar sempre atento.

A instabilidade emocional dos jogadores
Acho que isso tem de ser trabalhado. O que aconteceu na Copa não pode colocar em dois jogadores; tem que ter a equipe para ajudar. A defesa tem que se manter. Temos coisas tão básicas que temos de repetir: o zagueiro tem que primeiro defender e estar sempre centralizado. Se um sair para a lateral, o outro tem que centralizar. O emocional passa por não deixar espaços.

Copa América
Hoje em dia está parelho. Os caras aprenderam. A Colômbia tinha jogadores ótimos, mas nunca foi competitiva porque nunca teve obediência tática. Quando esses jogadores foram para a Europa, isso mudou. Jogador vai para a Europa para ter respeito tático. Se não obedecem lá, ficam fora. A Colômbia melhorou muito, mas também temos Equador e Chile. Também temos jogadores de qualidade, mas teremos dificuldade, o que é natural.

Redes sociais
Hoje, com as redes sociais e com grande visibilidade, o jogador aparece mais. Às vezes, o ser humano dá um sorriso, mas não está feliz. Ele quer mostrar uma personalidade que não tem. Põe lá a camisa da seleção no cara para ver se ele não fica nervoso. Alguns não têm isso, como o Romário, mas não são todos.

Goleiros
Usamos muito o terceiro goleiro para observar, e o Taffarel vai observar os convocados. Muitas vezes, vemos uma boa defesa e não percebemos que é reflexo, mas não técnica.

O Diego [Alves] tinha trabalhado comigo nas Olimpíadas. Vem muito bem há quatro ou cinco anos. O Rafael [Cabral] nós levamos para observar. O jogador tem de estar pronto para jogar e para não jogar. É muita observação, e a gente também vê como ele se comporta na adversidade. O Rafael não foi tão bem. Ele teve oportunidade de jogar no Napoli depois da lesão, e a gente não tinha o Jefferson, que estava fora. O Diego estava bem havia quatro anos, e quando foram questionar ele disse que ia continuar trabalhando. É bom que as pessoas entendam que não adianta uma notinha de jornal A ou B. Minha função é continuar observando jogo, telefone, internet. Nenhum detalhe foge. Coisas fora do campo têm resultado dentro. Na adversidade o cara cresce ou estaciona? A gente fala muito de psicólogo, mas isso só é bom para quem tem tempo. Como não temos, temos que observar e buscar informação nos clubes para saber como é a personalidade do jogador e montar o quebra-cabeça.

A gente ouve o Taffarel. Eu busco informações com quem trabalha comigo. Agora, na hora de escalar, aí quem decide sou eu. A responsabilidade é minha. Tomar a decisão não é fácil.

A lateral direita
Estávamos trazendo vários nomes para observar. O Maicon não precisava de teste, era uma referência. Como teve a situação, não convocamos mais. Agora temos o Danilo, que tem de criar uma maior confiança na seleção. Aos poucos ele foi se sobressaindo, mas eu não posso cobrar tudo do jogador. Ele tem uma cobrança maior depois.

A lateral esquerda
Conversamos com o Mourinho sobre o Filipe Luis, mas ele disse que gosta de um lateral mais defensivo. O Filipe jogou vários jogos, mas é uma questão de adaptação.

O Marcelo não estava em grande fase no Real, mas entrou e se solidificou. Tem uma qualidade técnica excepcional, mas o jogador tem de saber guardar posição primeiro para depois subir ao ataque.

Os volantes
O nosso volante mais fixo é o Luiz Gustavo. Quando eu coloquei pela primeira vez os três volantes, me crucificaram. Agora, todo mundo quer que a gente jogue assim. Tem que ver quais são os volantes. Estamos falando de nomes que chegam ao ataque, mas o Cerezo fazia isso, o Falcão fazia isso. A tendência do futebol brasileiro é ter essa movimentação.

O centroavante fixo
Acho que falta. Temos de buscar opções. Tema bola aérea, que é importante. É importante ter um jogador que saiba se posicionar na área. Tem o Firmino na Alemanha, mas é importante ter um homem de área.

Robinho
Ele já esteve na seleção, voltou e teve uma resposta boa. Agora no Paulista ele está bem de novo. É um jogador que quando coloca a camisa não sente nada – melhora, até. Às vezes, temos jogadores que não sentem o peso da camisa e que vão bem na seleção mesmo quando não estão bem no clube. O Robinho tem drible, alegria de jogar, liderança diferente dos outros. A liderança não tem de ser um Dunga, que briga com todos, mas é preciso evoluir outro tipo de liderança. O Neymar tem esse tipo diferente, por exemplo, com mais conversa, mais brincadeira, mas entende a hora de trabalhar sério.

Fonte: G1

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