sexta-feira, julho 06, 2012

Rio Grande do Norte: calamidade na saúde gera controvérsias


Após o Governo do Estado oficializar, na última quarta-feira, a situação de calamidade na saúde pública, diversas entidades ligadas à saúde repercutiram a decisão, umas favoráveis e outras preocupadas com a medida. A governadora Rosalba Ciarlini apontou o plano de emergência apresentado como uma forma de dar agilidade às medidas necessárias à saúde com menos burocracia. Por outro lado, o conselheiro nacional de saúde, Francisco Junior, teme que o decreto seja uma forma do executivo estadual passar por cima de entidades e de processos para implementar medidas que, se corressem dentro dos procedimentos normais, sofreriam entraves.

O chamado Plano de Enfrentamento para os Serviços de Urgência e Emergência do RN foi elaborado pela Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap) e apresentado à sociedade pelo coordenador dos Serviços de Urgência e Emergência do RN (Samu), Luiz Roberto Fonseca. A série de medidas contempla ações de curto, médio e longo prazo. Entre elas, aliberação de R$ 12 milhões pelo Ministério da Saúde (MS) para reformar e equipar os quatro maiores hospitais do estado, implantação de novos leitos de retaguarda e de UTI, a criação de uma central de regulação de leitos e a reestruturação de sete hospitais regionais do estado. Os pontos mais polêmicos do plano são adoção da Parceria Público-Privada (PPP) e a construção de um novo hospital de trauma em Natal.

Para Francisco Junior o decreto de calamidade na saúde pública foi "desnecessário". A declaração do membro do Conselho Nacional de Saúde (CNS) se baseia no fato de que contatos prévios entre governo e Ministério da Saúde já tinham previsto a vinda de recursos federais para medidas emergenciais. De acordo com Francisco Júnior, as verbas que já seriam disponibilizadas ao estado teriam um impacto significativo e imediato na resolução dos principais problemas nos maiores hospitais da rede Sesap. Ele disse se preocupar com o risco do decreto ser usado pelo governo como estratégia para adotar ações que sofreriam veto do Conselho Estadual de Saúde (CES) e até de outras entidades. A fala do membro do Conselho Nacional de Saúde também questiona a necessidade de criação de um novo hospital, ainda mais fazendo uso de uma PPP e sem a realização de processos licitatórios, o que ele acredita ser ilegal.

O presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremern), Jeancarlo Cavalcante, disse que a entidade tem receios quanto a parceria com empresas privadas e à real necessidade de um novo hospital. Porém vê com bons olhos a decretação do estado de calamidade na saúde pública como forma do governo reunir esforços para solucionar a crise do setor. "Talvez a parceria público-privada não seja o melhor modelo. Quanto a uma nova unidade, seria melhor reestruturar os hospitais já existentes antes de se pensar em um novo hospital", disse o presidente do Cremern. Jeancarlo Cavalcante frisou ainda a importância de que as medidas anunciadas saiam do papel e "sejam efetivas, transparentes e à curto prazo", disse ele.

A representante da Ordem dos Advogados do Brasil no RN (OAB/RN), Elke Mendes Cunha, disse que a entidade apoia plenamente a decisão da governadora e que pela primeira vez se percebe a intenção do executivo estadual em planejar a saúde pública por meio de um plano de ação que, em sua visão, é o mais abrangente já criado. Para ela, o fato do governo voltar os olhos à saúde já é uma conquista e o OAB já vinha atentando há certo tempo junto à imprensa e sociedade sobre a necessidade da medida. Elke Mendes Cunha esclareceu ainda que os ganhos com o decreto vão além da liberação de recursos: equipes multidisciplinares para auxiliarem na gestão estadual da saúde e profissionais da área também serão enviados pelo MS. A representante da OAB disse que o plano emergencial criado "é uma luz do fim do túnel" às entidades ligadas à saúde.

Segundo Francisco Junior, do CNS, o estado de calamidade na saúde de fato é vivido no âmbito político, mas o que lhe preocupa são as implicações jurídicas e práticas na oficialização da situação. Ele ressaltaque a decisão do governo pode significar a implantação de medidas que "em vez de solucionar, possam piorar os problemas já existentes", disse o conselheiro. Quanto a um possível apoio do Conselho Estadual de Saúde, Francisco Júnior esclareceu que o CES sequer foi informado ou consultado sobre o fato do governo estar elaborando as medidas emergenciais para a saúde potiguar e, desta forma, apenas tomou conhecimento junto à sociedade em geral e não expressou seu apoio.

Em coletiva de imprensa, a governadora Rosalba Ciarlini informou que será de responsabilidade do Ministério Público Estadual (MPE) e do MP junto ao Tribunal de Contas do Estado (MpjTC) acompanhar e fiscalizar a utilização dos recursos e execução das medidas que serão adotadas a partir de então. O DN tentou contato com promotora da Saúde no MP, Kalina Filgueira para saber como será sua atuação no caso, mas não obteve retorno. Quanto no MpjTC, a assessoria do Tribunal de Contas informou que a entidade não se eximirá de sua função de fiscalizar, masa forma de atuação durante o estado de calamidade na saúde pública ainda não foi discutida pelos representantes da casa. 

Entidades divulgam nota de apoio

O Ministério Público Estadual, por meio de sua Promotoria de Saúde, juntamente com a Comissão de Direito à Saúde da seccional potiguar da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RN), a Assembléia Legislativa, os conselhos regionais de Medicina (Cremern) e Enfermagem (Coren), além do Tribunal de Contas do Estado, divulgaram ontem uma nota conjunta de apoio ao plano de enfrentamento em urgência e emergência para melhoria da saúde. Confira o posicionamento das entidades:

Nota pública

"O Governo do Rio Grande do Norte editou, na data de hoje (5), Estado de Calamidade Pública de forma atrelada a um Plano de Enfrentamento em Urgência e Emergência para fins de reestruturação dos serviços de saúde e garantia de melhorias na qualidade e segurança dos usuários do SUS. As Entidades que ao final assinam, cientes da gravidade da situação da saúde no Estado, apoiam a iniciativa do Governo do RN, ressaltando que esperam poder acompanhar a real efetivação das ações planejadas a serem implementadas com a transparência indispensável ao bom agir administrativo". 

Sinmed faz críticas ao governo

Veja a nota pública assinada pelo presidente do Sinmed, Geraldo Ferreira:

"O Sindicato dos Médicos do RN acompanha atentamente os acontecimentos. O estado de calamidade é um fato provocado por sucessivos governos, inclusive o atual, que não priorizaram a saúde. O sucateamento da máquina pública segue invariavelmente um roteiro que ao fim apresenta como solução mágica as terceirizações, privatizações e a vilanização da figura dos trabalhadores, mais intensamente a do médico.

Esperamos que a decisão do governo de decretar calamidade não venha a esfriar a investigação da terceirização do Hospital da Mulher, em Mossoró, nem as sucessivas manifestações de entidades para que o governo assuma a gestão de suas unidades, dispensando a intermediação de terceiros.

Temos a expectativa de que a medida não sirva para aprofundar mais ainda a deterioração do sistema, contestado em todo Brasil, de destruição da rede pública e favorecimento a privatizações.

Os sinais emitidos pelo governo são os mesmos de sempre, fala em ponto eletrônico, numa manobra para responsabilizar o médico por escalas incompletas, não fala em suspender o contrato com a Associação Marca, caracterizando pela calamidade a situação emergencial e, pior, sinaliza a entrega da área do estádio Juvenal Lamartine à especulação imobiliária, em troca da construção de um hospital na zona norte, em parceria público privada.

Na visão do Sinmed esse não é um caminho para resgatar o serviço público, senão para destruí-lo de vez. Não nos furtaremos a colaborar em políticas que fortaleçam o serviço público e o direito constitucional de atendimento a saúde que a população tem, mas não nos comprometeremos com medidas que afrontem a lei, mesmo frente a uma decretação de calamidade, crônica na verdade, cujos poderes e instrumentos sejam utilizados para políticas destruidoras do próprio sistema que tenta proteger". 

AÇÕES EMERGENCIAIS PREVISTAS NO PLANO

R$ 12 milhões (MS) para reforma e equipagem de quatro hospitais de referência: Walfredo Gurgel, Santa Catarina, Maria Alice Fernandes, Deoclécio Marques (Parnamirim).

Prazo máximo de conclusão do investimento: 6 meses.

R$ 13 milhões do Tesouro do Estado para reforma, restauração ou ampliação dos hospitais: Giselda Trigueiro, João Machado, Santa Catarina, Walfredo Gurgel e Maria Alice, em Natal; Rafael Fernandes e Tarcísio Maia, em Mossoró; e os Hospitais Regionais de Macaíba, Santo Antônio, São Paulo do Potengi e Caicó.

Prazo: 6 meses.

Investimento de R$ 4,7 milhões do MS para criação de uma Central de Regulação Única (CRU) para gerenciamento dos leitos da rede pública de saúde do RN, com implantação de sistema e capacitação dos profissionais.

Prazo: 90 dias.

Início do repasse de R$ 600 mil/mês - para custeio de hospitais da rede estadual, na RMN, pelo Ministério da Saúde, dos quais 300 mil são para o Walfredo Gurgel.

Prazo: 30 dias.

Implantação de 100 novos leitos de retaguarda clínica, com repasse de verbas pelo MS (60 leitos no Hospital Universitário Onofre Lopes, implantados de imediato).

Prazo: 30 dias para os primeiros 30 leitos e 60 dias para os outros 30.

Reforma e readequação da ala clínica do Hospital João Machado para viabilizar a implantação dos outros 40 leitos.

Prazo: 90 dias.

Implantação de 25 leitos de retaguarda clínica no Hospital Ruy Pereira.

Prazo: 30 dias.

Implantação de 53 novos leitos de UTI: 06 de UTI Geral no Ruy Pereira; 10 de UTI Pediátrica e 09 de UTI Coronariana no Onofre Lopes; 10 de UTI Geral no Walfredo Gurgel; 4 de UTI Pediátrica no Tarcísio Maia; 10 de UTI Neonatal no Varela Santiago.

Prazo: 90 dias.

4 leitos de UTI Geral no Santa Catarina.

Prazo: 180 dias.

OUTRAS AÇÕES

l Conclusão da implantação da 1ª fase de regionalização do SAMU 192 estadual, com extensão das bases para o Oeste, Seridó e Trairi (42% para 72% da população).

Prazo: 6 meses.

l Solicitação imediata junto ao MS para envio de força-tarefa do MS parazerar a fila de cirurgias ortopédicas eletivas.

Prazo: 60 dias.

l Chamamento público para Parceria Público-Privada destinada à construção de um novo hospital de trauma na RMN.

Prazo: 7 dias.

l Investimento de R$ 5 milhões de recursos do Tesouro para garantir o abastecimento imediato das necessidades básicas dos hospitais da rede pública estadual.

Prazo: 6 meses.

l Habilitação do helicóptero Potiguar I, de operações táticas e salvamento, junto ao MS, para ser usada como unidade aeromédica, por meio de convênio entre a PM e o SAMU.

Prazo: Imediato.

l Licitação para construção da UPA de São Gonçalo.

Prazo: 60 dias.

l Publicação das escalas de todos os médicos do estado em site da Sesap, com encaminhamento das mesmas ao Ministério Público e ao CRM, bem como adoção do ponto eletrônico nas unidades hospitalares.

Prazo: 90 dias.

l Convocar os servidores da saúde cedidos a outros órgãos, que não façam parte da rede SUS.

Prazo: 60 dias.

Fonte: DN Online/Cidade News Itaú

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