sexta-feira, agosto 28, 2020

Taxa de mortes em UTI para covid de hospitais do RN chega a 90%

O índice de mortes de pacientes com covid-19 hospitalizados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital de Campanha anexo ao Hospital Dr. Luiz Antônio, nas Quintas, foi de 90,2%. De 134 pessoas que deram entrada nos leitos até o dia 21 de agosto, 121 delas morreram. Os dados são da Plataforma Regula RN, operacionalizada pela Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap/RN), que tabula informações a respeito de internações, mortes e altas na rede hospitalar durante a pandemia do novo coronavírus no Estado. 


Taxa de mortes em UTI para covid de hospitais do RN chega a 90% - Tribuna  do Norte
Hospital de Campanha montado num prédio anexo ao Hospital Luiz Antônio, contratado pelo Estado e operacionalizado pela LIGA, registra maior índice de mortes


O Hospital Municipal de Natal Dr. Newton Azevedo (HMN) teve o segundo pior índice entre as principais unidades, com 79,3% de mortes em UTIs específicas para a covid-19 no mesmo período. Das 116 pessoas atendidas na UTI em decorrência da doença, 92 morreram. A LIGA Contra o Câncer, responsável pelos leitos montados numa área anexa ao Hospital Luiz Antônio, contesta os dados. Já o HMN afirma que há explicação para os números. O titular da Sesap/RN, Cipriano Maia, diz que ainda é cedo para uma avaliação e que diversos fatores precisam ser analisados com relação às mortes.


A taxa de mortalidade de pessoas internadas em leitos de UTI em decorrência da covid-19 está caindo, mas ainda é alta em todo o país. Atualmente, de acordo com dados do portal “UTI Brasileira”, que levanta e analisa dados referentes ao atendimento nos hospitais do país, a mortalidade nessas unidade em decorrência da doença chega a 49,1% nos hospitais públicos e 27,7% nas unidades privadas. No Rio Grande do Norte, boa parte dos hospitais públicos tem percentual de mortes abaixo da média nacional. 


Segundo dados oficiais da Sesap, além do Hospital Luiz Antônio e Hospital Municipal de Natal, somente os hospitais João Machado, em Natal, e Tarcísio Maia, em Mossoró, estão com números acima da média registrada nos hospitais públicos do país. Enquanto a unidade de Saúde da capital (que tem 20 leitos geridos pela organização social Avante Social) apresenta 57,8% de mortes das pessoas que deram entrada nas UTIs, o principal hospital público de Mossoró acumula 49,4%.


Por outro lado, entre os principais hospitais que fazem o atendimento na rede pública potiguar durante a pandemia, o Hospital Regional de Caicó (44,75%), Hospital Alfredo Mesquita, de Macaíba (38,8%) e o Giselda Trigueiro, em Natal, (35,33%) estão com números abaixo da média de mortes nas UTIs do país que atendem pacientes com covid. A avaliação sobre essa discrepância entre as mortes nesses hospitais e no Luiz Antônio e HMN, no entanto, ainda será realizada.


O Hospital Municipal de Natal não contestou os números, mas justificou a mortalidade de 79,3% das pessoas que se internaram na UTI. De acordo com a diretora médica da unidade, a infectologista Sâmia Azevedo, a taxa de mortalidade na UTI é alta porque todos pacientes com covid-19 que necessitaram de unidade já chegavam em estado muito grave com média de “escore SOFA”, que é uma média de avaliação de paciente, “o que por si só já tem um risco de óbito de 95%”. “A Covid-19 é uma doença nova. Hoje, há melhores protocolos de atendimento e a taxa de mortalidade tem caído na medida em que se tem mais conhecimento sobre a doença. Em julho, a taxa de mortalidade foi para 48% na UTI”, explicou a diretora através da assessoria de comunicação.


Contrato milionário

Contratada pelo teto de R$ 24 milhões para viabilizar operacionalização de 34 leitos destinados a pacientes com covid-19 no Rio Grande do Norte, a LIGA Contra o Câncer, que administra o Hospital Dr. Luiz Antônio, contestou os dados do Regula RN com relação à taxa de mortalidade na UTI. Segundo o diretor  da unidade, Luciano Luiz, a própria LIGA se surpreendeu com os dados apresentados pelo Regula RN com relação às mortes e disse que, ao contrário do que está disposto na plataforma oficial, o percentual de mortes na UTI Covid é de 69% no período da pandemia. A discrepância, ainda de acordo com ele, deve-se à contabilização das altas somente da enfermaria. 


“Quando um paciente vai à UTI, quando estiver bem, sai para a enfermaria. O Regula não considera isso uma alta. Só considera o último local em que você esteve. Isso que contestamos”, disse. A LIGA não explicou, contudo, o motivo pelo qual havia 13 altas da UTI se a contabilidade das saídas ocorria somente a partir da Enfermaria, assim como não apresentou até o fechamento dessa edição, os dados que considera serem verdadeiros. Apesar de ser um hospital oncológico e concentrar os atendimentos a pacientes com câncer que fossem contaminados pelo novo coronavírus, a maioria dos pacientes recebidos pela LIGA na unidade criada para a covid-19 não tinha o histórico de doença oncológica. O diretor Luciano Luiz disse que aproximadamente 30% dos pacientes seriam oncológicos, mas informou que não tinha os dados exatos. 


Avaliação precoce

De acordo com o secretário de Saúde do Estado, Cipriano Maia, está ocorrendo a apuração sobre os óbitos, mas ainda é precoce a realização de um juízo de valor sobre o que pode explicar a maior mortalidade de pessoas internadas nessas unidades. O secretário de Saúde explicou que vários fatores precisam ser analisados, como o momento em que as mortes ocorreram e também o perfil dos pacientes que foram atendidos em cada unidade. Ele também argumentou que, no início da pandemia, os protocolos médicos ainda não tinham a eficácia atual e, com isso, havia uma mortalidade maior nos primeiros hospitais que realizavam os atendimentos. 


“A gente tinha constatado isso (número alto de mortes) e está realizando algumas observações nos aspectos gerais. A vigilância de óbitos está apurando. Isso, com certeza, para se ter um juízo de valor, só será viável com pesquisa acadêmica sobre o momento da chegada dos pacientes, doenças pré-existentes... Não é um julgamento que possa ser feito somente com os números”, explicou o secretário, que também afirmou que, no momento, não há uma equipe que atue somente nesta apuração.


Atendimentos

Ainda não há um fator concreto para se justificar o percentual discrepante entre as mortes nas UTIs Covid no Rio Grande do Norte. Sem abordar casos específicos, o presidente da Sociedade Norte-Rio-Grandense de Terapia Intensiva (SONORTI), o médico intensivista Fernando Carriço, explicou que a forma de se tratar a covid-19 passou por mudanças durante a pandemia e que as práticas foram aperfeiçoadas. 


Segundo ele, o que faz a maior diferença para a saída de um paciente com vida da UTI é “o grau da qualidade da assistência”.


O médico explicou que a taxa de mortalidade dos pacientes acometidos pela covid-19 e que precisam de tratamento em UTI é altíssima quando comparada à relação entre internações e óbitos para outras enfermidades. Enquanto o normal é que menos de 15% dos pacientes morram em UTIs por outros problemas, a covid-19 tem um percentual 34,2% no país, levando em consideração hospitais públicos e privados. Um dos motivos para o percentual alto, segundo ele, foi o desconhecimento sobre a doença no início da pandemia. Contudo, o médico detalha que o tratamento realizado por equipe multidisciplinar especializada é fundamental para reduzir o percentual de mortes.


“É fato que as medicações contribuem (para evitar mortes), mas a assistência dentro da terapia intensiva é primordial. As indicações, os procedimentos dentro da terapia intensiva, o manuseio dos respiradores, o uso apropriado de antibióticos no momento certo, acesso à hemodiálise, a possibilidade de fazer precocemente as intervenções é o que pode fazer a diferença entre a vida e morte de um paciente. Uma UTI, sozinha, não muda mortalidade. O que muda é a equipe estruturada”, disse Carriço.


De acordo com o presidente da SINORTI, o Rio Grande do Norte historicamente não dá a atenção necessária à terapia intensiva. 


“Culturalmente, o Estado negligencia as regras da Anvisa, assim como a obrigatoriedade de presença de intensivistas nas unidades. O Estado é o que conta com menos especialistas da área, inclusive. O número de intensivistas no Rio Grande do Norte não chega a 30”, lamentou Carriço. “O que muda a mortalidade é o grau de qualidade da assistência. Se tiver uma equipe experiente, especializada, tratando uma população, e uma que não seja experiente, com certeza haverá mais mortes na segunda”, atestou.


Mortes

Ocorridas nas principais UTIs Covid até o dia 21 de agosto:


Hospital de Campanha Anexo ao Hospital Dr. Luiz Antônio

134 saídas hospitalares, sendo 121 óbitos e 13 altas.

Mortalidade: 90,2%


Hospital Municipal de Natal 

116 saídas hospitalares, sendo 92 óbitos e 24 altas.

Mortalidade: 79,3%


Hospital Dr. João Machado 

83 saídas hospitalares, sendo 48 óbitos e 35 altas. 

Mortalidade: 57,8%


Hospital Tarcísio Maia (Mossoró)

192 saídas hospitalares, sendo 95 óbitos e 97 altas 

Mortalidade: 49,4%


Hospital Regional do Seridó (Telecila Freitas Fontes, em Caicó)

286 saídas hospitalares, sendo 128 óbitos e 158 altas.

Mortalidade: 44,75%


Hospital Regional Alfredo Mesquita (Macaíba)

18 saídas hospitalares, sendo 7 óbitos e 11 altas. 

Mortalidade: 38,8%


Hospital Giselda Trigueiro

283 saídas hospitalares, sendo 100 óbitos e  183 altas hospitalares.

Mortalidade: 35,33%



Fonte: Regula RN / Sesap-RN / Tribuna do Norte

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