quarta-feira, dezembro 04, 2013

Servidora de Piracicaba é condenada por compartilhar crítica no Facebook

Colete a prova de balas é furtado dentro do Fórum de Piracicaba (Foto: Fernanda Zanetti/G1)Uma servidora pública de Piracicaba (SP) foi condenada a pagar R$ 10 mil como indenização por danos morais depois de ter compartilhado críticas a um veterinário da cidade
pela rede social Facebook. A decisão, inédita no país, foi tomada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e ainda é passível de recurso. Além da funcionária pública, a autora do texto, uma estudante, também é ré na ação e terá que pagar mais R$ 10 mil ao ofendido.
As críticas foram publicadas pela estudante no Facebook em fevereiro deste ano e consistem em fotos de uma cadela depois de ter passado por uma cirurgia de castração com um texto chamando o veterinário de "açougueiro" e acusando-o de ter feito um "serviço de porco" no animal. A operação havia sido realizada no Canil Municipal dias antes da publicação.
A funcionária pública, que também atua como defensora dos direitos dos animais, compartilhou a postagem e seus leitores passaram a reproduzir a informação em suas páginas pessoais. A ferramenta "compartilhar" é usada no Facebook para que uma pessoa reproduza na própria página publicações feitas por terceiros.
Em primeira instância, a dupla foi condenada a pagar indenização de R$ 100 mil ao veterinário e não teve direito à produção de provas. Elas apelaram, então, ao Tribunal de Justiça. A estudante pediu que a decisão fosse revista e a servidora pública alegou que replicou a informação, mas não foi autora das críticas.
Decisão inédita
Em entrevista ao G1 Piracicaba, o desembargador José Roberto Neves Amorim afirmou que esta é a primeira vez no país em que alguém é condenado por compartilhar uma postagem do Facebook. "As condenações eram em torno apenas de quem lançou a ofensa, nunca foi punido quem replicou a notícia", disse.

José Roberto Neves Amorim, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (Foto: Gil Ferreira/Agência CNJ)José Roberto Neves Amorim, desembargador do
TJ de São Paulo (Foto: Gil Ferreira/Agência CNJ)
Neves Amorim explicou que nesse caso, que pode tornar-se jurisprudência em situações similares, o compartilhamento aumentou o "potencial ofensivo" da publicação na rede social. "Quando se compartilha uma publicação, você aumenta o espectro da ofensa. Se 10 leram a primeira, 30 vão ler em seguida e assim por diante. Ou seja, aumenta-se o potencial ofensivo daquela publicação."
O desembargador explicou ainda que o uso da ferramenta "curtir" não se encaixa na mesma situação, pois expressa apenas o apoio ao conteúdo e não amplia a difusão. "Compartilhar é uma coisa e curtir é outra. O compartilhamento permite que mais pessoas leiam determinada ofensa", completou.
'Palco de crimes'
O advogado especializado em crimes de internet Jair Jaloreto Júnior explicou que o ambiente digital torna-se um expaço "cada vez mais usual para o cometimento de crimes" e que o compartilhamento em redes sociais deve render condenações em outras situações.
"As pessoas precisam entender que a internet é um outdoor, que ficará ali para ser lido para sempre, e não um 'petit comité' (pequeno grupo). Compartilhar uma ofensa pessoal voltada a uma pessoa é divulgar a mensagem difamatória", disse Jaloreto.
O advogado, no entanto, explicou que nem todos os compartilhamentos e nem todos aqueles que compartilharem uma possível ofensa serão condenados. "Se eu compartilhar um artigo de um órgão de imprensa em que há danos morais não serei o culpado, pois aquela é uma notícia divulgada por um veículo de comunicação. Só há o dano quando a pessoa tem a intenção de ofender diretamente", disse.
Recursos
A decisão do desembargador foi tomada no dia 26 de novembro, mas ainda não foi publicada no Diário de Justiça Estadual. Só depois da divulgação no veículo de comunicação oficial é que as defesas terão direito a apresentarem recursos. O advogado da estudante autora da publicação, Robinson Lafayete Carcanholo, afirmou que pretende recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) pedindo a produção de provas.
"Queremos o direito de apresentar provas testemunhais e periciais que apontam o erro médico no caso. Minha cliente não era dona da cachorra e ouviu de outra veterinária que o procedimento foi malfeito", disse Carcanholo.
A advogada da servidora pública, Tatiane Mendes Ferreira, disse que ainda não avaliou que estratégia e postura ela e a cliente vão tomar sobre a condenação em segunda instância. O fato de a condenação ser inédita, segundo a advogada, torna a situação ainda "mais difícil de lidar".
'Pétalas na ventania'
O advogado Mauro Merci, defensor do médico veterinário, disse que o cliente decidiu mover a ação por danos morais por ter sido acusado de negligência via internet sem ter o direito de se defender.
"O fato de uma pessoa curtir ou compartilhar conteúdo na rede social propicia que muitos outros tenham acesso à informação, que no caso se mostrou inverídica. É quando cria-se o que podemos chamar de 'tribunal de exceção', onde não há margem para defesa", disse.
O advogado citou que, por estratégia da defesa, apenas a servidora pública e a estudante foram processadas por terem sido as "responsáveis por iniciar a disseminação do conteúdo vexatório". O Facebook não foi incluído como polo passivo no processo.
"A mentira compartilhada se torna uma verdade, e o dano fica irreparável. É como se o vento espalhasse pétalas de rosa colocadas em uma peneira: fica impossível recolher uma a uma depois da ventania", afirmou Merci.
Apesar de a publicação sobre a cirugia da cadela ter gerado debate na rede social, a inclusão dos outros internautas que compartilharam ou comentaram o texto como réus na ação dificultaria o trâmite processual, de acordo com Merci. "Seria impraticável citar todos. Além disso, o dano teve início a partir do primeiro compartilhamento e suas consequências."

Reprodução Cidade News Itaú

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