terça-feira, fevereiro 02, 2021

Prefeitura apura 'falhas e omissões' de órgãos no caso de criança torturada em Campinas; menino era atendido desde setembro de 2019

A Prefeitura de Campinas (SP) informou que vai abrir, nesta terça-feira (2), uma investigação para apurar "eventuais falhas e omissões" dos serviços públicos municipais, além de entidades conveniadas, no caso de um menino de 11 anos mantido com as mãos e os pés acorrentados dentro de um barril de ferro em Campinas (SP). O pai da criança, a namorada dele e a filha dela estão presos e vão responder por tortura.


A criança foi resgatada no último sábado (30), após denúncias de vizinhos. Na segunda-feira (1º), o prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), fez uma reunião e exigiu um relatório para entender até que ponto órgãos ligados à prefeitura, como o Centro de Atenção Psicossocial (Caps), Centro de Referência da Assistência Social (Cras), além do Conselho Tutelar, sabiam da situação. O documento apontou que o menino foi atendido "várias vezes" na rede desde setembro de 2019.


Depois da chegada do relatório nesta terça-feira, o chefe do Executivo decidiu abrir a investigação. De acordo com a administração municipal, além de apurar supostos problemas na condução do caso do garoto, a intenção também é "propor melhorias e adequações no fluxo de atendimentos a situações como esta".


A investigação será conduzida pela Secretaria de Justiça e terá prazo de 60 dias para conclusão, prorrogáveis por mais 30. A apuração correrá em sigilo para respeitar o Estatuto da Criança e do Adolescente.


Prefeito de Campinas abriu investigação para apurar caso de menino torturado — Foto: Fernanda Sunega/PMC


Reunião em Brasília

O caso também foi pauta do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Uma reunião definiu que será garantido acompanhamento psicológico ao menino vítima dos maus-tratos e análise minuciosa sobre seu futuro, que pode envolver o acolhimento por parentes, uma instituição ou família acolhedora.


"Dessa reunião saíram alguns encaminhamentos com relação à criança: a) Garantia de acompanhamento psicológico; b) Garantia de análise minuciosa do caso para decisão acerca do encaminhamento aos cuidados da família extensa, do acolhimento institucional ou do acolhimento familiar (família acolhedora)", diz o comunicado.


Conselho Tutelar

O Conselho Tutelar Sul de Campinas (SP) negou, em nota divulgada na noite de segunda, que tinha conhecimento da tortura vivida por uma criança de 11 anos. Segundo o órgão, a família era acompanhada há pelo menos um ano e monitorada quanto a situação de vulnerabilidade social.


O Conselho Tutelar informa, inclusive, que as últimas informações sobre o caso, obtidas em dezembro de 2020 e janeiro de 2021, mostram que a "situação da criança e da família vinha evoluindo bem e positivamente."


Os vizinhos que chamaram a polícia informaram que os maus-tratos à criança já ocorriam havia anos, e apesar das denúncias ao Conselho Tutelar, o sofrimento do menino não parou.


Prisão preventiva e investigação

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou na segunda que as prisões em flagrante dos três suspeitos por tortura de uma criança foram convertidas em preventiva. O pai do menino, a namorada dele e a filha dela foram presos no sábado (30) - o garoto está internado sob a tutela de uma tia.


O caso também é acompanhado pelo Ministério Público (MP), que informou a abertura de uma investigação sobre o caso pela promotora da Infância e Juventude de Campinas Andrea Santos Souza, que ainda não vai falar sobre o caso.


A ocorrência foi registrada na 2ª Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), no Jardim Londres. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou que o inquérito policial segue em andamento e "tramita sob sigilo".


Ainda segundo o Ministério Público, o promotor criminal que vai ficar à frente da investigação só será definido depois que o caso for relatado pela Polícia Civil. A Promotoria vai apurar também o comportamento da família e se foram solicitadas anteriormente medidas de proteção à criança. Situações semelhantes podem ser denunciadas pelo e-mail pjinfcampinas@mpsp.mp.br.


Criança foi resgatada após sofrer tortura em Campinas, diz PM — Foto: Polícia Militar


Desnutrição

Policiais que encontraram a vítima informaram que ela era alimentada com cascas de fruta. O menino estava nu, dentro de um tambor de metal fechado com uma telha e uma pia de mármore para evitar que ele saísse. O vídeo do momento em que ele é encontrado mostra que a criança mal conseguia se mexer quando foi encontrada. Ele tinha a cintura, pés e mãos acorrentados.


O menino estava há quase cinco dias sem comer, segundo a polícia. "Colocavam pra ele casca de banana, fubá cru", relata o cabo Rodrigo Carlos da Silva.


A Polícia Civil acredita que ele estava acorrentado dentro do barril há um mês. “Desde o começo de janeiro já estava sendo preso no tambor. Ele teria que ficar em pé nessa amarração, que era feita com os braços presos em cima do tambor", relatou o delegado Daniel Vida da Silva.


Criança era mantida amarrada em barril pelo pai em Campinas — Foto: Reprodução/Rede Globo


Sofrimento e castigo

Segundo a PM, o menino era mantido em pé no espaço onde também fazia necessidades fisiológicas. A corporação diz que foi acionada após moradores da região perceberam que o garoto havia deixado de ir para a escola e de brincar com outras crianças do bairro.


Os policiais contam que entraram na casa após autorização de uma jovem de 22 anos, que é filha da namorada do pai do menino.


Segundo a Polícia Civil, o pai disse em depoimento que o filho é muito agitado, agressivo e fugia de casa. Ele alegou que fez isso para educar o menino.


Os policiais usaram um corta-fios para remover as correntes e o menino foi socorrido por uma equipe do Samu e levado ao Hospital Ouro Verde, sendo transferido na terça (2) ao Hospital Mário Gatti, para seguir o tratamento contra a desnutrição. O quadro de saúde é estável.



Pai pode responder por tortura

A Polícia Civil considerou que o homem aplicou violência e grave ameaça que provocaram intenso sofrimento físico e mental; enquanto que a namorada dele, uma faxineira de 39 anos, e a filha dela, que atua como vendedora, se omitiram e nada fizeram para evitar os resultados.


O delegado de plantão determinou a prisão do pai da criança e, caso ele seja denunciado e condenado, pode receber pena mínima de prisão pelo crime que varia de 2 a 8 anos. Já a namorada e a filha dela, se responsabilizadas apenas pela omissão, podem receber pena de 1 a 4 anos de detenção. A polícia arbitrou fiança de R$ 5 mil para cada uma delas, mas não há informações sobre os pagamentos.


O G1 não conseguiu contato com as defesas dos indiciados até esta publicação.


Fonte: G1

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