terça-feira, novembro 07, 2023

Desembargador determina que ex-assessor de Bolsonaro seja investigado por racismo

Assessor especial de Bolsonaro, Filipe Martins (ao fundo), faz gesto com a mão durante sessão do Senado — Foto: Reprodução/TV Senado

O desembargador Ney Bello reformou a sentença que havia absolvido sumariamente do crime de racismo Filipe Martins, assessor Especial para Assuntos Internacionais do governo Jair Bolsonaro (PL). Numa sessão no Senado, em 2021, Filipe fez um gesto típico de supremacistas brancos.


O juiz 11ª Vara Criminal do Distrito Federal encerrou o processo por entender que o fato narrado na denúncia do Ministério Público não constituía crime. Em sua decisão, Ney Bello afirma exatamente o contrário: "O que temos são indícios. Fortes indícios, diria eu. Por serem fortes indícios, não é cabível a manutenção da absolvição sumária do apelado", afirmou. Agora, o processo prosseguirá na primeira instância.



O gesto foi feito numa sessão remota do Senado, no dia 24 de março de 2021. Filipe acompanhava o então Ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, a fim de discutir temas relativos à pandemia de Covid-19. O gesto, apropriado por grupos racistas, é feito com união dos dedos polegar e indicador, mantidos abertos e esticados os dedos médio, anular e mínimo, de forma a caracterizar a formação das letras “WP”, como sigla para o lema racista White Power (“Poder Branco”). Na ocasião, o Senador Randolfe Rodrigues identificou o gesto e alertou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. A Polícia do Senado Federal abriu inquérito.


Em sua defesa, Filipe alegou que estava ajeitando a lapela de seu paletó. A perícia do Senado desmentiu a versão.


Até para um leigo é difícil acreditar na versão da defesa. Basta olhar as imagens. Uma vez desmontada a alegação apresentada pelo acusado, Ney Bello demonstrou em seu voto como o gesto foi apropriado por extremistas e supremacistas brancos. E passou a ser usado como apito de cachorro, ou seja, uma mensagem codificada, "cujo conteúdo só seria conhecido por quem compartilha desse universo simbólico de representação supremacista e racista ".


Mas a Filipe caberia o benefício da dúvida. Poderia ele ignorar a simbologia do gesto? O voto aborda a questão. "Em primeiro lugar, o apelado é professor e foi assessor do ex-Presidente da República. Portanto, trata-se de pessoa que entende de política e é conhecedor das suas simbologias específicas, incluindo aquelas que enaltecem torturadores, fascistas e racistas. E utiliza essa simbologia de forma reiterada".


Em seu voto, o magistrado passa a relatar os casos em que Filipe fez uso destas simbologias: "Quando o então Deputado Federal Jair Bolsonaro se elegeu presidente da República no segundo turno das eleições de 2018, o apelado postou no Twitter: “Está decretada a nova Cruzada. Deus vult!”. A expressão "Deus vult" representa o grito dado pelo Papa Urbano II quando do anúncio da Primeira das Cruzadas, em 1095. Ou seja, o apelado comparou a eleição de um político brasileiro a um movimento de libertação de Jerusalém de supostos “infiéis”.



O voto ainda cita outros dois exemplos de uso de expressões da extrema direita: Filipe usou um lema da ditadura de Francisco Franco, na Espanha, ao felicitar Carlos Bolsonaro pelo seu aniversário: "¡ya hemos pasao!" (“já passamos!”), frase que era um emblema contra opositores que argumentavam que ditadores e autoritários como Franco “não passarão”.


Em agosto de 2020, Filipe postou a frase em latim "Oderint dum metuant", que significa “Que odeiem, desde que temam”. Essa frase é do poeta romano Lúcio Ácio, mas foi apropriada na década de 1990 pelo grupo neonazista alemão Combat 18.


Diante de tantos indícios, o desembargador determinou que os indícios sejam investigados, "sob pena de o Judiciário ser leniente em sua atuação com a prática de condutas racistas".


Fonte: Blog do Octavio Guedes

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