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quinta-feira, agosto 01, 2019

Governo contesta dados de desmatamento, mas diz que não iria alardear se julgasse corretos

O governo federal contestou nesta quinta-feira (1º), em uma entrevista coletiva em Brasília, os dados sobre desmatamento apontados por imagens de satélite usadas no monitoramento ambiental pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia.

Segundo dados do sistema que capta essas imagens de monitoramento ambiental, o Deter, houve, até o dia 26 de julho, crescimento de 212% nas áreas desmatadas da Amazônia em relação ao mesmo mês do ano passado.

Ainda de acordo com o sistema gerenciado pelo Inpe, a devastação de florestas neste período corresponde a 1.864 quilômetros quadrados, área maior do que o município de São Paulo.

O desmatamento, conforme dados do Deter, já tinha crescido 88% no mês de junho, na comparação com o mesmo mês de 2018.

Bolsonaro participou de entrevista coletiva com ministros na qual governo contestou dados de desmatamento do Inpe — Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Bolsonaro participou de entrevista coletiva com ministros na qual governo contestou dados de desmatamento do Inpe — Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Na entrevista desta quinta-feira – que também contou com a presença do presidente Jair Bolsonaro –, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, afirmou que mesmo que o governo considerasse os dados corretos, seria "conveniente" tratar as informações "internamente" para não alardear.

"O que preocupa mais aqueles que têm sentimento de brasilidade, que têm um amor pelo país, como todos deveriam ter, é que esses dados prejudicam muito a imagem do Brasil. Se fossem dados corretos, era preocupante e seria conveniente que nós não alardeássemos isso e que nós cuidássemos do problema internamente, procurássemos corrigir o que está errado", declarou Heleno durante a entrevista coletiva.
"Sendo dados falsos, é muito grave, porque isso prejudica o comércio brasileiro, prejudica a imagem do Brasil, nos coloca como grande destruir do meio ambiente na humanidade. São imagens que depois ficam muito difícil de resgatar. Isso é o que nos aflige, é a falta de honestidade intelectual", complementou o ministro do GSI.

Antes de Heleno dar a declaração, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, havia feito uma apresentação na qual afirmou que parte do desmatamento divulgado em junho deste ano ocorreu em meses anteriores, inclusive, em 2018.

Ele voltou a questionar a utilização dos dados do Deter para comparar áreas desmatadas mês a mês, alegando que o sistema é um alerta de desmatamento com uma imprecisão temporal.


"Salto de 88% [de desmatamento em junho de 2019] não é verdade", reclamou o ministro do Meio Ambiente.

Ao se manifestar em meio à entrevista, Bolsonaro declarou que notícias sobre aumento de desmatamento – que ele disse não condizer "com a verdade" – prejudicam a imagem do Brasil no exterior. Ele afirmou que há "gente" dentro do Inpe interessada em denegrir a imagem do país.

"Não quero afirmar, mas uma notícia como essa [crescimento do desmatamento na Amazônia], que não condiz com a verdade, tem um estrago muito grande na imagem do Brasil. Parece que tem gente interessada nisso, que não é a imprensa, porque o dado saiu lá de dentro [do Inpe], dos órgãos nossos", acusou Bolsonaro.

Ele, inclusive, defendeu uma apuração para identificar se os responsáveis pela divulgação dos dados sobre desmatamento do Inpe, contestados pelo governo, tornaram as informações públicas com objetivo de "desgastar a imagem do Brasil".

"Acho até que, aprofundando os estudos, ver se as pessoas divulgaram de má-fé esses informes para prejudicar o governo atual e desgastar a imagem do Brasil", complementou o presidente da República.

Novo sistema de monitoramento
Após contestar nesta quinta-feira, com o auxílio de um Power Point, os dados sobre desmatamento divulgados nos últimos dois meses, Ricardo Salles disse que os questionamentos de integrantes do governo às informações do Deter não fragilizam a imagem do Inpe.

O ministro anunciou que o governo abrirá uma licitação, junto ao Ibama, para contratar um novo sistema de monitoramento ambiental que ofereça imagens de alta resolução para detalhar áreas desmatadas.

"Queremos manter o sistema do Deter, ajudando a equipe, ajudando o Inpe para que tenha melhores serviços. Uma forma de ajudarmos é complementar as informações do sistema do Deter também com outras imagens de alta resolução que fornecessem o detalhamento dos polígonos de um dia para o outro", observou Salles.

Questionado por repórteres sobre qual seria então o percentual de desmatamento registrado em junho – na medida em que o governo contesta os números do Deter – Ricardo Salles disse que não há preocupação para "criar número". Ele ressaltou ainda que, sempre que necessário, o governo fará "rechecagem" nos dados.

"A nossa preocupação não é trabalhar para criar número, seja número qual for. É dizer que o número, da forma como foi apresentado, e a análise que foi feita, não estava correta."
O ministro do Meio Ambiente informou que não haverá mudança na periodicidade da divulgação dos dados do desmatamento. "É preciso analisar as informações com responsabilidade, e não manipular datas, recortes, para criar um percentual sensacionalista", criticou o titular do Meio Ambiente.

Ao final da entrevista coletiva, questionado por jornalistas sobre se, de fato, o desmatamento está aumentando durante o governo dele, Bolsonaro admitiu que há crescimento da devastação ambiental.

"Na minha opinião, parece que está aumentando, mas não desta forma como foi divulgado", respondeu o presidente.
"A fama do Brasil e a minha são péssimas lá fora tendo em vista os rótulos que foram colocados em mim e esses rótulos tem que ser, aos poucos, combatidos na forma da verdade", acrescentou.

Dados do Deter
Embora tenha colocado sob suspeita os dados gerados pelo Deter para monitoramento da devastação ambiental na Amazônia, o ministro do Meio Ambiente assegurou na entrevista que o governo manterá o uso das informações do sistema para "orientar" o trabalho de fiscalização de órgãos de preservação ambiental, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

As novas contestações do governo em relação às estatísticas de desmatamento ocorreram quase duas semanas após o início das críticas de Jair Bolsonaro aos dados do Inpe.

Na última quarta (31), o presidente já havia afirmado, em uma agenda em Goiás, que "dados imprecisos atrapalham nossos negócios fora do Brasil", referindo-se a estatísticas de desmatamento divulgadas pelo Inpe.


A polêmica envolvendo o instituto se iniciou em 19 de julho, quando o presidente da República questionou a precisão dos dados sobre desmatamento ao ser questionado sobre o assunto por jornalistas de veículos estrangeiros.

Na ocasião, Bolsonaro levantou suspeita de que o diretor do Inpe Ricardo Magnus Osório Galvão estaria "a serviço de alguma ONG". No dia seguinte, o dirigente negou as acusações do presidente e reafirmou a veracidade dos dados sobre desmatamento divulgados pelo Inpe.

Ele também já tinha reclamado que a a divulgação de informações ambientais diretamente pelo Inpe "dificulta" negociações comerciais conduzidas pelo governo brasileiro com outros países e citou o acordo fechado recentemente entre o Mercosul e a União Europeia.

Críticas ao Inpe
Jair Bolsonaro não é o primeiro presidente a levantar suspeitas em relação aos dados do Inpe sobre desmatamento na Amazônia. Em 2008, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva também declarou que tinha dúvidas sobre o aumento do desmatamento na Amazônia.

À época, o petista chegou a comparar as informações sobre devastação ambiental do instituto a um câncer. Segundo ele, os dados do Inpe são tratados "como um câncer", quando, na verdade, "seriam um nódulo, que pode ou não ser um tumor maligno".

Em uma das ocasiões em que criticou o Inpe, Lula defendeu o agronegócio, afirmou que "ninguém pode culpar a soja, o feijão, o gado, ou os trabalhadores rurais sem terra" pelo desmatamento investigar previamente o que aconteceu.

Na mesma ocasião, em uma crítica às Organizações Não Governamentais (ONGs) que acusavam o governo dele de irresponsabilidade, o então presidente afirmou que, antes de criticar o Brasil, essas entidades deveriam plantar árvores nos países delas. Lula, entretanto, defendeu que quem desmata ilegalmente deveria perder suas terras.

Fonte: G1

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