A Justiça decretou na segunda-feira (21) a prisão temporária da diretora da escola infantil particular da Zona Leste de São Paulo investigada por suspeita de maus-tratos, periclitação de vida, que é colocar a saúde das crianças em risco, submissão delas a vexame ou constrangimento e tortura. O caso foi revelado pelo g1.
De acordo com policiais, o mandado de prisão foi entregue pela Justiça na terça (22), quando agentes foram até a casa da diretora para tentar cumpri-lo, mas ela não estava.
A Polícia Civil e o Ministério Público (MP) pediram a prisão da diretora Roberta Regina Rossi Serme, de 40 anos, que também é uma das sócias proprietárias da Escola de Educação Infantil Colmeia Mágica, na Vila Formosa. A escolinha fundada em 2002 atende crianças 0 a 5 anos, do berçário ao ensino infantil. O g1 não conseguiu falar com a defesa dela sobre o assunto.
André Dias, advogado da diretora, chegou a negar à imprensa que sua cliente tenha amarrado ou mandado amarrar os bebês. Alegou ainda que alguém de dentro da escola, possivelmente alguma funcionária descontente, forjou a cena para prejudicar a direção.
Procurado nesta quarta para comentar o assunto, o Ministério Público (MP) informou por meio de nota que "as investigações prosseguem" e que não poderia dar mais detalhes porque "o caso corre em segredo de Justiça".
De acordo com a Central Especializada de Repressão a Crimes e Ocorrências Diversas (Cerco) da 8ª Delegacia Seccional, vídeos que circulam nas redes sociais mostram crianças amarradas e chorando num banheiro da escolinha. As imagens chegaram à investigação há três semanas, quando foi aberto inquérito para apurar a denúncia e tentar identificar eventuais responsáveis pelos crimes.
Ainda segundo a investigação, mães de alunos contaram à polícia que a diretora da Colmeia Mágica amarrava ou mandava funcionários da escolinha amarrarem os bebês que aparecem nos vídeos com os braços imobilizados, enrolados com panos, presos em cadeirinhas de bebê embaixo de uma pia e próximas a uma privada. As filmagens teriam sido feitas por alguém que trabalhou no local.
Menino ferido e outro doente
Além das filmagens, mães contaram aos policiais que seus filhos chegavam em casa com ferimentos pelo corpo. Um deles chegou a ser internado por dois dias com falta de ar em 2021. As fotos das lesões e internação da criança foram encaminhadas à polícia. O g1 também conversou com algumas dessas mulheres.
“Na época eu até mandei mensagem para a diretora perguntando sobre o que tinha acontecido com ele, mas ela não me respondeu. No dia seguinte ela disse que não se recordava de nada, mas que ele podia ter batido em algum brinquedo, até porque, eles vão para a escola e estão sujeitos a se machucar”, disse a autônoma Laura Stramaro, de 34 anos, mãe de um menino de 2 anos.
Em maio de 2021, o filho dela chegou em casa com um hematoma perto da sobrancelha.
"Em novembro do ano passado a diretora e proprietária me ligou dizendo que meu filho estava com dificuldades para respirar. Depois ficou dois dias internado em um hospital para a saturação de oxigênio regularizar", falou nesta terça-feira (15) a advogada Vitória Costa, 23, mãe de um bebê de 11 meses.
Diretora nega maus-tratos
O g1 não conseguiu localizar a proprietária da escolinha para comentar o assunto até a última atualização desta reportagem. Mas apurou com fontes que apuram o caso que Roberta disse à polícia que desconhece os vídeos que mostram as crianças amarradas no banheiro, que fica ao lado de sua sala.
Em seu depoimento, a diretora reconheceu que as imagens das crianças, sentadas em cadeirinhas de bebês, no chão, embaixo de uma pia e próximas à privada foram gravadas no banheiro da Colmeia Mágica. Mas afirmou não saber quem fez a filmagem e nem quem as amarrou. Ela negou ainda que tivesse imobilizado os bebês ou mandado algum funcionário fazer isso.
André Dias, advogado que defende as donas da Colmeia Mágica, confirmou nesta terça-feira (15) ao Jornal Nacional que as crianças que aparecem nas imagens frequentam a instituição, mas negou os maus tratos.
"Considerando que a Justiça determinou o sigilo das investigações, algumas informações ainda não podem ser divulgadas. Por exemplo, a pessoa que efetivamente gravou esses vídeos, montou aquela cena pra fazer a gravação dos vídeos, e também ainda não podemos divulgar o apoio externo que essa pessoa recebeu pra fazer a confecção desses vídeos."
"A escola reconhece os alunos, o ambiente, aparentemente é dentro da escola", falou André. "Porém as circunstâncias com que os vídeos foram gravados não condizem com a realidade da escola. Foi feito sem nenhum conhecimento por parte das diretoras, das demais professoras."
Ainda de acordo com a defesa das irmãs Serme, as imagens das crianças amarradas foram forjadas por outras pessoas que querem prejudicar as donas da escolinha.
Professora teria filmado
Mães de crianças, que tinham seus filhos matriculados na Colmeia Mágica, disseram ao g1 que Roberta convocou uma reunião de emergência com os pais na última sexta-feira (18), quando voltou a negar que tivesse cometido maus-tratos contra as crianças.
"A diretora disse que uma ex-funcionária descontente estava fotografando crianças em situação fora do contexto para prejudicar a escola", falou a advogada Vitória Costa, de 23 anos, mãe de um menino de 11 meses. "Na reunião nenhum dos pais tinha visto o vídeo dos maus-tratos ainda. Saímos de lá então acreditando na versão dela".
Essa ex-funcionária é uma professora, segundo os pais. Professoras ouvidas pela reportagem disseram que a própria diretora amarrava as crianças para elas ficarem quietas. Em outras oportunidades, segundo elas, Roberta obrigava as educadoras e outras funcionárias a fazerem isso.
A declaração de Roberta aos pais foi dada um dia depois de a polícia ter ido a Colmeia Mágica cumprir um mandado judicial de busca e apreensão. Foram recolhidos sete lençóis que teriam sido usados para amarrar os bebês que aparecem nos vídeos. Três celulares, incluídos o da diretora, acabaram apreendidos. Todos os objetos serão periciados.
A professora que teria tirado fotos e feito vídeos com as crianças amarradas já foi ouvida pela polícia. A reportagem não conseguiu apurar, porém, o que ela disse. A investigação ouviu a direção, professores e funcionários e está pegando depoimentos de pais para saber se alguém pode ser responsabilizado pelos maus-tratos contra os bebês.
Outros casos
Mães acusam a diretora da Colmeia Mágica de cometer e estimular os maus-tratos contra as crianças da escolinha. A escolinha ou a diretora já foram envolvidas em ao menos outros três casos que acabaram na delegacia.
Em 2010, uma menina de pouco mais de 3 meses de vida morreu após ter sofrido parada cardíaca no berçário. A morte dela foi confirmada pelo hospital para onde a criança foi levada. A polícia investigou o caso como "morte suspeita". Segundo a mãe da bebê, o inquérito foi arquivado.
Em 2014 uma mãe acusou a diretora de agredir seu filho de 2 anos, que ficava na escolinha. As duas mulheres acabaram brigando, segundo a polícia. E em 2017 teve um caso no qual uma adolescente de 14 anos acusava a diretora de ameaçá-la e xingá-la.
O g1 procurou a Secretaria da Segurança Pública (SSP) para atualizar os casos, mas a pasta não havia retornado os contatos.
Protestos
Os portões da Colmeia Mágica chegaram a ser pichados com mensagens de protesto por causa dos vídeos com as crianças.
Durante a semana, a direção chegou a cobrir as pichações com tinta escura. Nesta terça-feira (15), no entanto, os pais voltaram a se manifestar em frente ao local levando cartazes para pedir "justiça". A escola suspendeu as aulas nesta semana.
Fonte: g1
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