Com a vacinação lenta na Austrália, o segundo Estado mais populoso do país, Victoria, entrou em lockdown enquanto o governo busca controlar um surto da cepa B.1.617.1, conhecida como variante indiana e batizada de variante Kappa pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
O quarto confinamento imposto aos moradores de Melbourne, capital do Estado, vem depois de um cenário em que a vida havia voltado a ser "quase normal", segundo a descrição dos arquitetos paulistas Fabio Borges, de 39 anos, e Juliana Moraes, 38 anos, que vivem na cidade.
"O que aconteceu é que estávamos sem casos havia vários meses, e aí era quase vida normal. Só precisava usar máscara em transporte público e fazer o check-in com QR code (no celular) em restaurante e café", conta Borges, que vive lá há quase três anos.
Agora, no entanto, o governo já registrou um total de 60 novos casos na região, segundo os dados mais recentes, e alertou que a variante está se espalhando de forma mais rápida.
Borges destaca a diferença da gestão da pandemia na Austrália em relação ao Brasil. Ele aponta que chama atenção a implantação de um lockdown em um cenário com um total de novos casos que é pequeno se comparado à situação do Brasil, que oficialmente registra atualmente uma média móvel de mais de 60 mil casos diários de covid-19. (Entenda aqui como a testagem insuficiente e desorganizada deixa Brasil no escuro para controlar a pandemia.)
"Como estava zerado (o número de casos), o governo fica em cima para não perder o controle. Aparece um caso e eles fazem algo para não alastrar", diz ele, que apoia a medida restritiva para controlar a transmissão.
O governo decretou confinamento em todo o Estado em 27 de maio, depois de ter registrado seus primeiros casos em quase três meses. Agora, uma semana depois, estendeu o período do confinamento em Melbourne, com pequenas mudanças, até 10 de junho.
"Eu sei que esta não é a notícia que todos querem ouvir, mas considerando os casos que temos... o governo não teve escolha", disse o primeiro-ministro interino, James Merlino.
"Se não fizermos isso (lockdown), essa coisa vai escapar. Essa variante de preocupação se tornará incontrolável e as pessoas vão morrer."
Agora, os habitantes de Melbourne estão obrigados a ficar em casa, exceto para saídas com propósito de trabalho essencial, compras, exercícios, assistência médica ou para tomar vacina contra a covid-19.
Fora da capital do Estado, as restrições serão relaxadas, com reuniões limitadas ao ar livre e a reabertura de restaurantes.
No entanto, Merlino alertou as pessoas para permanecerem cautelosas e disse que o governo rastreou mais de 350 lugares onde as pessoas podem ter sido expostas ao vírus.
Borges e Moraes, por exemplo, receberam por mensagem de texto do governo um alerta para checarem a lista de locais e horários em que pessoas infectadas passaram pela região em que eles moram para verificar se podem ter se encontrado.
O surto atual começou, segundo as autoridades, com um viajante que testou positivo dias após terminar a quarentena no sul da Austrália.
"Ninguém, ninguém quer repetir o inverno passado", disse Merlino, referindo-se à segunda onda de Melbourne no ano passado, que causou mais de 90% das mortes em todo o país.
O Estado promoveu um confinamento de quase três meses para levar a taxa de casos de volta a zero.
Vacinação lenta
O novo surto em Victoria chama atenção para o baixo nível de vacinação entre os australianos - tarefa que é de responsabilidade do governo federal.
Cerca de 15% da população da Austrália recebeu pelo menos uma dose da vacina, o que deixa o país fora do grupo dos 100 que mais vacinaram, segundo o ranking do Our World in Data. A Austrália aparece na posição 106 de 215 países, segundo dados de 1°/6.
A taxa de pessoas completamente vacinadas na Austrália é de 2%.
Borges e Moraes dizem que, se por um lado entendem e apoiam a necessidade do confinamento, lamentam o ritmo de vacinação.
"Tem que fazer esse abre e fecha até todo mundo ser vacinado. Acho que é essa a intenção. Mas é difícil entender por que não aceleram a vacina", diz Borges.
Moraes completa: "A sensação é assim: tem a vacina, a gente não precisava estar passando por isso agora."
O casal relata uma sensação de que o controle da pandemia no país parece ter levado alguns australianos a ansiarem menos pela vacinação em comparação a outros países.
"É outra realidade aqui. No Brasil, todo mundo conhece alguém que morreu. Aqui, não. A pessoa não tem familiar ou amigo que faleceu ou caso próximo. Ela fica tranquila, vê zero casos e escuta falar em reação da vacina", diz Borges.
Escassez de suprimentos e problemas de entrega vêm sendo apontados como responsáveis pelos atrasos. E embora medidas tenham sido tomadas para acelerar o programa - como implantação de centros de imunização em massa e investimento na produção local -, o governo australiano está vendo seu sucesso no combate à covid-19 afetado por seu lento esforço de vacinação.
O desempenho da vacinação na Austrália contrasta, pelo menos até agora, com a gestão da pandemia em outros aspectos no país. A Austrália evitou, em grande parte, o nível de mortes por covid visto em outros países desenvolvidos devido a um sistema rigoroso de bloqueio rápido, controles de fronteira e restrições de circulação.
Fonte: BBC
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