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quinta-feira, outubro 08, 2020

Casos de AVC crescem 55% no Rio Grande do Norte

O número de pessoas diagnosticadas com Acidente Vascular Cerebral atendidas no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, a maior unidade de urgência e emergência do Estado, aumentou 54,86% de janeiro a setembro deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. Das 1.183 vítimas de AVC que receberam atendimento entre os meses de janeiro e setembro de 2019, o número saltou para 1.832 no mesmo intervalo de tempo deste ano. Em número absolutos são 649 vítimas a mais do AVC, o que causa preocupação na classe médica e expõe, ainda mais, a frágil rede de atendimento às vítimas dessa doença.


Créditos: Magnus Nascimento

Marineide é uma das vítimas do AVC no Rio Grande do Norte. Ela recebeu atendimento no Hospital Mons. Walfredo Gurgel, em Natal


“Hoje completa oito dias que estou aqui. Já foram feitos vários...”. A fala incompleta e seguida de choro é de Marineide Rosa da Silva, 49 anos, uma dona de casa que mora em Parnamirim e que está internada no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel (HMWG), em Natal. Ela não conseguiu concluir o raciocínio porque teve um AVC e uma das seqüelas que está sofrendo é a falha na memória. Marineide é uma dos 47 pacientes que, até o final de se setembro estavam em tratamento na unidade hospitalar.


Por dia, o maior pronto socorro do Estado recebe de sete a dez pessoas vitimadas pelo AVC. Muitas delas que já tiveram o problema anteriormente. A filha de Marineide, Alane Rosa, 22, teve que falar por ela. Segundo disse, a primeira vez que a doença acometeu sua mãe foi há dois anos, quando ela teve um mal-estar e a boca começou a entortar. Imediatamente foi levada ao hospital e conseguiu se recuperar.


Nesse segundo caso, os sintomas começaram com um formigamento e forte dor na cabeça. A família procurou atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), mas não foi identificado de imediato que se tratava de um derrame cerebral. “A gente voltou pra casa e pagamos alguns exames. Mas depois, ela começou a perder a força na mão direita e aí fomos novamente à UPA. De lá foi transferida para cá na quarta-feira da semana passada”, relatou a filha. 


O AVC é causado pela obstrução de alguma artéria no cérebro ou sangramento com lesão bem localizada. Por isso, os sintomas são típicos e detectáveis como os que acometeram Marineide. Além da boca entortar e da fala enrolada, também é comum sentir fraqueza ou dormência de um lado do corpo, na face, braço ou perna; confusão mental com dificuldade para falar e compreender; e alterações de memória. Os sintomas surgem de maneira abrupta e a orientação é para que se procure imediatamente o hospital porque se trata de uma emergência médica.


Após sentir um lado do corpo sem forças, o agricultor José Veríssimo de Lima, 61 anos, da cidade de Passagem, no Agreste potiguar, foi levado ao Hospital Regional de Santo Antônio, mas a família ainda não sabia que se tratava de um derrame porque ele também teve convulsões e um ronco forte no peito. O agricultor passou 17 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “No dia 10 de setembro, ele teve começo de AVC e os exames mostraram que ele estava também com pneumonia e já tinha tido derrame sem saber”, relatou a irmã do paciente, Maria de Fátima Lima, 56, que o acompanha no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel. Ela relatou que a situação dele é estável e ainda não sabe se ele está com seqüelas.


O AVC ainda é uma doença que, predominantemente, acomete pessoas idosas, pois, é o grupo que, mais freqüentemente, também apresenta maiores fatores de risco. Contudo, pode ocorrer em qualquer faixa etária.


Apesar da rapidez com que se apresenta e evolui, nem todo paciente acometido por um AVC ficará com seqüelas ou necessitará de cirurgia. A extensão da doença, a localização, o tipo, a idade do paciente, são predominantes para a avaliação clínica do dano causado. Mas, para aqueles que ficarem sequelados, felizmente, a atuação de uma equipe multiprofissional de reabilitação (fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais) contribui na melhoria e superação do quadro do doente, possibilitando o retorno de suas funções motoras, fala e atividades da vida diária. Em 80% dos casos não há necessidade de cirurgia, sendo necessário apenas o tratamento clínico.


Sesap diz que está melhorando atendimento

Em nota, a Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap/RN) disse que está aprimorando o fluxo de atendimento de pacientes com Acidente Vascular, com o objetivo de ampliar a resolutividade dos serviços e diminuir o tempo de respostas para essas patologias.


Segundo a pasta, atualmente os pacientes são atendidos inicialmente nas UPAs, que realizam uma avaliação para constatar o derrame cerebral. Confirmado, os encaminham para o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel ou para o Hospital Tarcísio Maia, que são as unidades de referência no Estado para esse atendimento onde realizam exame de tomografia de crânio e os médicos avaliam a necessidade de neurocirugia.


“Para o novo fluxo que vem sendo desenhado pelo Estado, foram adquiridos e estão sendo instalados tomógrafos no Hospital Giselda Trigueiro, no Hospital Regional Telecila Freitas Fontes (Hospital Regional do Seridó), em Caicó, e no Hospital Regional Cleodon Carlos de Andrade, em Pau dos Ferros. Além disso, o Hospital da Polícia e o Hospital Deoclécio Marques de Lucena também entrarão no fluxo, por meio da realização de tomografias, para garantir maior agilidade no diagnóstico", disse em nota.


Segundo a Sesap, esse novo fluxo deve descentralizar os exames de tomografia que indicarão a necessidade de cirurgias que continuarão sendo encaminhadas ao Tarcísio Maia ou para o Walfredo Gurgel.


Estrutura de atendimento público é precária no Estado

No Rio Grande do Norte, além do Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, apenas o Hospital Tarcísio Maia, em Mossoró, tem estrutura para socorrer as vítimas de um Acidente Vascular Cerebral. Isso dificulta o tratamento que precisa ser imediato e exige maior prevenção da população para evitar a doença.


O neurologista do HMWG, Marcelo Marinho, explicou que o tempo para identificar os sintomas, procurar um pronto socorro e receber o tratamento correto é muito curto para quem está sofrendo um derrame. “O ideal é que antes de 4 horas o paciente esteja dentro de um pronto socorro sendo atendido por um neurologista. Num mundo perfeito, seria em 60 minutos. Existe um remédio que desobstrui a artéria entupida, mas só pode ser dado em até quatro horas e meia para diminuir as seqüelas. Não temos essa estrutura pronta para receber esses pacientes. As UPAs não têm tomografia nem essa medicação”, ressaltou.


É por isso que os pacientes acabam sendo encaminhados para o Walfredo Gurgel ou para o Tarcísio Maia, dependendo de sua localização. Às vezes, a família leva direto para esses hospitais. Dependendo do tempo que isso ocorre, o paciente perde a chance de receber o trombolítico. O medicamento é, atualmente, a melhor janela de oportunidade, mas só pode ser dado pelo neurologista quando é feita a tomografia. “A gente faz outros procedimentos que diminuem as chances de seqüelas como suporte de ventilação, controle rigoroso da pressão, mas o remédio específico é esse”, pontuou o médico.


Dependendo da gravidade e extensão da lesão, o acidente vascular pode ser dividido em isquêmico, que é a forma mais branda e nas situações em que o trombolítico é utilizado; e hemorrágico, que é a forma mais agressiva do AVC. Segundo o neurologista Marcelo Marinho, 80% dos casos de derrame são da forma mais branda, enquanto 20% são hemorrágicos, deixando maiores seqüelas e levando mais pacientes a óbito. 


“As mortes variam pelo subtipo da doença. Aqui no RN, a mortalidade é mais alta pela falta de estrutura. Já a quantidade dos que sofrem um AVC oscila, dependendo do controle dos fatores de risco e ainda continuamos sem tratar direito esses fatores”, alertou o neurologista. 

Entre eles está a diabetes, hipertensão, alteração no colesterol, tabagismo, sedentarismo e obesidade. Para o médico, se o sistema de saúde conseguir controlar essas doenças, menos pessoas sofrerão derrame cerebral. A boa notícia é que, controlando rigorosamente essas doenças que facilitam a ocorrência do AVC, 90% dos casos podem ser evitados. “Dos dez que internamos por dia no Walfredo, por exemplo, teríamos apenas um, se houvesse um bom acompanhamento dessas doenças na rede básica. Além disso, quando se tem AVC, habitualmente haverá a tendência de voltar a ter, se não reduzir esses fatores de risco”, declarou o neurologista Marcelo Marinho.



Créditos: Magnus Nascimento

Neurologista Marcelo Marinho chama atenção para riscos do AVC


Fonte: Tribuna do Norte

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