Técnicos do Ministério da Saúde fizeram um documento de recomendações para os gestores do SUS (Sistema Único de Saúde), enviado a todos os secretários estaduais de Saúde, no qual destacam a necessidade de implementação de um plano de quarentena. Entre elas, está a contratação de trabalhadores informais para atividades de orientação do isolamento social, como identificar idosos nas ruas.
No documento, sugerem uma orientação do governo federal para que, na semana de 6 de abril, escolas e universidades possam ser fechadas até o fim do mês, com uma atualização de cenário em 20 de abril. Trata-se ainda de um movimento de resistência contra as tentativas do presidente Jair Bolsonaro de afrouxar as medidas de isolamento.
Apesar de estados e municípios já terem adotado essas restrições na área de educação, o governo federal não determinou a paralisação desses serviços, o que poderia vir a ser feito agora. Os técnicos sugerem ainda distanciamento social no ambiente de trabalho e proibição de eventos com aglomeração, como jogos de futebol. Medidas mais restritivas seriam adotadas em abril, maio e junho.
No documento, ao qual o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso, há um balanço de todas as medidas adotadas até sexta, com previsão de o governo ter de criar mais 20 mil leitos de internação para atender à demanda dos infectados no próximo mês. A previsão é de haver necessidade de 40 mil leitos até 30 de abril. Como revelou o Estadão/Broadcast, a necessidade ocorreria no pior cenário previsto para o período.
No plano de ação da quarentena, a ser executado nos próximos três meses, há a previsão da contratação de trabalhadores informais como promotores de saúde durante a resposta à covid-19. A ideia é que eles orientem as pessoas na rua, identifiquem idosos que estão fora do isolamento para enviá-los para casa, além de atuarem na limpeza de superfícies. Outras medidas incluem a proibição de qualquer evento de aglomeração (shows, cultos, futebol, cinema e teatros).
Há, ainda, previsão de redução em 50% da capacidade instalada em bares e restaurantes. O documento traz medidas mais restritivas do que as que vinham sendo passadas pelo Ministério da Saúde oficialmente até agora. Apesar disso, estados e municípios saíram na frente, decretando cancelamento de aulas e eventos. A leitura no Ministério da Saúde é de que houve excessos em muitos casos, mas a partir de 6 de abril já seria a data ideal para implementar as medidas.
Anteontem, durante entrevista ao Programa Brasil Urgente, Bolsonaro defendeu a realização de jogos de futebol em estádios com público reduzido para 10% da capacidade e disse que "infelizmente algumas mortes terão". "Paciência."
Os técnicos responsáveis pelo documento, por outro lado, consideram que devem sofrer represálias por endurecer as medidas em meio ao discurso do presidente pela volta à normalidade no Brasil, a fim de retomar atividades econômicas.
Uma das possibilidades ventiladas é a eventual demissão da equipe de Vigilância em Saúde (SVS), mais resistente. Ontem, enquanto Bolsonaro se reuniu com ministros no Palácio da Alvorada, entre eles Luiz Henrique Mandetta, parte da equipe da Saúde fez uma reunião paralela na sede do ministério para discutir o assunto.
Ao Estado, o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Alberto Beltrame, afirmou que a entidade não apoia nenhum "recuo no sentido de afrouxamento de isolamento e sim uma transição na direção de sua ampliação, na medida da necessidade". "Esperamos que a equipe técnica do ministério possa seguir seu trabalho sério, técnico e cientificamente orientado, sem que nenhuma outra orientação se sobreponha ao interesse da proteção da saúde e da vida das pessoas", afirmou Beltrame.
Divergências
Mandetta está sob forte pressão nos últimos dias para atender aos anseios de Jair Bolsonaro e ao mesmo tempo se manter fiel ao que recomendam as entidades médicas. Na última semana, ele foi criticado pela atuação na reunião com secretários estaduais e municipais. Embora não tenha defendido o isolamento vertical, Mandetta adaptou o discurso e falou da abertura de igrejas, desde que seja feita com cautela.
Para alguns secretários, a reunião foi vista com alívio, por Mandetta não endossar expressamente as falas do presidente. Outros, entretanto, disseram que o ministro deveria ter sido mais firme em apoiar medidas técnicas. O temor é de que, se ele se afastar do Ministério da Saúde agora, poderia ser substituído por Antonio Barra Torres, presidente da Anvisa, que acompanhou o presidente em manifestação feita no dia 15 de março, na qual ele teve contato com centenas de pessoas.
Fonte: Estadão
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