O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) recebeu em seu gabinete na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro quatro ex-assessores investigados pelo Ministério Público (MPRJ) pela suposta prática de "rachadinha" – esquema em que parte do salário de assessores é devolvida aos parlamentares. As informações foram publicadas nesta quarta-feira (12) pelo jornal O Globo.
A visita aconteceu em 30 de outubro de 2019, de acordo com as informações baseadas em imagens e documentos obtidos pelo jornal via Lei de Acesso à Informação.
De acordo com a reportagem, no mesmo período, os ex-assessores prestaram depoimentos na investigação sobre as suspeitas de "rachadinha".
Os quatro ex-assessores não frequentavam mais a Câmara de Vereadores regularmente. Segundo a reportagem, um ex-auxiliar do atual senador e ex-deputado estadual Flávio Bolsonaro também esteve no gabinete de Carlos Bolsonaro no mesmo dia.
O vereador Carlos Bolsonaro, o senador e seu irmão Flávio Bolsonaro, e ex-assessores são investigados pelo MPRJ sobre suspeitas de uso de funcionários fantasmas para devolução de salários.
Procurado, o gabinete de Carlos não se manifestou até a publicação da reportagem.
Segundo O Globo, o advogado de Flávio, Frederick Wassef, não respondeu especificamente sobre a visita do ex-assessor e disse que há "obsessão" nas reportagens "contra a família Bolsonaro".
Família Góes
Segundo O Globo, os ex-assessores Rafael de Carvalho Góes e Rodrigo de Carvalho Góes são irmãos e trabalharam no gabinete de Carlos entre 2001 e 2008. Os dados obtidos na Câmara de Vereadores mostram que havia registro da visita dos dois ao gabinete desde 2015.
Em 30 de outubro, eles foram ao Palácio Pedro Ernesto na companhia da mãe, Neula de Carvalho Góes, que foi exonerada no início do ano passado e também não tinha voltado ao local.
Registro da entrada da família Góes na Câmara de Vereadores no dia 30 de outubro de 2019 — Foto: Reprodução/ O Globo
Rafael, Rodrigo e Neula chegaram ao Palácio Pedro Ernesto pela portaria da Câmara Municipal, na Rua Alcindo Guanabara, às 10h, de acordo com os registros da Casa. Eles foram para o gabinete de Carlos e saíram do local juntos, às 13h16 do mesmo dia.
Os dados e fotografias da Câmara Municipal mostram que, em 30 de outubro, Carlos Bolsonaro registrou presença no plenário às 14h15. A sessão daquele dia ficou suspensa até as 15h40. Às 16h12, ele aparece nas imagens da sessão, quando votou pela primeira vez. Carlos esteve no plenário até as 17h36, quando votou pela última vez naquela tarde. Depois disso, não foi mais visto lá.
Registro da entrada da família Hudson na Câmara de Vereadores no dia 30 de outubro de 2019 — Foto: Reprodução/ O Globo
A reportagem de O Globo apurou que os três integram uma das famílias que por mais tempo assessoraram Carlos Bolsonaro, segundo registros oficiais. Eles moram em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio, e constaram como auxiliares do vereador desde 2001, mesmo ano em que Carlos assumiu o mandato.
Rafael é nutricionista e foi nomeado entre 2001 e 2008, mesmo período de seu irmão. Neula esteve no gabinete de 2001 até fevereiro do ano passado. Em julho, O Globo foi à casa da família na Zona Oeste e encontrou Rafael. Ao questioná-lo se ele havia trabalhado na Câmara, disse que “não”. Em todo o período no qual esteve nomeado, Rafael e o irmão Rodrigo receberam um total corrigido de R$ 557 mil cada. Já Neula, R$ 1,4 milhão.
No dia 24 de janeiro, O Globo encontrou Rodrigo Góes na casa da família em Santa Cruz. Ele disse que o gabinete de Carlos é o responsável por explicar o motivo das visitas e que não daria informação. "Meu pai e minha mãe também não. É tudo via gabinete. É o correto", afirmou Rodrigo ao jornal.
Questionado sobre o motivo de ter ido ao gabinete em data próxima ao depoimento, Góes limitou-se a dizer: "Vocês têm que procurar saber se é com o gabinete ou com o MP".
Família Hudson
Outros dois ex-assessores que estiveram na Câmara no mesmo dia são pai e filho: Guilherme dos Santos Hudson e Guilherme de Siqueira Hudson.
Segundo os registros da Câmara ao qual O Globo teve acesso, às 15h05, os dois chegaram na Câmara. Eles ficaram no gabinete até as 17h45.
Guilherme de Siqueira Hudson, o filho, constou como assessor-chefe do vereador durante 10 anos — entre abril de 2008 e janeiro de 2018. Ele é primo de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Bolsonaro.
A reportagem apurou que durante todo o tempo em que ficou lotado na chefia do gabinete, jamais teve crachá. O rapaz tem residência fixa em Resende, no Sul do RJ, há sete anos, onde mantém um escritório de advocacia. Desde 2012, o site do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio mostra que ele atuou em 68 processos na região de Resende e apenas cinco na capital. Por todo o período nomeado, o ex-chefe de gabinete recebeu um total atualizado de R$ 2,3 milhões.
Guilherme dos Santos Hudson, o pai, é um dos investigados no inquérito que apura peculato e lavagem de dinheiro no âmbito do gabinete de Flávio Bolsonaro a partir de relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Junto com o senador, ele também teve o sigilo bancário e fiscal quebrado pelo Tribunal de Justiça do Rio em abril do ano passado e foi alvo de busca e apreensão em dezembro. Hudson recebeu pelo período em que foi nomeado cerca de R$ 17,7 mil.
Procurado, o advogado Magnum Roberto Cardoso, que defende Guilherme dos Santos Hudson, disse que não tinha conhecimento do assunto. A reportagem do jornal O Globo também pediu resposta sobre Hudson filho, mas não recebeu retorno.
Visita em data anterior
A reportagem de O Globo também apurou que pai e filho estiveram juntos uma outra vez no gabinete de Carlos Bolsonaro no ano passado. A visita foi em 12 de junho entre 14h21 e 17h06 — conforme os registros do Palácio Pedro Ernesto.
A visita aconteceu um mês depois de tornada pública a informação de que o pai (Hudson) era investigado pelo MP no procedimento sobre o gabinete de Flávio Bolsonaro e dois dias depois que repórteres do Globo estiveram na casa deles em Resende tentando entrevistá-los. Na ocasião, Hudson pai disse que “não tinha nada a declarar”.
Investigações
O vereador é investigado pelo MPRJ desde julho do ano passado. O procedimento foi instaurado depois de a revista Época revelar, em 20 de junho de 2019, que Carlos empregou sete parentes de Ana Cristina Valle. Dois deles admitiram que nunca trabalharam embora estivessem nomeados.
A investigação criminal está a cargo do procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, com apoio do Grupo de Atribuição Originária Criminal (Gaocrim). A improbidade administrativa é apurada na 8ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital.
Flávio Bolsonaro é investigado desde julho de 2018 depois que um relatório do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor dele na Alerj.
O caso tramita no Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc) e na 3ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital.
O MPRJ informou, em nota, que os procedimentos tramitam "sob absoluto sigilo, impossibilitando qualquer tipo de informação".
Fonte: G1
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