Apesar de afirmar ser contrário à ação da milícia, o vereador Marcello Siciliano, do PHS, já conversou com milicianos ao telefone. Gravações feitas pela polícia mostram pelo menos duas conversas telefônicas entre ele e integrantes do grupo criminoso.
Segundo matéria publicada pelo jornal O Globo na última terça-feira (8), ele e Orlando Oliveira de Araújo, conhecido como Orlando Curicica, tramaram a morte da vereadora Marielle Franco, assassinada a tiros na noite de 14 de março. Durante uma coletiva na quarta (9), Siciliano negou participação no crime.
As interceptações foram mostradas na noite deste domingo (13) pelo Fantástico. Na primeira conversa, vereador e miliciano se cumprimentam chamando um ao outro de "irmão".
Em outra conversa, um homem pede que Siciliano acione o 31º BPM (Recreio).
Homem: "Uns bandidos lá mataram um amigo nosso. Você podia dar um toque no pessoal do 31 pra ficar de olho. Se botar uma blitz ali, vai pegar".
Siciliano: "Vou mandar botar agora. Na volta eu passo aí. Beijo."
Homem: "Tá bom. Beijo. Fica com Deus."
Siciliano: "Te amo, irmão."
No segundo telefonema, segundo as investigações, o vereador pede ajuda para inaugurar um projeto social na área de milícia:
Siciliano: "O garoto ia começar a fazer o projeto lá hoje. Aí o rapaz falou: 'Não. Não vai fazer nada, não."
Homem: "Não, pode ir."
Siciliano: "Eu posso ir atrá lá da pessoa pra resolver no teu nome?"
Homem: "Pode. Vou te mandar o telefone aqui."
Por meio de nota, o vereador reafirmou que nunca teve envolvimento com milícias. Disse, também, que já foi investigado mas não chegou a ser indiciado. Ele ainda se colocou à disposição da polícia para quaisquer novos esclarecimentos.
Siciliano foi eleito com 13,5 mil votos – a maioria conseguidos na Zona Oeste da cidade. Ele não responde a nenhum processo criminal.
Orlando Curicica
Ex-chefe de uma milícia e preso desde outubro do ano passado, Orlando Curicica também negou, por meio de carta, qualquer participação no assassinato de Marielle Franco.
Ele foi detido após ser apontado como mandante da morte de um homem que decidiu montar um circo na área controlada por Orlando sem pedir sua autorização.
Em uma ação parecida com a do assassinato da vereadora, dois bandidos dispararam 12 vezes na direção da vítima. Uma mulher que o acompanhava sobreviveu e hoje vive escondida. O grupo de orlando, assim como outros milicianos, também é investigado por grilagem, que é a posse ilegal de terernos.
A Zona oeste é o berço dos milicianos cariocas. São grupos que usam de violência para ameaçar a população e cobrar por serviços irregulares, como transporte, entrega de gás e canais de TV por assinatura. Eles também tomam moradias e terrenos à força.
"Já tivemos casos comprovados em que eles invadiram, tiraram os moradores, expulsaram e depois usaram o imóvel para a venda de terceiros", disse o promotor de Justiça, Daniel Braz.
Na mesma carta em que negou participação no assassinato de Marielle, Orlando Curicica acusou um delegado da Divisão de Homicídios (DH) de tentar convencê-lo a confessar envolvimento no crime.
"Ele foi visitado pelo delegado titular da DH, doutor Giniton, que fez uma proposta que eu considero uma ameaça, dizendo a ele o seguinte: 'Ou você assume esse crime ou vou embuchar mais dois homicídios nas suas conta e vou lhe transferir para Mossoró. Se você assumir, eu consigo um perdão judicial", descreveu o advogado de Orlando, Renato Darlan.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Polícia Civil informou que o delegado Giniton Lopes esteve no presídio para tomar o depoimento de Orlando sobre o assassinato de Marielle, mas ele não quis falar.
Quatro homens
Segundo a versão da testemunha que acusa Orlando e o vereador Siciliano, os dois queriam a morte de Marielle porque ela era uma ameça aos interesses de ambos na Zona Oeste.
Ainda segundo a testemunha, no carro que abordou o veículo onde estava Marielle – além do motorista Anderson Gomes, também assassinado – havia quatro homens: um policial militar da ativa, um ex-PM e atualmente miliciano da Zona Oeste, além de outros dois milicianos.
"São áreas onde a gente sabe que existem disputas territoriais, disputas entre interesses de grilagem. A Marielle não tinha uma disputa eleitoral nas áreas de milícia, mas ela fazia uma ação social de atendimento a essas vítimas da milícia", explicou o deputado estadual Marcelo Freixo.
O Fantástico apurou que a testemunha forneceu à polícia o número de um celular que teria sido usado pelos assassinos – esse número já vinha sendo investigado.
O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, declarou que todos os citados pela testemunha já são considerados investigados, mas lembra que é preciso comprovar o que foi dito no depoimento.
"É preciso supor se esses dados batem com os que dispõe a investigação. Se não, de fator perde a consistência com que foram dadas essas declarações", disse o ministro.
"É possível que seja milícia? É. Mas é importante que haja produção de provas. A gente não quer vingança, a gente quer justiça", finalizou Freixo.
Fonte: G1
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