Sem manutenção no sistema de identificação de impressões digitais – que permitiu, por exemplo, apontar o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) como responsável pelos R$ 51 milhões encontrados em um apartamento em Salvador –, a Polícia Federal prevê prejuízos na pesquisa de procurados pela Interpol e na verificação dos dados de donos de novos passaportes. De acordo com documento da corporação, “diante do iminente esgotamento do banco de imagens do sistema”, nenhuma informação deve ser incluída até o novo contrato (veja íntegra da circular abaixo).
O Afis (Sistema de Identificação Automatizada de Impressões Digitais) é uma das principais ferramentas aliadas em investigações. A interrupção da manutenção ocorreu no dia 4 de setembro, quando chegou ao fim o contrato entre a PF e a Iafis – empresa responsável pelo suporte da tecnologia. Com isso, além de não poder armazenar dados no sistema, papiloscopistas também não podem cruzar fragmentos de impressão com os dados disponíveis.
Por e-mail, a PF disse ao G1 que o sistema continua funcionado e que o processo de assinatura do novo contrato está “em vias de finalização”. A data, porém, não foi informada. A corporação não quis responder a outras perguntas.
Um profissional que não quis se identificar afirmou à reportagem que o sistema custou R$ 130 milhões. Atualmente, ele armazena dados de 23 milhões de pessoas.
"O sistema que auxiliou na descoberta do dono dos R$ 51 milhões [o ex-ministro Geddel] ficar parado por falta de dinheiro é uma ironia do destino."
“Passaportes serão emitidos sem garantia de unicidade do cidadão. Sistema que subsidia a perícia dos papiloscopistas não poderá ser utilizado. Todas unidades da PF e dos estados da federação que utilizam o sistema Afis da Polícia Federal terão seus trabalhos de perícia papiloscópica (identificação de suspeitos, fragmentos de impressão digital encontradas em local de crime, identificação de estrangeiros, pense aqui nos refugiados, venezuelanos etc.) prejudicado. Procedimentos de investigação que requerem a identificação criminal também [serão prejudicados]”, completou.
O sistema é similar ao usado pela Interpol e unifica dados das polícias Civil e Federal de todos os estados brasileiros. O funcionamento é em rede, interligando toda polícia em tempo real – é possível obter a ficha cadastral do suspeito em menos de seis minutos.
Antes do sistema, era quase impossível identificar impressões digitais deixadas em objetos como copos, vidros e portas. Com o Afis, esses fragmentos são recolhidos (escaneados) e lançados no banco de dados. Em poucos minutos, o programa elenca uma série de potenciais suspeitos (pessoas que poderiam possuir as digitais coletadas).
A papiloscopia tem precisão de quase 100%, já que não existe uma impressão digital igual à outra. As impressões papilares estão presentes nos dedos, palmas das mãos e nas plantas dos pés. No antigo processo, eram usadas fichas arquivadas, dificultando a pesquisa dos profissionais.
Vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Flavio Werneck disse que a situação preocupa a categoria. “Na verdade, o que a gente vê de impacto mais rápido são as consultas [de impressões]. As pesquisas e novas inserções. Você dificulta muito isso aí. E para o pessoal do passaporte também complica bastante, porque o pessoal do passaporte também precisa do sistema para fazer algumas pesquisas mais específicas, o pessoal fica mais impossibilitado.”
Werneck disse acreditar haver “falta de planejamento” e “falta de gestão”. “Por um lado a gente tem uma eficiência muito grande em investigações de organizações criminosas, principalmente de colarinho branco, e por outro lado a gente não consegue administrar recursos de forma adequada.”
Documento
Memorando-Circular nº 15/2017-INI/DIREX/PF
Aos Srs.: Superintendentes Regionais da Polícia Federal, Coordenador-Geral de Controle de Segurança Privada - CGCSP/DIREX/PF, Coordenador-Geral de Polícia de Imigração - CGPI/DIREX/PF, Coordenador-Geral de Cooperação Internacional - CGCI/PF
Assunto: Comunicação indisponibilidade AFIS
Considerando que no dia 04/09/2017, encerrou-se, sem a devida renovação, o contrato de manutenção do sistema AFIS. Em função disso e diante do iminente esgotamento do banco de imagens do sistema, cuja manutenção ficava a cargo da empresa contratada, este Instituto Nacional de Identificação, orienta a todos os usuários AFIS a não fazer nenhum tipo de inclusão, até que novo contrato seja assinado. Tal precaução deve ser tomada já que, completando-se todo o espaço do banco de imagens, toda e qualquer funcionalidade do AFIS será interrompida, sem que seja possível estimar quais prejuízos isso traria ao sistema. Vale ressaltar que o sistema ainda poderá ser utilizado para consultas de impressões digitais constantes no banco de dados.
Cumpre ainda mencionar que:
Os usuários das estações booking poderão continuar realizando coletas biométricas nas estações, contudo, deverão passar a incluir no modo massivo, conforme orienta o item 9.1 do manual disponível na intranet do INI, na sessão “Manuais/Manual Didático de Utilização da Booking”. Quando em modo massivo, as inclusões são armazenadas em pastas de backup e poderão ser inseridas quando o sistema voltar a operar. Em caso de dúvidas sobre os procedimentos, o SID/DINCRE/INI/DIREX/PF, no ramal (61) 2024-9323, estará à disposição para prestar orientações.
Com relação à emissão e ao controle do passaporte, todos os novos documentos não passarão pela devida checagem até que a situação seja normalizada. Os cadastradores não receberão, nesse período, feedback algum do sistema AFIS quanto à individualização do requisitante de passaporte.
A pesquisa de procurados pela Interpol também deverá ficar suspensa.
Por fim, o INI/DIREX/PF informa que as tratativas para celebração/assinatura de novo contrato de manutenção já estão em andamento e que, em breve, tal situação poderá ser normalizada.
Fonte: G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é muito importante para nós, comente essa matéria!