A jornalista e ex-simpatizante do Partido Social Cristão Patrícia de Oliveira Souza Lélis, de 23 anos, se tornou ré no processo no qual é acusada de mentir e extorquir dinheiro de Talma de Oliveira Bauer, de 65, assessor do deputado federal Pastor Marco Feliciano (PSC-SP).
O G1 apurou que a Justiça de São Paulo aceitou a denúncia feita pelo Ministério Público (MP), que acusou Patrícia de denunciação caluniosa e extorsão contra Bauer, e marcou para maio o interrogatório da jornalista, quando ela poderá ser julgada pelo caso.
Para a 1ª Promotoria Criminal, Patrícia mentiu à Polícia Civil em 2016 ao dizer que foi sequestrada e mantida em cárcere privado pelo assessor do deputado num hotel na capital paulista. Por conta dessa acusação, Bauer chegou a ser preso.
A jornalista também foi acusada pelo MP de cobrar dinheiro de Bauer para gravar vídeos em São Paulo desmentindo a acusação de tentativa de assédio sexual que ela fez contra Feliciano, no ano passado, em Brasília. O assessor alegou ter pago R$ 20 mil a um amigo dela.
Patrícia acusou Feliciano de tentar estuprá-la no apartamento dele na capital federal, em junho. Como o parlamentar tem foro privilegiado, o caso do suposto abuso sexual passou para a investigação da polícia do Distrito Federal.
A Polícia Civil já havia indiciado Patrícia pelos crimes em setembro, quando também pediu a prisão preventiva dela. O MP e a Justiça, no entanto, só não concordaram com o pedido para que ela fosse presa. Os órgãos também não atenderam a solicitação da defesa da jornalista para anular o inquérito policial.
Por e-mail, a jornalista confirmou ao G1 que a audiência sobre o caso já está marcada. Ela criticou Luiz Roberto Hellmeister, então delegado do 3º Distrito Policial (DP), Santa Ifigênia, no Centro de São Paulo, que a indiciou.
"Lembrando que eu fui acusada de um caso que o STF [Supremo Tribunal Federal] ainda não julgou, e o delegado que fez tal acusação carrega nas costas crimes bárbaros que aconteceram dentro da sua delegacia, como por exemplo o caso da Verônica Bolina, que foi brutalmente agredida dentro da própria delegacia", escreveu Patrícia, referindo-se à travesti que foi espancada após ser presa em 2015.
"Tenho testemunhas que estavam presentes na delegacia, que vão dar testemunho ao meu favor, dizendo sobre a conduta do delegado, e sobre os inúmeros xingamentos que se refere a mim", acrescentou a jornalista.
O G1 não conseguiu localizar o delegado, que atualmente está no 92º DP, Parque Santo Antônio, na Zona Sul de São Paulo, para comentar as acusações de Patrícia.
Interrogatório
Patrícia responde ao processo em liberdade. O juiz Carlos José Zulian marcou para as 15h do dia 25 de maio deste ano, na 1ª Vara Criminal do Fórum da Barra Funda, Zona Oeste da capital paulista, os depoimentos das testemunhas do caso e o interrogatório da ré.
Nessa etapa, se quiser, o magistrado já poderá julgar o processo e dar a sentença. Caso haja condenação, as penas dos crimes de denunciação caluniosa e extorsão podem variar de 6 a 20 anos de prisão.
“Vamos esperar o judiciário, que é ele que tem o poder de julgar o certo e o errado nesse momento”, disse Ana Ruas, uma das advogadas de Patrícia, por telefone ao G1. "A defesa confia no trabalho do judiciário, que fará uma análise pormenorizada dos fatos, respaldado nas provas devidamente produzidas durante a instrução criminal, sempre sob o crivo do contraditório e assegurados os princípios constitucionais assegurados pelo estado democrático de direito."
Ana trabalha com a advogada Livia Novak na defesa da jornalista.
Como a brasiliense informou morar na capital federal, existe a possibilidade de que Patrícia seja ouvida por carta precatória em Brasília. Em outras ocasiões, sua defesa alegou que a jornalista negava os crimes que a polícia atribuiu a ela.
Nas redes sociais, Patrícia também chegou a comentar o processo que responde em São Paulo. Em texto e num vídeo, a jornalista revela que deixou de frequentar a igreja evangélica, abandonou a direita política e se tornou feminista, o que combatia antes.
“Eu sei que várias pessoas irão, de alguma forma, me caluniar, difamar, postar vídeo... Ah! Ela mudou de lado... Enfim, mudei mesmo de lado porque eu entendi que defendia o lado errado e, infelizmente, eu tive esse entendimento através de um episódio muito triste”, disse Patrícia num vídeo publicado em sua página no Facebook em 8 de março (leia mais abaixo).
Procurada pelo G1, a assessoria de imprensa de Feliciano informou, por e-mail, que "o caso se encontra sub judicie em São Paulo/SP e em Brasília/DF, e que ambos os processos correm em segredo de justiça" e que "por essa razão ficamos impedidos de divulgar maiores detalhes do caso."
Também procurado pela reportagem, o promotor Alfredo Mainardi Neto não quis se pronunciar, alegando que o processo está sob segredo de Justiça. Bauer ou seus advogados não foram encontrados.
Mentira e extorsão
As investigações do caso Patrícia x Bauer começaram a partir de denúncia feita inicialmente pela própria jornalista em São Paulo. No dia 5 de agosto de 2016 ela registrou boletim de ocorrência no 3º DP, no centro da capital paulista, contra o assessor de Feliciano.
Patrícia havia procurado a delegacia para acusar Bauer de sequestro e cárcere privado num hotel da cidade, entre julho e agosto do ano passado. Ela alegava que o assessor a manteve encarcerada, ofereceu dinheiro e a ameaçou com uma arma para gravar vídeos nos quais inocenta Feliciano dos crimes sexuais que o deputado supostamente teria cometido contra ela.
Bauer chegou a ser detido e liberado após negar as acusações de Patrícia. Para a Polícia Civil de São Paulo houve uma reviravolta durante as investigações que apuravam a denúncia de sequestro e cárcere: a jornalista mentiu ao acusar o assessor.
Segundo a conclusão do inquérito policial, a jornalista e um amigo exigiram dinheiro do assessor para que ela desmentisse a denúncia de que Feliciano abusou sexualmente dela.
"Ela representa risco à sociedade por mentir e causar danos a diversas pessoas", chegou a dizer à época o delegado Luiz Roberto Hellmeister, que havia pedido a prisão de Patrícia à Justiça.
De acordo com a polícia, além de depoimentos, gravações do hotel levaram a investigação a desmentir a versão da jornalista de que foi sequestrada.
O primeiro vídeo, registrado no fim da tarde de 30 de julho, mostra Bauer, e a Patrícia no lobby do hotel. Eles se abraçam na recepção. Nas outras imagens, feitas em 4 de agosto, a jovem aparece abraçada a um amigo no sofá na área comum do estabelecimento. Ao lado deles está o assessor de Feliciano falando ao celular.
O assessor disse à polícia que Patrícia cobrou dinheiro para gravar vídeos desmentindo a acusação de tentativa de assédio sexual que ela fez contra Feliciano. Segundo policiais, Bauer falou que não avisou Feliciano da suposta extorsão para preservá-lo.
O dinheiro foi apreendido pela polícia com o amigo de Patrícia.
O delegado afirmou no ano passado que a investigação também traçou o perfil psicológico de Patrícia após receber um laudo psiquiátrico, de 2 de fevereiro de 2016, que a classificou como "mitomaníaca", ou seja, tem transtorno de personalidade que faz com que minta compulsivamente.
De acordo com Hellmeister, a polícia e o Ministério Público do Distrito Federal pediram avaliação psicológica de Patrícia, que afirmava ter sido estuprada diversas vezes em sua casa, quando ela era adolescente, sem que sua família soubesse. "Após esse laudo, o caso foi arquivado por falta de provas. Ou seja, ela mentiu ter ocorrido um estupro que não aconteceu", tinha dito o delegado à época.
Um laudo anterior, de 2 de dezembro de 2015, não havia encontrado transtornos ou alterações psicopatológicas em Patrícia, mas pedia para ela continuar o tratamento psicológico e psiquiátrico. O documento foi feito por psicológicos.
Segundo o delegado informou em 2016, Patrícia também era investigada por ameaça depois de aparecer numa gravação, obtida pela polícia, ordenando que Bauer matasse um amigo dela. O assessor, que também é policial civil aposentado, se recusou a obedecer a jornalista, de acordo com a investigação.
Feliciano é investigado
Ainda no ano passado, Feliciano chegou a declarar que o indiciamento de Patrícia reafirmava sua plena confiança na lisura das instituições públicas e da Justiça. "Boatos são boatos e nunca serão verdades! Seguimos confiantes de até o término das investigações", informava a nota.
O deputado também havia gravado um vídeo, à época, ao lado da mulher, desmentindo as acusações da jornalista.
A acusação de Patrícia contra Feliciano foi feita no dia 7 de agosto de 2016, quando ela registrou boletim de ocorrência na polícia em Brasília por abuso sexual contra o deputado. Esse caso é investigado pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, na Asa Sul.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que é procuradora especial da Mulher no Senado, protocolou ofício junto ao MP do Distrito Federal pedindo investigação sobre Feliciano pela suposta tentativa de estupro. O PSC também criou uma comissão interna para apurar o caso.
Patrícia e feminismo
“Vi aqui comentários absurdos, de que fui até presa, detida, ou sei lá o que. Fato que não é verdade”, segundo postagem no Facebook de Patrícia em 9 de março. “Ainda quero ressaltar aqui, que o mesmo ao supostamente pedir minha prisão (sem motivo algum), teve tal pedido negado pelo MP e pelo Juiz, pelo simples fato de não existir a menor coerência”.
Um dia antes, texto e vídeo postados por Patrícia contam como ela se tornou feminista. “Sou jornalista, estudo direito e tenho 23 anos...”, se apresenta Patrícia num vídeo postado no Dia Internacional das Mulheres. “Tudo que uma sociedade machista quer é que a mulher se cale.”
“Antigamente eu defendia a seguinte frase: feminina sim e feminista jamais. É absurdo, né?! Eu era uma mulher machista e não tinha a menor noção disso e tive de passar por uma situação muito triste para poder entender o que é uma sociedade machista”, diz Patrícia na filmagem.
“Eu era uma das pessoas que mais caluniava a feministas, e foram elas que me ajudaram. Foram elas que estiveram do meu lado, até hoje. Estão do meu lado até hoje”, conta a jornalista. "Eu hoje, como feminista, posso dizer que: sim, eu já fui uma mulher machista. E que: sim, eu mudei de lado. E mudar foi uma coisa libertadora para mim porque eu comecei a entender que não estou aqui para agradar ninguém”.
A mesma página, porém, tem curtidas para Resistência Conservadora e Resistência Anti-Feminismo Marxista, possivelmente da época em que ela combatia o feminismo.
O G1 apurou junto ao Centro de Ensino Unificado de Brasília (Uniceub) que Patrícia concluiu no final de 2016 todas as disciplinas do curso de jornalismo, mas não teria feito colação de grau nem pego o diploma ainda.
Fonte: G1
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