Pessoas que doaram valores baixos a campanhas políticas em 2014, como R$ 30 ou R$ 60, estão sendo processadas pelo Ministério Público por supostamente terem contribuído ilegalmente com
partidos políticos. Os valores, no entanto, estão bem abaixo do limite legal.
Os casos têm sido relatados nas redes sociais, o que provocou manifestações de pessoas que contam terem sofrido casos semelhantes. Os relatos divulgados envolvem doadores no Rio de Janeiro e em São Paulo, de partidos como PSOL e PSTU, para os quais as doações de seus simpatizantes têm um peso maior no financiamento de suas campanhas.
O UOL conversou com um advogado do Rio alvo de um processo do tipo. Lucas Mourão, 26, conta ter doado apenas R$ 60 reais a candidatos do PSOL, mas diz que o Ministério Público entendeu que ele ultrapassou os limites legais de doação, já que havia declarado ser isento do imposto de renda.
"O Ministério Público, por algum motivo que ninguém conhece, resolveu interpretar isenção como ausência total de renda", diz Mourão.
"Existe um padrão básico de pessoas que estão sendo processadas. São valores irrisórios, de pessoas isentas [do Imposto de Renda] e que fizeram doações para um determinado partido", afirma o advogado, que diz ter conhecimento de mais de 100 casos do tipo. "Não tenho nenhuma dúvida de que essa ação vai cair, não há nada que contrarie a lei", diz.
A legislação eleitoral fixa o limite de doações de pessoas físicas em 10% do total de rendimentos do ano anterior ao das eleições. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) diz que, para os isentos do imposto de renda, o limite de doações é de 10% da faixa de isenção. Para as eleições de 2014, o teto de doações seria de R$ 2.455,66.
A punição para quem ultrapassa o limite de doações é de multa, no valor de cinco a dez vezes o valor doado acima do teto.
Na quarta-feira, uma apoiadora do PSTU afirmou em entrevista ao programa do jornalista Ricardo Boechat, da BandNews, estar sendo processada por "abuso de poder econômico" depois de ter doado R$ 30 a um candidato do partido em São Paulo. "Parece que não têm mais o que fazer", afirmou Clara Saraiva, 28, na entrevista à Band. "Foram dezenas de apoiadores da campanha do PSTU que sofreram isso", disse.
A Procuradoria Regional Eleitoral no Rio de Janeiro, responsável por coordenar no Estado o trabalho do Ministério Público nas eleições, informou que foram ajuizadas 2.489 representações contra pessoas físicas relacionadas às eleições de 2014. Mas, segundo a Procuradoria, não é possível discriminar quais casos dizem respeito a contribuições de isentos no imposto de renda.
"Não é só um constrangimento, é um atentado à democracia", afirma Mourão, que diz ter tido seu sigilo fiscal quebrado no processo, que ainda não foi julgado. "O que mais me preocupa é que para a pessoa leiga, fica a impressão de que não vale a pena voltar a doar. Essa postura do Ministério Público dá o recado às pessoas comuns de que elas não têm direito e não devem participar de ajudar a construir a democracia", afirma.
A Procuradoria Eleitoral do Rio informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que segue o entendimento do TSE, mas que cada procurador ou promotor eleitoral tem independência.
A reportagem do UOL procurou a Procuradoria Regional Eleitoral em São Paulo, mas a assessoria de imprensa da instituição informou que não foi possível, no final da tarde desta sexta-feira, entrar em contato com o responsável pelo assunto.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro informou, por meio de sua assessoria, que a lista com a relação de doadores em situação irregular foi encaminhada pela Procuradoria Regional Eleitoral do Rio, "com expressa recomendação aos promotores eleitorais para oferecimento de representações", diz a nota do MP-RJ.
A Procuradoria do Rio, por sua vez, informou que cabe a cada promotor eleitoral identificar as doações acima do limite legal e decidir se entra com ação. Segundo a Procuradoria, a Receita Federal encaminha uma lista com todos os doadores de campanha, e o órgão eleitoral reencaminha a listagem aos promotores de cada Zona Eleitoral, a quem cabe decidir pelas ações.
Fonte: Uol
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