Em 1989, o Brasil passava por um período de inflação elevada de tal ordem que fez o extinto Conselho Nacional de Defesa do Consumidor editar a Resolução nº 34, proibindo
a cobrança de sobrepreço nas compras feitas com cartão de crédito.
Passada a hiperinflação, a continuidade da vigência da resolução fez com que, para cumprir a regra, os comerciantes embutissem no preço das mercadorias os custos repassados às administradoras de cartão de crédito e os tributos incidentes sobre essa diferença. Hoje, em qualquer estabelecimento comercial, o consumidor paga um mesmo valor nas compras em dinheiro ou em cartão.
No entanto, ao pagar em dinheiro, não recebe qualquer redução do preço, pois o comerciante se apropria dos custos que seriam repassados às administradoras de cartões caso fosse esse o meio de pagamento utilizado.
Equivocadamente, alguns parlamentares, fundamentados em uma postura duvidosa de certas entidades que pretendem defender o consumidor, demonstraram contrariedade com o projeto de minha autoria destinado a revogar a citada resolução.
Ocorre que estamos diante de duas situações inaceitáveis no âmbito jurídico: a primeira, de natureza eminentemente de direito, diz respeito à inadmissibilidade de uma norma infralegal criar impedimento ao comerciante de dar desconto no pagamento à vista.
Isso viola o elementar princípio constitucional que determina que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer coisa alguma senão em virtude de lei. Entenda-se, lei em sentido estrito, votada pelo Legislativo e sancionada pelo chefe do Executivo.
A segunda situação diz respeito ao interesse público. A resolução, se um dia contemplou interesse social, hoje prejudica o comerciante que pretende dar ao consumidor o desconto correspondente ao custo adicional da venda via cartão de crédito.
Não nos esqueçamos de que o comerciante, ao receber por meio de cartão, tem um duplo custo: o financeiro - pois parte da receita vai para a administradora de cartão -, e o custo dos juros necessários ao financiamento do capital de giro, em razão do tempo de espera até o recebimento do valor da venda.
De seu lado, o consumidor, além de não ter desconto, arca ainda com PIS, PASEP, ICMS e Imposto de Renda, além, é claro, dos custos do cartão.
A venda por cartão de crédito foi ardilosamente denominada de compra à vista, mas ela traz todos esses prejuízos às partes, quando comparada com a compra a dinheiro.
Busco, apenas, uma igualdade de tratamento: ao lado da liberdade que as administradoras de cartão de crédito têm de contratar quem elas querem para defender seus interesses, que também seja dada igualmente liberdade ao comerciante de conceder descontos ao consumidor que paga à vista.
Desse modo, ganha o comerciante, por atrair mais clientes e por não ter que arcar com o custo dos juros incidentes sobre o tempo de espera para receber o pagamento, e ganha o consumidor – especialmente o menos afortunado –, à medida que o bom comerciante poderá lhe dar o desconto do custo da administradora de cartão de crédito, fazendo restar mais dinheiro em sua carteira depois das compras.
Examinei os contratos que as principais bandeiras de cartão impõem aos comerciantes, e o que encontrei neles foi a exigência de o comerciante não oferecer qualquer desconto no pagamento em dinheiro. Isso nos permite, com clareza, concluir a quem interessa essa proibição.
Popularização
E como cresce a quantidade de cartões de crédito em nosso país! Relatório sobre a indústria de cartões de pagamento, do Banco Central, informa que de 275 milhões de cartões, no primeiro trimestre de 2002, saltamos para dois bilhões de cartões, no quarto trimestre de 2007.
Quantos seriam hoje?
Por fim, cito trecho de matéria de "O Estado de S. Paulo", publicada em 2 de agosto, não muito favorável ao meu projeto, ressalvando posição do Banco Central:
"Regulador do mercado de cartões, o Banco Central (BC) é contrário à restrição de cobrança diferenciada por entender que a regra gera distorções em termos de eficiência e concorrência. A regra de não sobrepreço, diz o BC, implica em subsídio implícito de quem não usa o cartão em favor daqueles que usam a modalidade de pagamento.
Em um estudo de 2010, o BC calculou que uma família que usa dinheiro e outros instrumentos (como o cartão de débito, por exemplo) transferiu uma média de R$ 97 por ano aos titulares de cartões de crédito. O subsídio que cada família de renda alta que usa cartão de crédito recebeu chegou a R$ 301 por ano."
Quantos bilhões de cartões são mesmo? Como diria o mestre Rui, depois disso, diante disso...
Fonte: G1
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