O Ministério Público Estadual está apurando uma denúncia de tortura que teria sido praticada por policiais militares da Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas (ROCAM) de Mossoró contra jovens internados no Centro Integrado de Apoio ao Adolescente Acusado de Ato Infracional (CIAD) local. A PM foi acionada para conter atos de desordem em julho deste ano. O comando local diz desconhecer a denúncia e que os policiais teriam agido legalmente.
De acordo com a diretora da casa, Gessilda Silva de Azevedo, o incidente aconteceu no dia 3 do mês passado, quando adolescentes iniciaram um pequeno tumulto. Naquele dia, havia 12 jovens internados e a unidade estava sem policiais (são apenas dois por turno). Os educadores, amedrontados, acionaram a Polícia Militar, que enviou uma equipe da Rocam.
Conforme a diretora, o pedido era apenas para que os policiais fossem ao local para garantir a segurança dos servidores. No entanto, sem a devida autorização, eles entraram no estabelecimento e foram em direção aos alojamentos dos adolescentes. Todos foram retirados dos seus quartos e colocados no pátio, onde teriam sido torturados pelos militares.
Gessilda contou que não presenciou todo o ocorrido. Quando chegou lá, encontrou os adolescentes sem roupas e com marcas da violência. “Não mandei fazer revista, não mandei espancar ninguém. Não posso permitir abuso, espancamento, tortura aqui dentro”, destacou a diretora, explicando que, logo após tomar conhecimento dos fatos, informou o Ministério Público Estadual.
O Instituto Técnico-Científico de Polícia (ITEP) foi acionado, segundo ela, e fez uma perícia na unidade, assim como o exame de corpo de delito nos adolescentes, que confirmou a violência praticada.
Em depoimento prestado ao Ministério Público Estadual, ainda de acordo com a diretora, os adolescentes contaram com riqueza de detalhes toda a ação realizada pelos militares da Rocam. “Isso que estou dizendo aqui a vocês não é nem o começo do que aconteceu. Os meninos contaram coisas ainda mais graves”, destacou a diretora, durante conversa ontem com os jornalistas, que foram convocados para acompanhar uma inspeção feita pelo MP.
O promotor da Infância e da Juventude, Olegário Gurgel, afirmou que existem dois procedimentos em andamento, referentes à ação dos policiais da Rocam. Um deles é uma ação civil pública, que tramita sob sua jurisdição e apura a falta de condições da unidade, responsável pelo chamado dos PMs.
O outro procedimento tem caráter penal e está nas mãos de um outro membro do MP, que apura especificamente as denúncias contra os policiais.
Enquanto a diretora conversava com os jornalistas e passou a falar sobre a ação dos militares da Rocam, PMs que trabalham na segurança externa do prédio foram se aproximando, observando de perto as declarações da administradora.
Um deles chegou a intervir, afirmando que não era justo atribuir as dificuldades de convivência com os adolescentes à ação dos colegas da Rocam. Além dos dois que trabalham no prédio, policiais da Força Tática também apareceram por lá, justamente no momento em que a diretora falava sobre o tema.
Comando local da PM alega não ter conhecimento
O major Correia Lima, comandante do Décimo Segundo Batalhão de Polícia Militar de Mossoró, afirmou desconhecer as denúncias feitas pela direção do Ciad, que agora são apuradas pelo Ministério Público.
O oficial disse que foi informado sobre a ocorrência envolvendo a equipe da Rocam, a qual é sua subordinada, mas desconhece qualquer ação considerada ilegal. “A alegação cabe a quem acusa. A informação que eu recebi não é essa. Não é essa. Muito pelo contrário. Os policiais trabalharam de forma legal, pelo que eu estou sabendo”, destacou o militar.
“Se ela tem alguma dúvida disso, ela leve para o Judiciário e prove o que está afirmando”, acrescentou o oficial, ponderando em seguida: “A gente não admite esse tipo de coisa, abuso de autoridade. Mas uma alegação dessa é muito forte. Se ela está dizendo que a Rocam espancou, não é do meu conhecimento” , complementou.
Correia Lima disse ainda que a ação dos policiais teria sido acompanhada por membros do Centro Integrado de Apoio ao Adolescente Acusado de Ato Infracional (CIAD) e também da Fundação da Criança (FUNDAC), que é responsável diretamente pela administração das casas de recuperação juvenil.
Por enquanto, não há nenhum procedimento interno instaurado na PM, que aguarda a investigação feita pelo Ministério Público e uma posterior decisão da Justiça. Enquanto isso, os policiais envolvidos na ocorrência, cerca de 10, vão continuar atuando normalmente.
MP pede interdição total do Ciad por falta de condições
A Promotoria da Infância e da Juventude de Mossoró vai solicitar hoje a interdição total do Centro Integrado de Apoio ao Adolescente Acusado de Ato Infracional (CIAD) local. A unidade está em péssimo estado e enfrenta sérias dificuldades de material humano. Mesmo assim, ainda abriga seis adolescentes que aguardam decisão judicial sobre seus atos.
A imprensa teve acesso ontem à casa de internação e pode conferir de perto a falta de condição. O prédio está totalmente deteriorado, principalmente nos locais onde os jovens ficam internados. Há marcas de incêndio nos alojamentos, paredes quebradas, grades rompidas etc..
O promotor da Infância de Mossoró, Olegário Gurgel, havia dado entrada em uma ação civil pública, pedindo a interdição parcial da unidade há poucos dias. Voltou ontem ao estabelecimento para fazer uma vistoria e constatou que a situação havia piorado. Por isso, o promotor disse que decidiu pedir a interdição para que seja feita uma reforma urgente no prédio.
Na avaliação de Olegário Gurgel, a unidade não tem mais condições de funcionar. Ele lembrou que a falta de estrutura estaria colocando em risco a vida dos servidores e dos adolescentes.
“O problema do Ciad é grave. Não há nenhum alojamento com capacidade para receber adolescentes. Se continuar funcionando, põe em risco a segurança dos alojados e dos educadores. A entidade perdeu por completo suas condições. O risco é muito grande. Pode haver uma invasão a qualquer momento”, justificou.
Fonte: Defato/Cidade News Itaú
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