Mais crítica que a situação do alimento é a falta de água. Em muitas comunidades rurais do Oeste, ela já começa a faltar, preocupando os agricultores que não sabem o que fazer. No projeto de assentamento Remédios, em Umarizal, o açude que abastece as 50 famílias e todo o rebanho, só tem água para mais 40 dias.
Dona Francisca Alves de Oliveira, 49, explica que por enquanto, as famílias contam também com a água de uma cacimba particular, mas que também não vai demorar a acabar. "O consumo aumentou e a cacimba é rasa", explica. A agricultura paga R$ 3 por cada reservatório de 200 litros, dinheiro que faz muita falta para quem não tem renda nenhuma.
Ela é uma das que sofre dobrado com a seca deste ano. Uma das únicas a plantar, perdeu tudo com a falta de chuva e agora o marido, Arlindo da Silva, 44, precisa trabalhar na cidade como ajudante de pedreiro para não deixar faltar as coisas em casa. "Para piorar, o serviço que ele arrumou na rua está acabando", disse. Romário, o filho mais velho, não aguentou a situação e foi embora para Fortaleza em busca de trabalho.
No pequeno quintal da casa da agricultura, o baixio espelha com o sol. O lugar onde deveria existir uma vazante, só tem terra quente e muito mato seco. Nos sulcos plantados na esperança da chuva, batatas, milho e uma horta inteira definharam por conta da secura.
Além da morte das plantas que cicatrizam no quintal de dona Francisca, outra coisa chama atenção: a cruz com as iniciais de um filho assassinado a sangue frio na frente da esposa, por motivos ainda não esclarecidos. "É uma dor que terei de sentir todo dia", relata dona Francisca.
A aposta no
santo errado
Valderi de Souza Gomes, 42, vizinho de dona Francisca, é outro que amarga as perdas com a seca. Ele também apostou que São José não falharia e acabou investindo no plantio de feijão, mas sem chuva, as ramas nem floresceram. Agora, ele não sabe o que vai fazer para alimentar a família nos meses que vêm. "Tudo que eu tinha 'era' 20 litros de feijão que juntei do ano passado, plantei acreditando na chuva e perdi tudo", lamenta o sertanejo.
Ele se lembra da necessidade que passou na seca de 1993, e também pensa em procurar emprego fora de Umarizal. "Em 93, nós cozinhávamos feijão para almoçar e bebíamos o caldo na janta", disse o trabalhador olhando as tarefas de feijão perdidas na propriedade familiar.
Um dos mais simples do assentamento Remédio, Valderi só possuía um boi manso, mas teve de vendê-lo para pagar a conta da bodega depois que foi enganado por um construtor de Serra do Mel. Sem alternativa, o agricultor trabalhou como ajudante de pedreiro, mas não recebeu os R$ 600 pelo trabalho. "Confiando que ia receber, fiz fiado na bodega, como o homem me enganou, tive de vender o boi", narra.
Sem água há mais de 160 dias
O problema de falta de água não afeta apenas a zona rural. No município de Luís Gomes, na extrema do alto Oeste, está faltando água nas torneiras há mais de 160 dias, depois que o açude que abastecia as residências secou totalmente. A população está sendo obrigada a comprar água porque os carros-pipa enviados pelo governo são insuficientes.
A preocupação é que com a seca, outros municípios comecem a ter escassez de água. Por isso, prefeitos e lideranças pedem a conclusão das obras da adutora Alto Oeste, paralisadas desde 2010. Cerca de 80% dessa obra já estão concluídas e ainda são necessários em torno de R$ 25 milhões para conclusão, sendo R$ 18 milhões de responsabilidade do Estado, de um total de R$ 86 milhões.
A Justiça determinou que a adutora deve estar em funcionamento até o mês de novembro. O projeto do sistema adutor Alto Oeste pretende contemplar 23 municípios com águas da barragem Santa Cruz do Apodi.
Sindicatos se unem para lutar por alternativa
Na quinta-feira, 3, presidentes e representantes dos sindicatos dos trabalhadores rurais de Caraúbas, Umarizal, Patu, Olho D'água do Borges, Felipe Guerra e Campo Grande, além de um representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Norte (Fetarn), se reuniram em Caraúbas para discutir os problemas da seca da região do médio Oeste.
A escassez de água e alimento foram as pautas principais desse encontro. De acordo com o presidente do STR de Caraúbas, Ivanildo Pessoa de Morais, muitas comunidades estão sendo abastecidas com carros-pipa, mas esse serviço já é insuficiente para atender a demanda. Para piorar, muitos animais começam a adoecer por conta do calor e da desidratação.
Segundo José Maria Junior, representante da Fetarn, todas essas dificuldades estão fazendo voltar um problema antigo: o êxodo rural. "Muita gente está deixando a zona rural em busca de emprego nas cidades", alerta.
Os sindicalistas criticam a demora do governo e exigem urgência nas medidas. "É preciso que se amplie os recursos do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), que se criem linhas de crédito específicas para a compra de ração animal e que se garanta a renegociação de dívidas rurais", especifica Aurinete Lima, do STR de Olho D'água do Borges.
A sindicalista chama o "Bolsa Estiagem" de "cala-boca" dos pequenos agricultores e alerta sobre a apropriação das medidas emergenciais por políticos neste período de campanha eleitoral. No próximo dia 16, representantes sindicais de todo o Estado realizarão uma mobilização para que os governos estadual e federal agilizem as medidas para ajudar as famílias do semiárido.
Emparn prevê seca também para 2013
A Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte (Emparn) prevê mais seca para o próximo ano. O anúncio foi feito na quarta-feira, 2, em Natal, durante reunião com a Defesa Civil. O meteorologista do órgão público, Gilmar Bristot, disse que, mesmo sendo antecipado, o anúncio não estava otimista: "Essa condição no Estado, que hoje é permanente de seca, deve prevalecer no próximo ano".
A estiagem atinge o RN e preocupa os habitantes dos municípios que têm sua economia voltada para a agropecuária. O tenente coronel Josenildo Acioli, Coordenador Estadual de Defesa Civil, fez uma explanação das medidas tomadas pelo Estado para minimizar os efeitos da seca ao Major Farias - do Grupo de Apoio a Desastres (GADE), enviado pela Secretaria Nacional de Defesa Civil. "O GADE está vindo ao Estado para dar apoio e conhecer o trabalho realizado pelo governo para ajudar na assistência às comunidades atingidas pela seca", frisou o Tenente Acioli.
Gilmar Bristot, gerente do Setor de Meteorologia da EMPARN, acredita que a reunião ajudou a sanar as dúvidas da Defesa Civil quanto à estiagem de 2012. "Para nós, é interessante essa aproximação, pelo fato de envolver o governo do Estado e a defesa civil nacional, o que facilitará na elaboração das medidas de auxílio aos municípios que sofrem com a estiagem", frisou.
Durante o encontro, o tenente Aciolli mencionou o documento divulgado pela meteorologia da EMPARN no qual é explicada a ausência de chuvas no RN esse ano. Ele acredita que o documento foi de extrema importância para sanar as dúvidas da população quanto à seca.
(Com informações de Sidney Silva).
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