"Procuramos jovens que tenham até 25 anos e que residam na zona norte de Mossoró". Esse bem que poderia ser o texto de um anúncio publicitário de uma simples oferta de emprego, mas não é. Na verdade, trata-se de um espelho da violência na cidade. Nos dois primeiros meses de 2012, as maiores vítimas da violência residiam em bairros da região norte do município e tinham até 25 anos de idade. Quase 80% dos assassinados se enquadram nessa faixa etária e 48% vivem na mesma região.
Um levantamento feito pelo JORNAL DE FATO durante a semana passada traça o perfil das vítimas de homicídio em Mossoró durante os meses de janeiro e fevereiro de 2012, alertando para a necessidade de se realizar ações preventivas. Os dados foram coletados junto aos registros da Polícia Civil e do Instituto Técnico-Científico de Polícia (ITEP) da cidade. Foram 27 assassinatos (incluindo as mortes ocorridas em ações das forças policiais) nesse período, o que dá uma média de aproximadamente uma morte a cada dois dias, mesmo índice verificado em 2011, o recorde da violência.
Os dados mostram que o maior alvo dos crimes de homicídio são os jovens, a exemplo de inúmeras outras cidades brasileiras. Desses 27 mortos, 20 tinham 25 anos ou menos. Se o recorte for abaixo dos 20, a pesquisa mostra que 15 - mais da metade - estão nessa faixa. Os gêmeos Geovan e Jean Oliveira Almeida, por exemplo, ambos com 15 anos, fazem parte daqueles que nem conseguiram atingir a maioridade. Os dois e mais seis foram assassinados antes dos 18 anos. Os irmãos foram arrancados dentro da própria casa por homens encapuzados e executados com vários tiros, sem defesa.
Os dois irmãos, no entanto, não estão na área geograficamente mais violenta da cidade, com base na pesquisa feita pelo DE FATO. Eles moravam na zona leste de Mossoró, de onde saíram cinco vítimas. A área mais violenta da cidade, a exemplo de outros anos, é a zona norte, onde residiam quase 50% das pessoas. Só do norte, as baixas representam 13 casos. A zona oeste teve seis mortes, o que equivale a 22,2%. O local menos violento, até então, é a zona sul, que noutros anos figurou entre os mais violentos devido à rixa entre gangues rivais. Nessa área foram registrados apenas dois assassinatos.
A reportagem pesquisou também a vida pregressa das vítimas de homicídio neste ano e verificou que apenas 37% deles respondiam processos em primeira instância na Justiça do Rio Grande do Norte. Os dados foram fornecidos pelo Tribunal de Justiça do RN, a partir do nome de cada uma das vítimas. É possível, no entanto, que o número de vítimas envolvidas com o mundo do crime seja ainda maior. No caso de um deles estar sendo investigado na Polícia Civil, por exemplo, o nome não apareceria na pesquisa do TJ/RN. Esse é o caso de Romário Alves Rodrigues, que tinha 21 anos.
Ele morreu durante uma operação realizada por policiais militares no fim do mês passado. Seu nome não consta no Tribunal de Justiça (é preciso que ele seja indiciado pela Polícia Civil e denunciado pelo Ministério Público Estadual), mas ele era investigado pela equipe da Primeira Delegacia de Polícia Civil. Romário era acusado de matar Antônio Fábio do Nascimento. O crime aconteceu no dia 3 de dezembro de 2011, na favela do Cachorro Assado (zona leste). Diferente de Romário, Kerginaldo Pereira Moreno Júnior, morto em fevereiro, é citado no TJ. Ele foi condenado por latrocínio.
Delegacia concentra 60% dos assassinatos
A Primeira Delegacia de Polícia Civil, situada no bairro Alto de São Manoel (zona oeste), é responsável por quase 60% das investigações dos crimes de homicídio ocorridos neste ano, em Mossoró. Além dela, outras três podem investigar esse tipo de ocorrência.
Dos 27 homicídios, 16 estão sendo investigados por essa equipe, o que significa uma sobrecarga de atividades. A divisão de quem investiga o quê é feita a partir de critérios regionais e algumas especificidades.
A cidade é dividida em duas áreas, a partir da Avenida Rio Branco. De um lado investiga a I DP e do outro a Segunda Delegacia de Polícia Civil. Se o assassinato tiver sido cometido por um adolescente, o caso passa para a Delegacia Especializada no Adolescente (DEA).
Se for cometido contra uma mulher (tanto faz o autor ser adolescente ou não), o inquérito fica sob a responsabilidade da Delegacia Especializada na Defesa e Amparo da Mulher.
É possível ainda que a investigação seja conduzida por uma quinta delegacia, a Especializada em Furtos e Roubos (DEFUR). Nesse caso, a morte deve ser praticada durante um assalto, o que vira latrocínio.
O delegado Francisco Edvan Queiroz, que responde pela I DP, frisa que o maior entrave é a grande quantidade de atribuições da sua unidade, que além dos homicídios investiga diversos outros tipos de casos, como acidentes de trânsito etc.
"A falta de exclusividade é a maior dificuldade. Atrapalha muito termos que parar de investigar um assassinato para apurar crimes de menor gravidade, como calúnia, ameaça, embriaguez ao volante, confusão de vizinho... São muitas coisas que chegam todos os dias nas delegacias distritais. Isso precisa ser administrado, investigando os homicídios e acompanhando esses outros casos", explica Edvan Queiroz.
"O importante hoje é dar exclusividade a uma investigação. É o mesmo que você ter uma atividade e se dedicar só a ela. Se você tem dez homicídios e se dedica só a eles, a possibilidade de descobrir todos é bem maior. O ideal é que esses crimes sejam investigados no calor do fato, que é quando as testemunhas falam e nos ajudam. Se essa investigação não acompanhar os crimes, fica mais difícil porque depois as pessoas não querem mais falar", complementa o delegado.
Fonte: Defato
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