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terça-feira, outubro 03, 2023

Em voto, Barroso diz que governo deve elaborar plano de combate a violações no sistema carcerário

O presidente do STF, Luís Roberto Barroso — Foto: Jornal Nacional/ Reprodução

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, votou nesta terça-feira (3) para que a Corte declare que há um "estado de coisas inconstitucional" no sistema carcerário brasileiro.


Se a tese prosperar, o tribunal vai reconhecer que há violação sistemática e massiva de direitos dos presos. Poderá, então, estabelecer que o Poder Público tome providências.


O voto do ministro é o segundo na análise do mérito de uma ação do PSOL sobre o tema (veja mais detalhes aqui), que teve o julgamento retomado hoje.


O relator, Marco Aurélio Mello (ministro aposentado), já tinha apresentado voto, também na linha do reconhecimento da violação de direitos. Os demais ministros da Corte ainda vão apresentar suas posições.



Planos de enfrentamento a violações

Barroso votou para que seja determinado aos governos federal e estaduais a elaboração de planos de intervenção no sistema prisional.


O magistrado propôs prazo de seis meses para a elaboração do plano nacional, que terá a participação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).


O prazo começa a contar com a publicação da decisão. E o plano nacional – que passará por validação do Supremo e monitoramento do CNJ – será executado em um cronograma de três anos.


Os planos estaduais e distrital serão sugeridos em até seis meses, após a homologação do cronograma nacional.


Os planos dos governos deverão contar com medidas, como:


controle de superlotação das prisões, por meio de mutirões que examinem processos de execução de pena

aprimoramento da infraestrutura dos presídios

programas de ensino à distância nas penitenciárias

propostas de compensação por cumprimento de pena por regime mais gravoso

Barroso também estabeleceu que juízes e tribunais de instâncias inferiores devem:


ser obrigados a justificar porque não optaram por medidas cautelares quando determinam ou mantêm prisões provisórias

fixar penas alternativas à prisão, quando possível

levar em conta o quadro do sistema penitenciário no momento de concessão, aplicação da pena e execução penal


Também determinou que sejam realizadas audiências de custódia no prazo de 24 horas, contadas no momento da prisão, preferencialmente de forma presencial. E que recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) sejam liberados.


O voto de Barroso é o segundo na análise do mérito (conteúdo) da ação. O relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello (aposentado), também tinha votado pelo "estado de coisas inconstitucional".


Em relação ao voto do relator, o presidente do Supremo propôs um prazo maior para os planos, a participação do CNJ na elaboração da proposta e a necessidade de homologação pelo STF, além do monitoramento do cumprimento pelo CNJ.


Voto

O ministro apresentou seu voto na retomada do julgamento da ação do PSOL sobre o tema, que pede que o tribunal reconheça que há um "estado de coisas inconstitucional" no sistema carcerário do país.


No começo do voto, o presidente do Supremo apresentou dados sobre a situação do sistema prisional do país.


Argumentou que, entre 2009 e 2019, houve aumento de 59,61% da população carcerária. Ao mesmo tempo, um crescimento proporcional de vagas, de 58,99%. Mas, no mesmo período, o déficit de vagas subiu de 194 mil para 312 mil.


"O país vem apresentando um crescimento exponencial de suas taxas de encarceramento [...]. A superlotação compromete o funcionamento de todos os demais serviços prestados aos presos", disse o presidente do STF.



Barroso ressaltou ainda a necessidade de que sejam atendidos os direitos dos detentos.


"Há duas razões essenciais para dar atenção aos direitos dos presos: a primeira, ligada ao respeito aos direitos fundamentais protegidos pela Constituição e por outros diplomas. E a segunda, relacionada ao impacto que o sistema prisional produz sobre a sociedade em geral", declarou.


Histórico

O pedido foi apresentado pelo PSOL em maio de 2015. O partido questionou, no tribunal, a situação das penitenciárias e prisões pelo Brasil. Para a sigla, vários direitos fundamentais dos detentos são violados sistematicamente e de forma frequente no sistema prisional brasileiro.


"Não existe mais grave violação a direitos do que a que se pratica sistematicamente no sistema prisional do país", afirmam os autores da ação.



"As prisões brasileiras são, em geral, verdadeiros infernos dantescos, com celas superlotadas, imundas e insalubres, proliferação de doenças infectocontagiosas, comida intragável, temperaturas extremas, falta de água potável e de produtos higiênicos básicos. Homicídios, espancamentos, tortura e violência sexual contra os presos são frequentes, praticadas por outros detentos ou por agentes do próprio Estado", completam.


Com isso, entende o partido, está caracterizado o "estado de coisas inconstitucional".


O "estado de coisas inconstitucional" surgiu a partir de decisões da Corte Constitucional Colombiana. Ele é caracterizado por uma violação massiva, sistemática e generalizada de direitos fundamentais, com potencial para atingir um grande número de pessoas.


Quando identificado, permite que o Judiciário determine ao Poder Público a adoção de medidas, que terão a implementação monitorada. Neste caso, não há interferência ou retirada de competências de outro Poder, mas uma determinação judicial de providências de forma a garantir que a Constituição seja cumprida.


Decisão inicial

Em setembro de 2015, em uma decisão inicial, no começo do processo, a Corte atendeu em parte às demandas dos autores.


Determinou, por exemplo:


que a Justiça realizasse audiências de custódia para analisar a regularidade da prisão;

que o governo federal liberasse todo o saldo acumulado no Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), destinado à construção e reforma de presídios. Além disso, a Corte proibiu novos contingenciamentos da verba.


Em 2021, a Corte começou a analisar o mérito da ação, ou seja, o conteúdo, com o objetivo de dar uma solução definitiva para o caso. Mas o julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso. Agora, o caso volta à pauta a partir do voto dele.


Os ministros vão analisar a proposta dos autores para que seja determinado aos governos federal e estaduais a elaboração de um plano com medidas para:


reduzir a superlotação dos presídios; diminuição do número de presos provisórios;

realizar providências para garantir condições de higiene, conforto e segurança aos detentos;

fazer a separação dos presos de acordo com critérios como sexo, idade, situação processual e natureza do delito;

garantir assistência material, de segurança, de alimentação adequada, de acesso à justiça, à educação, à assistência médica integral e ao trabalho digno e remunerado para os presos;

realizar a contratação e capacitação de pessoal para as instituições prisionais;

eliminar a tortura, maus tratos e aplicação de penalidades sem o devido processo legal nos estabelecimentos prisionais;

adotar medidas para garantir o tratamento adequado para grupos vulneráveis nas prisões, como mulheres e população LGBT.


Fonte: g1

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