Candidatos que viajavam do Rio de Janeiro ou de Minas Gerais exclusivamente para realizar um exame prático de direção veicular para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) no Departamento de Trânsito (Detran) do Rio Grande do Norte. E, mesmo assim, alguns deles sequer chegavam a entrar no carro para realizar a prova.
Foi o que constatou a Polícia Civil em cerca de seis meses de investigação, que culminou com a operação deflagrada na manhã desta sexta-feira (22), que cumpriu 13 mandados de busca e apreensão e afastou seis servidores do Detran. A investigação apura de fraudes nos exames para emissão da CNH.
"Muitos deles não entravam no veículo, e outros não conseguiam tirar o veículo do lugar ou, então, estancavam o veículo com frequência. Não conseguiam fazer a baliza, esbarravam", disse a delegada Karla Viviane, da Delegacia Especializada no Combate à Corrupção e Defesa do Patrimônio Público (Deccor).
"A gente acompanhou os testes de alguns desses candidatos e viu que de fato eles não tinham condições".
Os suspeitos foram afastados dos cargos e outros proibidos de acessar o órgão. Eles não foram presos. A delegada explicou que medida é mais eficaz do que uma prisão preventiva neste momento, já que eles poderia ficar livres em cerca de 10 dias e voltar a cometer a irregularidade.
Entre os suspeitos investigados, estão um policial militar - que atuava como examinador - e um outro PM que atuava como atravessador, segundo a investigação. A Polícia Militar foi procurada pela Inter TV Cabugi e até a atualização mais recente desta reportagem não respondeu à demanda.
Apenas a prova prática
A percepção da irregularidade teve a colaboração da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que se atentou para candidatos que chegavam de estados do Sudeste apenas para realizar a prova prática no Rio Grande do Norte.
"Muitos candidatos vinham de outros estados, e parte dessa situação chamou a atenção da PRF, veículos com várias pessoas estranhas dentro, que não tinham relações umas com as outras, fazendo um deslocamento muito grande", disse a delegada.
"Do Rio de Janeiro pra Natal, de Minas Gerais para o Rio Grande do Norte, unicamente para fazer essa avaliação prática. E no dia seguinte retornavam para o estado de origem".
Segundo Kala Viviane, titular da Deccor, esse fato chamou a atenção da equipe de investigação, já que as provas teóricas desses candidatos eram feitas nos estados de origem. Apenas a prova prática era realizada no RN.
"A gente começou o trabalho de vigilância, monitoramento percebeu que existia uma facilitação nesse aspecto. O candidato não atendia, não tinha condições de dirigir, não tinha habilidade suficiente, mas mesmo assim ele era inserido no sistema como apto a obter a carteira de motorista".
Os candidatos pagavam aos atravessadores e eram destinados para realizar as provas com examinadores que faziam parte do esquema, segundo apontou a investigação.
'Candidatos agendados eram removidos'
Para que o candidato que viajou de outro estado pudesse fazer a prova no dia combinado, a solução os examinadores que estão sendo investigados era remover o agendamento de outro candidato que faria a prova naquele dia.
"Quando eles chegavam aqui, precisavam agendar o teste pro mesmo dia, ou para um dia próximo", explicou a delegada.
O esquema, segundo a investigação da Deccor, fazia os examinadores arrecadarem cerca de R$ 5 mil por candidato. A investigação vai continuar para apurar mais casos.
O diretor do Detran, Janielson Pereira, disse que o órgão vai abrir um procedimento interno para apurar situações que possam se enquadrar nesse esquema e que os candidatos que tiverem isso comprovado terão suas carteiras de habilitação cassadas.
"Diante dessa operação, vamos aí fixar um marco temporal para fazer esse filtro de pessoas que vieram dos outros estados, que é uma inconformidade, para, daí sim, aplicar a cassação da CNH de forma administrativa", disse o diretor.
"Todas as pessoas que estão envolvidas, que se beneficiaram desse esquema, desse ilícito, terão suas CNHs canceladas, e terão que refazer toda a avaliação de prova prática".
O diretor disse também que em cerca de três dias atualmente a CNH chega pelos Correios e que um endereço foi repassada para a Polícia Civil por receber muitos desses documentos.
Operação
A operação Habilis Facilis cumpriu 13 mandados de busca e afastou das funções públicas seis servidores do Detran. Um dos mandados de busca encontrou R$ 30 mil com um suspeito.
"Não é comum, então diante das investigações do pagamento, que há noticias deles receberem valores para aprovarem os candidatos, é possível que essa quantia tenha origem ilícita.A investigação só mais na frente vai comprovar", pontuou a delegada Karla Viviane.
Um policial militar alvo de um dos mandados de busca e apreensão chegou a ser preso em flagrante, durante a operação, por ter sido encontrado com uma arma de fogo sem registro. Ele foi levado à delegacia e teve fiança arbitrada pelo delegado responsável, segundo a polícia.
Crimes
Os 13 mandados de busca e apreensão determinados pela Justiça foram cumpridos contra servidores do órgão, despachantes e atravessadores. Segundo a polícia, os investigados poderão responder por crimes como corrupção passiva, corrupção ativa e inserção de dados falsos em sistemas da administração pública.
A Justiça também determinou o afastamento de seis examinadores e a restrição de acesso às imediações do Detran de mais cinco pessoas pelo risco de realizarem mais crimes.
Os mandados de busca e apreensão foram cumpridos nas cidades de Natal, Parnamirim, Vera Cruz e Macaíba, no Rio Grande do Norte; além de Nova Iguaçu (RJ) e Rio de Janeiro.
Fonte: g1
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