Mais um desafio para o Rio Grande do Norte se apresentou com os dados trazidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) – Educação, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE): o número de jovens que não estudam e nem trabalham (chamados Geração Nem Nem) aumentou em 12 mil pessoas, atingindo, principalmente os mais pobres, negros e pardos, especialmente mulheres. O Estado é um dos três do País que apresentou crescimento desse público e, desses o que mais aumentou. A quantidade de jovens ‘Nem Nem’ saltou de 214 mil em 2019 para 226 mil em 2022. No recorte entre homens e mulheres, o grupo masculino reduziu em 2 mil pessoas nessa situação, enquanto 15 mil novas mulheres passaram a condição “Nem Nem” durante o período analisado.
Além do RN, Amapá (de 66 mil para 68 mil) e Paraíba (de 282 mil para 284 mil) foram os outros estados com aumento dos “Nem Nem”. A analista do IBGE Denise Guichard, explica que esses resultados vão na contramão do que ocorreu em nível nacional, que reduziu a quantidade desses jovens de 11,2 milhões para 9,8 milhões; e também da região Nordeste, que saiu dos 4 milhões para 3,6 milhões. Segundo ela, estão incluídos jovens entre 15 e 29 anos, fora do ensino formal e do mercado de trabalho. “é um crescimento nos estados do Norte-Nordeste, onde há uma grande população jovem em termos relativos, mas não tem quantidade de oportunidades na mesma proporção. Faltam oportunidades de trabalho”, declara a analista.
Os pretos e pardos são maioria. Em 2019 eram 148 mil, enquanto os brancos somavam 64 mil dos “Nem Nem” no estado. No ano passado, subiu para 158 mil. Os brancos somaram 67 mil.
Um ponto de destaque é como as mulheres se comportaram no período. A quantidade delas aumentou no RN de 130 mil para 145 mil, enquanto o grupo dos homens reduziu de 83 mil para 81 mil. “Afazeres domésticos, cuidados com a família, filhos, acabam levando-as a ficarem fora do mercado de trabalho e dos estudos. Uma outra parcela dentro desse grupo tem formação mas não tem oportunidades”, pontua Denise Guichard.
O professor Anderson Santos, do Instituto de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), analisa que jovens pobres, negros, com pais de baixa escolaridade, que moram nas periferias, são o grupo predominante entre os “Nem-Nem”. “Isso evidência que o problema é agravado pela pobreza e exclusão social. O crescimento da geração 'Nem-Nem' geralmente está ligado, então, à falta de oportunidades”, destaca.
Neste sentido, diz que trata-se de um problema de múltiplas dimensões: “Mercado de trabalho hostil aos menos experientes, com os empregadores exigindo experiência e formação que muitos ainda não têm, além do desigual acesso à educação formal; problemas familiares, como violência doméstica, abusos; desestímulo; e até mesmo escolha do indivíduo de se manter fora do mercado e das instituições de ensino”, cita o professor.
Para a conselheira tutelar, Tatiana Pires, militante do movimento negro e de defesa da mulher, são tantos fatores que nem sempre os governos conseguem lidar com o fenômeno. “Parece um resgate de décadas passadas onde a mulher era colocada apenas como dona de casa. Aí tem o recorte de serem jovens negros e pardos, ou seja, a bola de neve continua desde a escravidão, mudando apenas os atores e o cenário, mas o mesmo sistema. Significa que as políticas públicas implantadas não se baseiam nas mudanças culturais.”
Neste sentido, sugere que políticas afirmativas como a das cotas deveriam ser temporárias, mas para que funcionassem assim, as demais políticas públicas precisariam funcionar. “Com saúde de qualidade, educação de qualidade, habitação... no fim das contas, quando se termina o ensino superior não há políticas profissionalizantes para ingressar no mercado de trabalho”, diz.
Estado e Município apontam iniciativas
As secretarias de Assistência Social e Trabalho do Estado (Sethas/RN) e de Natal (Semtas), reconhecem a preocupação que a “Geração Nem Nem” representa e indicam ações que estão desenvolvendo com foco nesse público.
Em nível municipal, na capital do Estado, o diretor do Departamento de Desenvolvimento e Qualificação Profissional da Semtas, Albany Dutra, relembra que a pandemia da covid-19 também interfere no crescimento da “Geração Nem Nem”, uma vez que as dificuldades do ensino remoto podem ter contribuído para o aumento dos índices de evasão escolar, especialmente na rede pública.
“Para facilitar o acesso dos jovens ao mercado de trabalho, a Semtas tem adotado diversas medidas. Uma delas é a oferta constante de cursos de qualificação profissional, visando profissionalizar cada vez mais pessoas para o mundo do trabalho”, informou o diretor.
Esses cursos são direcionados de acordo com a demanda do mercado e contam com parcerias com instituições como Senai e IFRN para ampliar as opções de formação.
“Outro esforço da pasta, segundo ele, é a intermediação da mão de obra, estabelecendo contatos com empresas para a captação de vagas de emprego e buscando um maior número de empresas parceiras para ampliar as oportunidades de trabalho”, diz.
O Centro de trabalho e empreendedorismo (CMTE) ensina a formular currículos e também faz mediação de alunos dos cursos com empresas que procuram preencher vagas do SINE. “Além disso, a Semtas está ampliando a sua oferta de cursos de qualificação profissional para abranger os jovens, voltados para serviços tecnológicos, atentando-se às necessidades e tendências do mercado atual”, Albany Dutra.
Para fortalecer esse aspecto, a secretaria está lançando um novo edital para a contratação de instrutores, visando proporcionar uma formação qualificada e adequada às demandas do mercado local.
Do Observatório do Trabalho e Políticas Sociais da Sethas/RN, a coordenadora Melayne Macedo chama a atenção para a maioria do público Nem Nem ser de jovens de faixas de renda baixa, especialmente mulheres. “Então é necessário ampliar as políticas de cuidado para que a gente possa também enfrentar, de forma radical, essa situação que a juventude, em especial a juventude negra periférica, enfrenta de falta de perspectiva”, diz.
Neste sentido, conta que uma das medidas é que a pasta está desenvolvendo, junto com a Secretaria de Juventude, um projeto piloto no bairro de Mãe Luíza, em Natal, chamado RN Aprendiz. Trata-se de uma legislação regulamentada pela governadora Fátima Bezerra para que as empresas que prestam serviço ao Estado destinem de 5% a 15% das vagas para jovens, entre 15 e 24 anos, para que tenham a primeira experiência profissional. Na rotina, são quatro dias de prestação de serviço e um dia de formação.
“Pensar nessa estratégia, nesse piloto, está sendo um espaço de co-gestão dessa política nesse exercício de viabilizar estratégias para inserir essa Juventude e para acolher com qualificação e com condições de incidir nos territórios de maior vulnerabilidade da Juventude”, explica Melayne.
Problema público
Doutor e Mestre em Ciências Sociais pela UFRN, o professor Anderson Santos destaca que a “Geração Nem Nem” é considerada um problema público e, como todo problema público, deve ser enfrentado com políticas públicas.
“Algumas medidas importantes são as políticas que incentivam a geração de empregos para os jovens; políticas de acesso e permanência em instituições de ensino; e políticas de ampliação de renda familiar, que dêem um background aos jovens”, sugere.
Outro elemento importante que ele cita é o de propiciar acesso à cultura e ao esporte como meios de integrar os jovens à vida social. “Isso significa que é preciso envolvimento dos municípios, estados, governo federal e mesmo a sociedade civil nessa tarefa”, reforça.
Geração Nem Nem
Dados extraídos da PNAD Contínua - Educação / IBGE
2019
Brasil - 11,228 milhões
Nordeste - 4,069 milhões
RN - 214 mil
2022
Brasil - 9,807 milhões
Nordeste - 3,752 milhões
RN - 226 mil
RN: Geração Nem Nem
2019
Brancos: 64 mil
Pretos e pardos: 148 mil
Homens: 83 mil
Mulheres: 130 mil
2022
Brancos: 67 mil
Pretos e pardos: 158 mil
Homens: 81 mil
Mulheres: 145 mil
Estados que aumentaram Geração Nem Nem
RN: 214 mil para 226 mil
PB: 282 mil para 284
AP: 66 mil para 68 mil
Fonte: Tribuna do Norte
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