O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou pública a análise da Polícia Federal sobre o conteúdo do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Cid está preso desde maio, investigado por adulterar o cartão de vacina de Bolsonaro a favor do ex-presidente.
No celular, foram encontradas trocas de mensagens, inclusive com militares da ativa, a favor de atos golpistas e de um golpe de Estado, com o objetivo de Bolsonaro não entregar o poder para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva(PT).
Documento com instruções golpistas
A PF apontou que Mauro Cid enviou para um contato identificado com o seu próprio nome um documento com instruções para desconstituir instituições democráticas, intitulado "Forças Armadas como poder moderador". O texto sugere declaração de estado de sítio.
A corporação não conseguiu identificar a origem do documento, mas indicou que o arquivo foi criado em 25 de outubro de 2022.
Entre as ações previstas no documento estão:
nomeação de um interventor;
afastamento e abertura de inquéritos contra ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e outras autoridades;
e a fixação de um prazo para novas eleições.
Segundo o arquivo, essas medidas poderiam ser tomadas após autorização do presidente da República, à época Jair Bolsonaro.
O documento mantido por Cid em seu celular também diz que há um "desmedido ativismo judicial" e critica ministros do STF e do TSE, dizendo que eles teriam sido responsáveis por "atos com violação da prerrogativa de outros Poderes".
A Polícia Federal destacou que o "conteúdo do texto chamou a atenção da equipe, pois apresenta em seu parágrafo final a expressão 'declaro o Estado de Sítio; e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem (...)'".
Militar pede ação de Cid com Bolsonaro
O ex-auxiliar de Bolsonaro também manteve conversas com militares sobre possíveis ações golpistas.
Em dezembro, o coronel Jean Lawand Junior, então gerente de ordens do Alto Comando do Exército (ACE), clama por intervenção de Cid junto a Bolsonaro, em uma tentativa de o auxiliar convencer o chefe pela tomada autoritária de poder.
"Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer. Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso. O presidente vai ser preso. E, pior, na Papuda, cara", afirmou Lawand Junior em um áudio a Cid, em 1º de dezembro de 2022.
Cid respondeu: "Mas o PR [Presidente da República] não pode dar uma ordem...se ele não confia no ACE". A sigla ACE é uma referência ao Alto Comando do Exército.
A PF também destacou outra mensagem de Lawand a Cid.
Em dezembro passado, ele voltou a pedir para Cid convencer Bolsonaro: "Cid pelo amor de Deus, o homem tem que dar a ordem. Se a cúpula do EB [Exército Brasileiro] não está com ele, de Divisão pra baixo está".
"Muita coisa acontecendo...Passo a passo", respondeu o ex-ajudante de Bolsonaro.
A última troca de mensagens entre os dois ocorreu no dia 21 de dezembro de 2022.
Jean Lawand Junior escreveu: "Soube agora que não vai sair nada. Decepção irmão. Entregamos o país aos bandidos". Cid respondeu: "Infelizmente".
Participação em grupo com militares
O relatório sobre o celular apreendido de Cid também aponta que ele participou de um grupo de mensagens com pessoas que se identificavam como militares da ativa.
"Evidenciou-se que em diversos momentos dos diálogos foram tratados assuntos relacionados ao cenário político-eleitoral que sucedeu o segundo turno das eleições presidenciais", diz a PF.
Participantes defendem manifestações antidemocráticas e golpe de Estado.
"Se o Bolsonaro acionar o 142 [artigo da Constituição que regulamenta a atuação das Forças Armadas], não haverá general que segure as tropas. Ou participa ou pede para sair!!!", escreveu um membro em 21 de dezembro de 2022.
Há ainda registros de participantes que criticavam o comando das Forças Armadas, além de críticas em alusão ao ministro Alexandre de Moraes. "Vai ter careca arrastado por blindado em Brasília?", afirmou outro membro em novembro passado.
Segundo a Polícia Federal, Mauro Cid destacou trechos de uma apresentação, identificada como da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, que tratam do emprego das operações de garantia da lei e da ordem (GLO), em especial na "Garantia dos Poderes Constitucionais".
O emprego da GLO foi uma das possibilidades aventadas por apoiadores de Jair Bolsonaro para impedir a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Juristas, porém, afirmam que não há previsão constitucional para isso.
A PF também encontrou no celular de Cid respostas do jurista Ives Gandra Martins a uma consulta feita por um major do Exército sobre o emprego das Forças Armadas como o "poder moderador". Gandra é utilizado por defensores de Bolsonaro por apoiar a tese.
Nas respostas às questões, ele defende a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal dá às Forças o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de "inimigo externo ou crise entre poderes".
Essa tese, entretanto, já foi refutada por juristas de diversas tendências, como o ministro Joseli Camelo, presidente do Supremo Tribunal Militar (STM), ministros do STF e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Sargento participou dos atos
No celular de Mauro Cid, a Polícia Federal também encontrou uma conversa com outro ex-assessor de Bolsonaro Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército, sobre manifestações de cunho golpista em frente ao Quartel do Exército de Goiânia (GO).
Dos Reis foi um dos presos pela PF na operação que apura fraude em cartões de vacina do ex-presidente e ajudantes, em maio.
À época, Cid estava cotado para assumir o comando do Batalhão de Ações e Comandos de Goiânia, uma unidade de Operações Especiais da Força.
A posse, no entanto, foi suspensa pelo novo comandante do Exército, Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
"Ao ser questionado sobre a manifestação Mauro Cid diz: 'Mais fácil eu ajudar os caras do que tirar de lá'", destacou a PF.
A corporação também identificou que Luís Marcos dos Reis participou dos atos golpistas de 8 de janeiro e chegou a subir na cúpula do Congresso. Além disso, Dos Reis também esteve no acampamento no Quartel-General do Exército em Brasília e incentivou a "tomada de poder pelas Forças Armadas".
No relatório, a polícia também destacou que o sargento enviou vídeos e imagens com a participação dele nas invasões às sedes dos Três Poderes.
"Eu estou no meio da muvuca! Não sei o que está acontecendo! O bicho vai pegar!", escreveu em uma das mensagens.
Em seguida, o sargento enviou um áudio, na mesma troca de mensagens, que dizia: "Entraram no Planalto, no Congresso, Câmara dos Deputados, entrou no STF. E quebrou, arrancou as togas lá daqueles ladrão (sic). Arrancou tudo! Foi, foi. O bicho pegou hoje aqui!".
Mais tarde, por volta de 20h, ele afirmou que já estava em casa e que trabalharia cedo no dia seguinte, mas que "o recado foi dado".
Esposa de Cid conversa sobre atos
No relatório, a Polícia Federal também abordou troca de mensagens da esposa de Mauro Cid, Gabriela Cid.
"As mensagens tratam, basicamente, sobre manifestações ocorridas em frentes aos quarteis do Exército em todo Brasil além da manifestação ocorrida na Esplanada dos Ministérios em Brasília no dia 8 de janeiro de 2023", disse a PF.
Em uma conversa com Ticiana Villas Bôas, Gabriela defende "novas eleições". À época, Lula já havia sido eleito.
"Temos q (sic) exigir novas eleições c (sic) voto impresso. Estamos diante de um momento tenso onde temos q (sic) pressionar o Congresso. Agora!!!!!!", escreveu.
"Ou isso, ou a queda do [ministro Alexandre de] Moraes", responde Ticiana.
Fonte: g1
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