Em queda nos últimos cinco anos, o gasto público com educação atingiu em 2021 o menor patamar desde 2012, segundo estudo divulgado na semana passada pela organização não governamental Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
Em 2021, o valor das despesas autorizadas em educação (R$ 129,8 bilhões) foi cerca de R$ 3 bilhões superior ao de 2020 (R$ 126,9 bilhões). Mas a execução financeira foi menor (R$ 118,4 bilhões), indica o estudo (os valores, obtidos no Portal Siga Brasil, do orçamento federal, foram corrigidos pela inflação).
Segundo o Inesc, entre 2019 e 2021, a execução diminuiu R$ 8 bilhões em termos reais (de R$ 126,6 bilhões para R$ 118,4 bilhões).
Para 2022, o instituto observa que o valor autorizado para educação (R$ 123,7 bilhões) é R$ 6,2 bilhões menor que a verba de 2021 (R$ 129,8 bilhões).
A autorização para gastos é diferente da despesa propriamente dita, que tem ficado abaixo do valor previsto no orçamento no início de cada ano.
"Como se pode constatar, não há luz no final do túnel nem mesmo no último ano de governo, visto que os recursos para a função educação continuam em queda", diz o estudo.
O g1 entrou em contato com o Ministério da Economia, com a Secretaria do Tesouro Nacional e com o Ministério da Educação. Questionou se não seriam necessários mais recursos para as políticas educacionais, diante da necessidade de melhor formação do capital humano no país, mas não obteve resposta. A área econômica informou somente que o tema é de responsabilidade do Ministério da Educação.
A União atua principalmente no ensino superior. Os estados, em parceria com os municípios, são responsáveis por ações no ensino fundamental e médio. Além da arrecadação própria, estados e municípios também recebem repasses de recursos do governo federal.
A redução de recursos para o setor coincide com a vigência da regra do teto de gastos, que teve início em 2017, pela qual a maior parte das despesas é limitada pela variação da inflação do ano anterior, inclusive os gastos livres com educação.
Parte desses gastos, porém, está fora do teto, como o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), com novas regras, aprovadas no fim de 2020 — que estabelecem um aumento gradativo da contribuição do governo federal.
Plano Nacional de Educação
Com a queda nas despesas em educação, o Inesc observa que parte da metas do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pelo Congresso Nacional em 2014, ainda não foi cumprida.
O plano prevê a ampliação do investimento público em educação em até 7% do Produto Interno Bruto (PIB) no quinto ano de vigência da lei e em 10% até 2024.
O PNE também fixa 20 metas para os governos federal, estaduais e municipais em todas as etapas de ensino, além da formação de professores.
Há objetivos de erradicação do analfabetismo e universalização da educação infantil (crianças de 4 e 5 anos), do ensino fundamental (6 a 14 anos) e do ensino médio (15 a 17 anos).
A oferta de educação infantil em creches, pelo PNE, deveria ser ampliada de forma a atender mínimo de 50% das crianças de até 3 anos. Ao final dos dez anos de vigência do PNE, os brasileiros deveriam ser alfabetizados, no máximo, até os 6 anos.
"A começar pelo financiamento, que, conforme assinalado, deveria estar em 7% do Produto Interno Bruto (PIB) desde 2019 e alcançar 10% em 2024, no entanto, a realidade é 5,6% [do PIB], distante da meta intermediária", informou o Inesc.
FNDE em alta
Os números mostram, porém, aumento de recursos para Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável por políticas fundamentais como a aquisição de livros didáticos, transporte escolar, alimentação escolar, entre outros.
Em 2021, foram gastos R$ 34,9 bilhões, contra R$ 29,7 bilhões em 2020 e R$ 29,8 bilhões em 2019.
O FNDE está no centro das denúncias de supostas irregularidades na liberação de verbas, que vieram à tona nas últimas semanas.
Há denúncias de sobrepreço de R$ 700 milhões na licitação de ônibus escolares, e de influência de pastores no repasse de recursos para construção de escolas. O caso levou à exoneração de Milton Ribeiro do Ministério da Educação no final de março.
O Inesc observa que o recuo de gastos em 2020 está relacionado com a pandemia da Covid-19, que gerou suspensão de aulas, e, consequentemente, do transporte escolar no país. E observa que o orçamento para transporte escolar subiu em 2021, atingindo R$ 331 milhões, contra R$ 202 milhões em 2020, mas que ainda ficou distante do valor gasto em 2019, quando somou R$ 588 milhões.
"Com o retorno das aulas presenciais [em 2021], vários lugares ainda estão sem o serviço, impossibilitando que muitos estudantes acessem as escolas. No entanto, o programa que garante novos veículos, como o Caminho da Escola, vem perdendo recursos e chegou a 2022 com parcos R$ 17 milhões, o que equivale a 3% do que foi autorizado em 2019", avaliou o instituto.
Segundo a entidade, a ação que prevê melhoria da infraestrutura das escolas tem tido "execução irrisória", com R$ 460 milhões gastos (após a autorização para R$ 955 milhões em despesas).
"O que se vê nos noticiários são salas lotadas, sem ventilação adequada", diz o estudo.
Ensino superior
De acordo com os dados compilados pelo Inesc, a educação superior, de responsabilidade da União, também tem sido atingida pela redução dos gastos.
Em 2021, os valores (corrigidos pela inflação, comparação considerada mais adequada por especialistas) são os menores em nove anos.
Para a entidade, o ensino superior em geral — e as universidades, em particular — tem sido atacado sistematicamente ao longo dos anos de governo Bolsonaro.
O corte de recursos impediu, segundo o estudo, o aumento das matrículas, a substituição de professores que se aposentaram, a manutenção e ampliação dos espaços, a manutenção e ampliação dos projetos de pesquisa e as bolsas para a pós-graduação.
"Seja com ameaças à pesquisa e à ciência, seja com cortes de recursos, há um projeto político para enfraquecimento dessas instituições, tentando descredenciá-las como vozes importantes em vários setores da vida, tais como a crise sanitária, que demonstrou o quanto é relevante para um país ter instituições como o Instituto Butantã e a Fiocruz, que abasteceram o país com parte das vacinas ofertadas à população", avaliou o Inesc.
Fonte: g1