A Câmara Municipal do Rio de Janeiro cassou, nesta quinta-feira (18) à noite, o mandato do vereador Gabriel Monteiro (PL) por quebra de decoro parlamentar. O ex-policial militar e youtuber é acusado por suspeita de assédio sexual, forjar vídeos na internet e de estupro de vulnerável.
Dos 50 votos possíveis na Câmara, 48 foram pela casssação de Gabriel, e dois pela não. Esses votos couberam ao próprio Gabriel e ao vereador Chagas Bola.
O resultado quase unânime já se desenhava no momento em que as bancadas dos partidos orientavam o voto de seus representantes e todos foram a favor da cassação.
A sessão que determinou a cassação do mandato do vereador Gabriel Monteiro (PL), por quebra de decoro, teve início às 16h desta quinta-feira (18) no plenário da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro e terminou às 22h23 com a votação e consequente cassação do mandato.
Gabriel Monteiro foi investigado no Conselho de Ética da Câmara por acusações de assédio sexual, forjar vídeos na internet e de estupro de vulnerável, por filmar relações com menor de idade, o que é crime previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Gabriel Monteiro já é réu na Justiça por isso.
Na quarta (17), dia em que seu recurso foi negado na Comissão de Justiça e Redação e a votação da cassação determinada, um novo áudio que Gabriel Monteiro teria admitido sexo com menores foi divulgado.
Torcida organizada e gritos de guerra
O clima nas galerias da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro durante a sessão para a cassação de Gabriel Monteiro nesta quinta-feira (18) estava semelhante ao de um estádio de futebol, com torcidas prós e contrárias ao youtuber.
Faixas e cartazes foram colocadas no local para manifestar a opinião das galerias. Do lado dos apoiadores de Gabriel, faixas como "Gabriel Monteiro guerreiro brasileiro" e "Contra a máfia do reboque" podiam ser lidas. Já o lado dos manifestantes a favor da cassação de Gabriel Monteiro, uma grande faixa dizia: "Vereadores, imaginem se fosse a filha de vocês".
Assim que os vereadores começaram a falar, gritos de guerra começaram a ser entoados: "Não tem caô, estuprador não pode ser vereador", “Fora, estuprador” , "Ão, ão, ão, vai sair de camburão" e “Ou, ou, ou, é o melhor vereador”.
Comentários antes da votação
O vereador Chico Alencar (Psol), relator do processo que investigou Gabriel Monteiro no Conselho de Ética da Câmara, foi o primeiro parlamentar a se manifestar no plenário. Chico Alencar leu parte do relatório aprovado pelo conselho. O documento pede a cassação do mandato de Gabriel Monteiro.
As galerias da Câmara Municipal estavam cheias durante a leitura do relatório final. Em vários momentos, apoiadores de Gabriel Monteiro vaiaram o relator do processo. O presidente da Casa precisou intervir e pedir silêncio aos manifestantes.
"É um dever de todos os vereadores e vereadoras dessa Casa de leis dar uma resolução para esse caso. (...) Mais do que o discurso, o que vale é o voto. Esse é um momento histórico e gritos histéricos não vão interrompê-lo. A não aprovação do projeto que determina a perda do mandado do vereador Gabriel Monteiro seria uma contribuição para a perpetuação da cultura do estupro e do patriarcado presente em nosso estado. Urge fazer justiça", comentou Chico Alencar.
"Diante das provas e do tudo que se afirmou até aqui restou fartamente demonstrado que o vereador Gabriel Monteiro praticou ou ordenou que se praticasse atos deploráveis e inteiramente incompatíveis com o decoro que se espera de um vereador da Câmara de Vereadores do Rio", completou o relator.
A vereadora Laura Carneiro (PSD) utilizou seu tempo de fala no plenário para dizer que foi seguida por pessoas ligadas ao vereador Gabriel Monteiro.
"Eu estava sendo tocaiada. A ordem era investigar a vereadora Laura Carneiro, que na época era secretaria de assistência social. Eu fiquei chocada, seguir e tocaiar a vereadora Laura Carneiro era uma tentativa de intimidação", comentou Laura Carneiro.
A vereadora também lembrou de uma vistoria realizada pelo vereador Gabriel Monteiro. Segundo ela, a conduta do vereador foi ilegal por tentar visitar um abrigo de crianças de 0 a 3 anos depois das 18h. Além disso, Laura Carneiro acusou o vereador de manipular as informações para montar um vídeo publicado em suas redes sociais.
"No dia que invadiram com 13 pessoas o abrigo do Taiguara (abrigo para menores), eu liguei para a polícia porque era determinação dos juízes. Foi lá um tenente fazer o papel dele de policial. Sabe o que aconteceu com ele? O vereador fez uma representação contra ele. Ou seja, não interessa a conduta do servidor, do policial ou os serviços para as crianças. Só interessava o vídeo do dia seguinte", completou Laura Carneiro.
Em seguida, a vereadora Tainá de Paula (PT) também lembrou que a função de vereador não pode servir como base para produzir vídeos e ganhar dinheiro na internet.
"Não fomos eleitas para ganhar dinheiro com a atividade parlamentar. Isso é abjeto, é amoral e precisamos refletir sobre isso. Dentre os vídeos (investigados) existe a manipulação de uma criança. Eu não vou me aprofundar aqui sobre se ouve ou não abuso. Mas nós temos responsabilidade pública sobre as crianças do Rio de Janeiro. E o vídeo é claro", disse Tainá.
Já o vereador Felipe Michel (Progressistas) lembrou que sempre apoiou o trabalho desenvolvido por Gabriel Monteiro no parlamento carioca. Contudo, segundo ele, as investigações do Conselho de Ética não deixam dúvidas sobre a decisão de cassar o mandato do vereador.
“Não estamos aqui para passar a mão na cabeça de ninguém. Sempre tratei ele com carinho e com afeto. Eu olho como se fosse um filho. Mas se meu filho errar não tem como passar a mão na cabeça. Tem que pagar por isso. A palavra de Deus é bem clara. Quem nunca errou que atire a primeira pedra. Vá e não peque mais. Tudo na vida tem um preço. Quando a gente erra paga um preço por isso”, comentou Felipe Michel.
"Eu gosto dele e vou continuar gostando. Até esse exato momento, como um pai fala para um filho, por tudo que vejo até aqui, por tudo que eu vi, pelas duas filhas que eu tenho em casa, é uma situação que para mim é insustentável. Como vereadores aqui hoje, é impossível eu votar contra o conselho de ética", afirmou.
'É o vale tudo da monetização', diz vereador
Entre os nove vereadores que pediram para usar a palavra antes da votação, a maioria criticou o fato de Gabriel utilizar o mandato como vereador para produzir vídeos para o seu canal no Youtube e ganhar dinheiro com essa atividade.
Entre eles, o vereador Celso Costa (Republicanos) lembrou que também foi vítima da manipulação coordenada por Gabriel Monteiro. Segundo ele, Monteiro editou suas falas em um vídeo sobre uma visita a um abrigo da prefeitura.
"O senhor editou as minhas falas e jogou nas suas redes sociais. É o vale tudo da monetização. Tudo para colocar dinheiro no bolso. Você não respeitou um colega. E também não respeitou o presidente dessa casa. O senho divulgou uma fake news dizendo que o presidente estava proibindo o senhor de fiscalizar", comentou.
Celso Costa também comentou sobre o vídeo que mostra um homem em situação de rua sendo orientado a simular o furto de uma bolsa na Lapa, no Centro do Rio. Depois de fazer isso, o homem foi abordado pelo vereador Gabriel Monteiro, que o questionou pelo ato. Segundo o vereador, a atitude de Gabriel nesse caso foi vergonhosa.
"Eu não vou citar aqui as acusações de pedofilia, abuso sexual e assédio moral, mas vossa excelência se aproveitar das condições de um morador de rua, passando necessidades, passando fome, para manipular imagens. E tudo para que vossa excelência colocasse dinheiro no bolso, para bancar suas condições de vida no Condomínio Mansões na Barra da Tijuca. Isso é uma vergonha. Isso não se faz", comentou Celso Costa.
Na opinião da vereadora Mônica Benício (Psol), será uma vergonha se o mandato de Gabriel Monteiro não for cassado nesta quinta-feira.
“Acusação de assédio, estupro e de gravar vídeo com cenas sexuais com menores. Se isso não é vergonha, sinceramente eu não sei o que é. Vergonha é se essa casa não decidir pela cassação do Gabriel Monteiro", disse Benício.
Defesa alega falta de provas
Com duas horas para apresentar suas alegações, antes do início da votação em plenário, o advogado Sandro Figueiredo, responsável pela defesa de Gabriel Monteiro, repetiu muitos dos argumentos que estavam no documento de 47 páginas que foi apresentado em sua defesa no processo ético-disciplinar do Conselho de Ética da Câmara.
Em determinado momento, Sandro Figueiredo disse que o Conselho de Ética não garantiu o direito a ampla defesa do acusado. De acordo com Sandro, o processo contra Gabriel só existiu porque o vereador deu voz de prisão para os chefes, segundo ele, da "máfia do reboque".
Sobre a acusação de que o vereador teria filmado relações sexuais com uma adolescente, o advogado disse no plenário que seu cliente não sabia que a jovem seria menor de idade.
Sandro Figueiredo alegou que Gabriel e a jovem se conheceram através de uma rede social e que ela dizia em seu perfil ter 18 anos.
"A jovem contou que começou a conversar com o Gabriel pelo Instagram e no Instagram dela diz o seguinte 'since 2003'. Ela afirmava que tinha 18 anos de idade, ela afirmava pelo Instagram. Ele conversou com ela pelo Instagram. Em outro trecho do depoimento dela diz: 'Gabriel uma vez me perguntou a minha idade e eu disse que tinha 18 anos'. Por isso que eu digo: vale o que ta escrito", comentou Sandro.
Após negar que o vereador soubesse a idade da jovem, o advogado de Gabriel disse que ela autorizou a filmagem do ato sexual.
"O vereador teve sim relações sexuais. Ela afirmou em seu depoimento que autorizou a filmagem do ato sexual. Mas ela, uma maior de idade, autorizou. É um erro de tipo. Um erro de tipo exclui a culpa. E assim o fato se torna atípico. Está provado nos autos que o vereador Gabriel não tinha conhecimento que ela tinha 15 anos. Ela afirmou que tinha 18 anos", completou Sandro.
Em seguida, o advogado defendeu Gabriel Monteiro das acusações de violação de direitos de uma criança que aparece em um vídeo do político publicado na internet.
Na gravação, o vereador leva uma criança para fazer compras em um shopping. Gabriel é investigado por, supostamente, induzir respostas da criança para a filmagem.
"A menina do shopping, que disseram que ele assediou, ela estava aqui na galeria da Câmara com a mãe. Ela afirmou em seu depoimento que Gabriel Monteiro foi o único que fez uma vaquinha que rendeu entre R$ 70 mil e R$ 80 mil. Para quem não tinha o que comer em casa. Ela falou no depoimento dela que Gabriel Monteiro mudou a vida da família", comentou o advogado.
Sobre as acusações de manipulação dos vídeos publicados no perfil de Gabriel Monteiro, o advogado de defesa admitiu que as manipulações foram "necessárias".
"É pisotear a inteligência dos vereadores dessa casa dizer que ele manipulou vídeos. Todo mundo que trabalha com rede social faz isso o tempo inteiro. Foi necessário. Porque tanto a menina do salão, como a menina do shopping, receberam cerca de R$ 80 mil. Então é claro que o vídeo tem que ser manipulado para aquele que vai colaborar com a vaquinha, que ele possa ofertar", comentou Sandro Figueiredo.
Gabriel nega acusações
Dentro do tempo reservado para sua defesa, Gabriel Monteiro também decidiu se manifestar. O vereador negou todas as acusações.
"Antes mesmo de me defender eu vou me acusar. Poucas pessoas aqui me conhecem de fato, quem é o Gabriel Luiz Monteiro de Oliveira. Eu não sou essa pessoa ruim, que está gravando vídeo fazendo chacota", disse Gabriel.
"Tirar meu mandado é decretar minha morte, porque por mais que seja estranho se autoelogiar, eu acho que sou uma pessoa do bem. Talvez decretar minha morte política não seja bom para os senhores e para o Rio de Janeiro", disse.
"Hoje é a minha cabeça, amanhã é a dos senhores", completou o vereador.
Jairirinho foi o primeiro
Essa será a segunda vez na história que a Câmara do Rio votará a cassação do mandato de um parlamentar.
A primeira foi em junho, quando, por unanimidade, os 49 vereadores presentes decidiram destituir do cargo o então vereador doutor Jairinho, preso acusado de matar o enteado.
Relembre o caso
Ex-funcionários do vereador Gabriel Monteiro relataram episódios de assédio moral e sexual, agressões físicas e afirmaram que alguns de seus vídeos postados em redes sociais foram forjados.
As denúncias foram feitas em uma reportagem do Fantástico, exibida no dia 27 de março. No mês seguinte, a TV Globo teve acesso a novas denúncias de estupro contra o parlamentar. Três mulheres diferentes, com histórias parecidas de relacionamentos consentidos que acabaram em violência.
Em maio, o vereador Gabriel Monteiro passou à condição de réu depois que a Justiça aceitou a denúncia feita em abril pelo Ministério Público (MPRJ) por filmagem feita por ele de relações sexuais com uma adolescente.
O MP narra que os dois trocaram mensagens e que, em determinado momento, Gabriel convidou a adolescente para ir à mansão dele, num condomínio de luxo na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio.
Também de acordo com a promotoria, passados cinco meses desde o primeiro encontro, o parlamentar usou o próprio celular para filmar a adolescente enquanto eles tinham relações sexuais.
Ainda em abril, Gabriel Monteiro foi alvo de uma operação da Polícia Civil para investigar justamente o vazamento de vídeos íntimos com uma adolescente.
Réu em outro processo
No final de junho, o MPRJ também denunciou o vereador por importunação sexual e assédio sexual. No dia 5 de julho, a Justiça aceitou a denúncia e Gabriel também se tornou réu nesse processo.
Nesse caso, a investigação apurava os possíveis crimes de assédio sexual e importunação sexual contra a ex-assessora do parlamentar Luiza Caroline Bezerra Batista, de 26 anos.
Na denúncia, a promotora Lenita Machado Tedesco cita que a ex-assessora era constantemente constrangida a participar de vídeos modificados, "não podendo deles reclamar", uma vez que era ameaçada de demissão.
O que diz a defesa do vereador
Em nota, a defesa do vereador Gabriel Monteiro afirmou que vai continuar aguerrida e, amanhã (quinta), por certo, fará questão de demonstrar alguns apontamentos que provam a inocência do parlamentar, bem como o conluio criminoso formado para assassinar a sua reputação.
Sobre os áudios apresentados na reportagem do RJ2, os advogados do vereador decidiram não comentar.
Na época das denúncias, os advogados de defesa do vereador Gabriel Monteiro comentaram, em nota, sobre o vídeo do parlamentar com uma menor de idade.
"Os advogados do vereador Gabriel Monteiro afirmaram que o delegado Luis Maurício Armond declarou que a menor que aparece no vídeo confirmou em depoimento que disse ao parlamentar ter 18 anos e que há uma investigação em curso onde já se provou a ligação de Rafael Sorrilha com os ex-assessores que acusam Gabriel Monteiro, deixando claro que todas as denúncias foram motivadas pela prisão efetivada contra o empresário quando ele ofereceu dinheiro ao vereador para não divulgar a máfia dos reboques".
Fonte: g1
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é muito importante para nós, comente essa matéria!