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segunda-feira, agosto 29, 2022

Atrasos no pagamento, agressões, ameaças, roubos e desconfiança: Censo completa 29 dias nas ruas com problemas

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Após dois anos de atraso, começou há 29 dias o Censo 2022. No entanto, vários estados do país estão registrando contratempos na coleta. Recenseadores têm relatado dificuldades para serem atendidos pelos moradores, tentativas de estupro, agressões verbais e físicas, roubos de equipamentos e bens pessoais e atrasos nos pagamentos da remuneração.


Problemas no pagamento

Recenseadores ouvidos pela Rede Amazônica reclamam sobre atraso para receberem o pagamento pelos serviços prestados. Isso acontece porque muitos moradores estão se recusando a recebê-los, seja por medo ou falta de informação.



"A partir do momento que eu finalizei esse setor, com cinco dias a gente receberia. E já tem vários colegas com mais de 12 dias úteis que já finalizarem seus respectivos setores, e ainda não receberam. E a gente se preocupa, porque nós temos família, e contas que não esperam para serem pagas", disse uma outra recenseadora, que também preferiu não se identificar.

O IBGE informou que todos os casos estão sendo verificados, e que o procedimento está dentro dos prazos legais.


Recenseadores de Fortaleza receberam com atraso o pagamento da remuneração. O chefe do IBGE no Ceará, Francisco Lopes, explicou que o sistema de pagamento do órgão começou a receber informações de recenseadores do país todo e que acabou não suportando a gama de informações. Contudo, dias depois, o problema foi resolvido e os recenseadores receberam o pagamento, segundo o IBGE, e os próprios profissionais confirmaram o recebimento.


“A gente recebe por produção e aí, quando a gente entra é destinado a um setor, que é determinado um número de quadras, e a gente tem que fazer aquela quadra toda. A gente só recebe depois que a gente entregar o setor inteiro. Então, o fato de ter que ficar voltando em casas ausentes ou, de repente, a pessoa não atender acaba atrasando tanto o Censo quanto o nosso pagamento”, diz Amanda de Assis Barbosa, recenseadora em Poá (SP), que também relatou problemas.


Assaltos

Em Bauru, interior de São Paulo, o aparelho usado no Censo foi arrancado das mãos de um recenseador por um criminoso, que conseguiu fugir.


Em Rio Branco, no Acre, recenseadores foram vítimas de assaltos durante as visitas. As equipes já sofreram cinco assaltos desde o início dos trabalhos. Dois Dispositivos Móveis de Coleta (DMC), usados pelos servidores, foram levados durante os crimes. Em nenhum dos casos houve agressão, segundo a coordenação.


Segundo o IBGE, quando há roubo ou furto desses equipamentos, o aparelho “é rastreado, apagado e inutilizado, sem prejuízo do sigilo garantido aos informantes ou moradores. Sobre a segurança dos dados coletados, ela é garantida com o uso da criptografia, os dados gravados no dispositivo móvel de coleta são criptografados”.



Em Manaus, no Amazonas, recenseadores também foram vítimas de assaltos durante a coleta. Segundo o IBGE, até o dia 25, foi registrado o roubo de 20 dispositivos móveis de coleta e seis tablets na capital amazonense.


Uma das recenseadoras afirmou que foi assaltada enquanto entrevistava um morador da capital amazonense. "Eu estava fazendo a entrevista com um morador e dois jovens que me abordaram por trás levaram o aparelho utilizando para fazer o Censo, porque o meu celular eu deixo em casa. Por conta disso, acabei ficando na mão e passei quatro dias sem poder trabalhar", afirmou.


Em 15 dias de coleta, o Amapá registrou pelo menos 9 assaltos a recenseadores durante coletas nos municípios de Macapá e Santana. Segundo o IBGE, os trabalhadores foram ameaçados com facas e armas de fogo. Ao todo, foram levados 10 Dispositivos Móveis de Coleta (DMCs).


Em Mato Grosso do Sul, uma supervisora e recenseadora foram assaltadas por dois suspeitos, um deles armado, enquanto realizavam entrevistas para o Censo no bairro Coophatrabalho, em Campo Grande.


O roubo aconteceu na Rua Murici e os autores, que estavam em uma motocicleta, apontaram uma arma e roubaram um tablet e celular utilizados na coleta dos dados, além dos celulares pessoais das vítimas. A dupla fugiu.



Em Sergipe, duas recenseadoras foram assaltadas no bairro Cidade Nova, em Aracaju, enquanto se preparavam para a coleta de dados.


As vítimas foram abordadas por um homem armado, que fez ameaças e roubou um celular e um tablet utilizados para realização da pesquisa, além de um celular de uso pessoal de uma das vítimas. Ninguém ficou ferido. O IBGE informou que elas receberam a devida assistência.


Tentativas de estupro

Em Rondônia, na zona rural de Vale do Anari, uma recenseadora sofreu uma tentativa de estupro e foi ameaçada de morte, enquanto trabalhava no Censo.


A mulher de 28 anos foi até a casa de um morador na Linha PA 18 e foi recebida pelo homem no quintal. Após preencher todas as respostas do formulário, a vítima foi até sua motoneta e deu partida no veículo para ir embora. O morador então apareceu com uma faca de cozinha e começou a correr atrás dela.



O homem chegou a segurar a vítima pela mão, mas a mulher conseguiu jogar a faca para longe após reagir e entrar em luta corporal. A mulher afirma que conseguiu correr e entrar no pasto da propriedade, mas foi alcançada pelo suspeito.


"Ele novamente me agarrou, com a faca na mão, e conseguiu me levar para dentro da residência, tentando forçar uma relação sexual. Ele ainda ameaçou dizendo da seguinte forma: 'para de gritar senão eu te mato'", diz o relato da recenseadora no boletim.

Dentro da casa, o acusado tentou ainda enforcar a vítima, mas ela conseguiu empurrar o homem com um dos pés e saiu correndo para pedir socorro. Ela foi ajudada por alguns moradores. O homem está foragido.


Em Alagoas, a Polícia Civil prendeu em flagrante um homem por tentativa de estupro contra uma recenseadora. Ela fazia a coleta de dados em Jequiá da Praia, litoral sul. A vítima disse que, ao bater na porta da residência, foi convidada por um homem a entrar no imóvel. Quando terminou a entrevista, o morador tentou forçar o ato sexual. A vítima conseguiu fugir. O homem foi preso.


Por meio de nota, o IBGE informou que prestou apoio à servidora, que está bem e "optou por seguir realizando as atividades em outro setor censitário".



Assédio sexual

De acordo com o coordenador da área do Censo em Uberlândia (MG), Daniel Nunes Souza, algumas recenseadoras foram vítimas de assédio sexual na cidade enquanto trabalhavam.


“A gente teve alguns casos de assédio e de moradores que não estão recebendo os recenseadores. Os profissionais estão ali para trabalhar, e é uma pesquisa de grande importância para o país”, destacou.

Uma recenseadora de Ponta Grossa (PR) registrou boletim de ocorrência por importunação sexual, ameaça e desacato.


"[O morador] reclamava do Censo, do IBGE, das perguntas, que as perguntas eram ridículas, que não existia motivo de eu estar ali. De que meu trabalho não fazia sentido nenhum porque aquilo não servia para nada. Me senti como pessoa um lixo e tudo que eu falava ele falava que eu era burra, que eu que deveria saber a resposta, que eu não estava vendo que ali a resposta era óbvia", contou.


Conforme boletim de ocorrência, em determinado momento, o homem chegou a falar: "Você não está vendo que eu sou macho? Daqui a pouco você vai perguntar o tamanho da minha [genitália]".


Ameaças

No Rio Grande do Norte, um recenseador registrou boletim de ocorrência contra um morador do bairro da Redinha, em Natal. De acordo com o profissional, mesmo com as explicações do que se tratava a pesquisa, o homem se manteve irredutível e fez diversas ameaças contra o profissional.



"Ele disse que era para eu sair da rua dele e mandou eu não voltar mais. Se eu voltasse, ele ia me dar um tiro, isso com a mão na cintura", afirmou.

Após o registro do boletim de ocorrência, ele relata que continua trabalhando na função, mas em outro setor. "Fui remanejado. Eu participei do processo seletivo para melhorar minha renda, mas, após a situação, já pensei em desistir", revela.


“Está sendo muito difícil porque me jogam água, gritam comigo. Estão tratando a gente mal. ‘Ah, eu vou fazer o Censo e vou ganhar quanto? Ah, você vai fazer o Censo mas vai aumentar meu imposto? Ah, eu não quero falar que isso não tem nada a ver’", conta a recenseadora Amanda de Assis Barbosa, de Poá (SP).

Em Bauru, interior de São Paulo, uma recenseadora foi ameaçada com um facão por um morador que se sentiu incomodado com a abordagem. O coordenador censitário Lucas dos Santos Correia disse que uma série de hostilidades tem marcado o trabalho dos recenseadores na cidade, especialmente de moradores que se recusam a receber os profissionais com medo de golpes.


"Quando eu fui perguntar para a senhora alguns quesitos como idade, quantos banheiros tinha em casa, ela achou ruim e começou a me ofender. Começou a me xingar, dizer palavrões e no final chegou a falar que se eu voltasse no domicílio ela ia me matar", afirma um recenseador de Ponta Grossa (PR).



Em Goiânia, um recenseador de 31 anos disse que recebeu ameaça de um morador já no primeiro dia de trabalho.


“Quando entreguei o aviso de coleta o morador disse que era agente de segurança pública e me ameaçou. Falou que ia pegar uma arma de fogo. Tive que deixar o aviso no portão e deixar o local”, disse.

Ele atuou apenas 8 dias como recenseador. Em pouco mais de uma semana, sofreu outra ameaça. “O proprietário chegou a iniciar o procedimento de coleta e, do nada, começou a gritar e usar palavras de baixo calão”, disse.


Recusas em dar entrevistas


Em Pernambuco, os condomínios, principalmente nas áreas mais ricas, estão entre locais mais complicados para a realização da coleta de dados.


“A grande dificuldade são os principais condomínios, principalmente em área de luxo, onde a gente tem dificuldade de acesso aos moradores, seja porque não estão em casa, seja por orientação do porteiro ou de síndicos de não permitir a entrada de estranhos", apontou Gliner Alencar, superintendente do IBGE em Pernambuco.

Alencar apontou que, por medo de golpes, algumas pessoas ficam receosas de receber os profissionais do IBGE. Além do medo por conta da violência, há também fatores como desinformação e famílias cada vez menores, o que dificulta localizar alguém em casa.


"Você também tem pessoas passando cada vez mais tempo fora. Trabalhando mais tempo, estudando. A pessoa trabalha de manhã e estuda de noite. Por conta disso, os recenseadores também vão num horário um pouco mais tarde, 20h30", exemplificou.


De acordo com a Lei nº 5.534 de 14 de novembro de 1968 e com o Decreto nº 73.177, de 20 de novembro de 1973, toda pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, é obrigada a prestar as informações solicitadas pelo IBGE. Isso significa que as pessoas precisam responder ao Censo.


A legislação determina ainda a multa de até dez vezes o maior salário-mínimo vigente no país, se o infrator for primário; e de até o dobro desse limite, quando reincidente.


Em Natal, a recusa de alguns moradores em receber os profissionais vem trazendo morosidade no serviço. É o caso de um recenseador de 43 anos que atua no Alecrim e tem a previsão de fazer a coleta de dados em mais de 300 domicílios. "Em alguns casos, o pessoal não tem interesse em responder, falam conosco em tom áspero, num tom de voz grosseiro, com palavras de baixo calão", afirma.


Outra recenseadora tem tido dificuldades para ouvir moradores de condomínios. Em um deles, foi dito que seria realizada uma assembleia com os moradores para viabilizar a entrada dos recenseadores.


O acesso a um condomínio também é problema para Mara Oliveira, de 26 anos. "O gerente do condomínio chegou a dizer que não era obrigado a receber a gente, mas eles são. Se eles não têm noção do que é a lei, não cabe a mim", afirma.


Em Uberaba, os dados de recusa giram em torno de 3%, que é considerado alto, segundo Marshal Marangoni, chefe da agência do IBGE na cidade.



“É um índice comparado com as capitais. É algo que atrapalha muito, pois desestimula muito os recenseadores, já que eles ganham por produção. E, muitas vezes, essa recusa está sendo feita de forma muito agressiva, com insultos, grosseria. Isso é muito desagradável”, explicou o coordenador da área do Censo, Daniel Nunes Souza.


Um dos receios da população é o uso das visitas de falsos recenseadores para aplicação de golpes. Neste caso, o órgão reforça que os profissionais usam equipamentos específicos, que podem identificá-los facilmente.


No Ceará, recenseadores de Fortaleza estão enfrentando dificuldades na coleta de dados devido à desconfiança e falta de informações de moradores, que chegam a recusar o recebimento dos profissionais nos domicílios.


Segundo um recenseador, mesmo portando colete e crachá com a identidade visual do IBGE, ele foi barrado em pelo menos dois condomínios e só conseguiu entrar nos locais com o auxílio do coordenador da equipe, que notificou o imóvel para a realização da pesquisa. "Os condomínios não abrem para a gente. A gente se identifica, mas os síndicos não deixam entrar para aplicar os questionários".


Outra profissional afirmou que os transtornos são causados pela falta de informação das pessoas em relação à pesquisa. "Tem pessoas que não sabem nem o que é IBGE e nem para que serve o Censo", disse.


Já outro recenseador relatou que, além de ser barrado, já chegou a ser ofendido por moradores de residências. "Tive umas três recusas. Duas pessoas disseram que não eram obrigadas e, por isso, não iriam atender", disse.


O profissional ainda cita a questão da falta de segurança para realizar as pesquisas. "Fui em um condomínio em que o próprio morador falou que eu era corajoso por estar naquele local", contou.


No Acre, o principal impasse que dificulta a aplicação dos questionários é a desconfiança dos moradores em receber os profissionais.


"Não são todas as pessoas que têm acesso à informação de que o IBGE e os recenseadores estão indo nas casas e, por conta disso, têm esse receio de serem enganadas, em receber uma pessoa com a índole duvidosa, mas estamos aqui para esclarecer todas as dúvidas", diz a recenseadora Carolina Cabral.


No Tocantins, moradores também têm recusado receber as equipes. “O morador às vezes vê e não quer abrir. Ou um síndico às vezes impossibilita a gente de entrar. Então a gente precisa mesmo que as pessoas entendam a importância de deixar que o recenseador entre dentro do domicílio”, disse a agente censitária Laureana Barbosa.


Fonte: g1

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