A suspensão do pagamento de precatórios por parte do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) afetou cerca de R$ 185 milhões em recursos que estavam disponíveis para serem pagos aos credores vencedores de ações contra o Poder Público. A interrupção no pagamento, que acontece desde março deste ano, afeta cerca de 2.900 credores em todo o Estado e ainda não tem data certa para ser retomada.
O montante refere-se aos valores devidos pelo Governo do Estado e pela Prefeitura do Natal em ações já reconhecidas pela Justiça. Esses dois entes, segundo o TJRN, são os principais atores nos precatórios, correspondendo a 90% da dívida global, que chega a cerca de R$ 190 milhões quando se envolve todos os municípios potiguares.
“Estamos há dois meses sem que seja pago nenhum precatório. Os únicos que ocorreram foram de casos isolados que não dependiam de cálculos eletrônicos e ainda não temos garantia de que esses pagamentos retornarão imediatamente. Eles não têm um prazo definitivo. Nos informaram que seria testada uma versão e que se ela não apresentar defeito, retornaria imediatamente. Mas não temos uma data, o que é nossa angústia”, aponta o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no RN (OAB-RN), Aldo Medeiros.
Segundo o TJRN, o pagamento foi paralisado por mudanças na forma de se calcular os valores dos precatórios, que precisam ser pagos de forma atualizada de acordo com os índices previstos em lei. Essas mudanças, segundo o juiz Bruno Lacerda Bezerra, coordenador da Divisão de Precatórios do TJRN, ocorreram com as PECs 113 e 114, aprovadas no País no ano passado.
As emendas constitucionais alteraram a forma de atualizar os valores dos precatórios. Antes, utilizava-se o índice IPCA e juros da caderneta de poupança e a partir das emendas passou a ser taxa Selic (índice básico de juros). Em março, nova resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que o índice deveria ser o IPCA e juros até a data da emenda (novembro de 2021), passando a ser Selic em diante. Em resumo: foram várias alterações nas metodologias de cálculo num curto período de tempo, o que motivou a suspensão.
“Na Selic tem uma composição de juros. O CNJ disse que no período de graça constitucional não se aplica Selic, mas sim IPCA, e quando acabar esse período, volta a aplicar a Selic. Essa formatação de cálculo de atualização de valores não estava previsto em ferramenta nenhuma no Brasil. Em março, já encaminhamos solicitação para a secretaria de TI do TJ para fazermos adequação do nosso sistema”, comenta o juiz Bruno Lacerda Bezerra, coordenador da Divisão de Precatórios do TJRN.
Prazos
Segundo o juiz Bruno Lacerda, não há prazo fixado para o retorno dos pagamentos, o que ele afirma esperar ser o “mais rápido possível”. O juiz acrescenta ainda que sistemas estão sendo desenvolvidos pelo departamento de tecnologia da informação do TJ, com uma nova versão teste prestes a ser avaliada.
“Paramos os pagamentos porque o valor a ser pago precisa ser estritamente exato, para que nem haja prejuízo ao credor nem pagamento maior para o erário. Estamos aguardando essa finalização. Nos últimos 30 dias, a cada dia vem surgindo novas versões que são testadas”, comenta.
Nesta semana, a OAB-RN se reuniu com membros da presidência do TJRN para cobrar o retorno do pagamento dos precatórios e apresentar outras demandas da advocacia potiguar.
“Tivemos outras questões com o TJRN, como a dificuldade de comunicação com algumas varas que não atendem telefones nem Whatsapps, a dificuldade de acesso nas secretarias unificadas do tribunal, o que tem trazido dificuldades na comunicação. Falamos também sobre o acúmulo de cálculos na contadoria do tribunal. Essa contadoria calcula todos os processos do Estado todo e há um acúmulo de processos parados”, reclama Aldo Medeiros.
O secretário-geral da OAB/RN, Assis Cunha, avaliou a reunião como “produtiva”. Trouxemos diversos temas importantes que impactam no dia-a-dia da Advocacia, como a questão inerente aos precatórios, em que conseguimos o comprometimento do Tribunal de máximo empenho para que nos próximos dias voltem a pagar os precatórios. Apesar da sinalização positiva do tribunal sobre variados temas, a OAB/RN seguirá vigilante e contribuindo com sugestões para melhorar tais serviços" enfatizou o advogado.
Fila de precatórios ultrapassa 17 mil no RN
A fila de pagamentos aprovados para precatórios no Rio Grande do Norte já soma cerca de 17 mil credores, segundo a Divisão de Precatórios do TJRN. Destes, 13 mil são relativos apenas ao Governo do Estado. Com relação às super preferências, isto é, credores com prioridade no recebimento dos valores, são 2.900 em todo o Estado, sendo cerca de 340 em Natal. Em 2022, o Estado vai pagar R$ 228 milhões em precatórios. Já Natal vai ter um custo de R$ 41 milhões.
Parte do mês de maio do Estado não foi pago, segundo o TJRN, em valor da ordem de R$ 8,680 milhões. O Estado já foi notificado da pendência. A Secretaria de Planejamento do Estado, contudo, afirmou à reportagem da TRIBUNA DO NORTE que todos os pagamentos estão em dia. Natal está em dia com o pagamento, segundo o TJ.
“Somos obrigados a tomar as medidas. Inclusive, com inscrição do Estado no Sicov, com o RN impedido de receber transferência voluntária do Governo Federal”, aponta o juiz Bruno Lacerda.
A lista com os credores no Estado tem aumentado ao longo dos anos, ao passo que a dívida também sobe. De 2015 a 2021, a quantidade de precatórios a serem pagos saltou de 2.321 para 13.153, num aumento de mais de 400%, conforme mostrou a TRIBUNA DO NORTE em reportagem de setembro de 2021. A dívida global do Estado atualmente está na casa dos R$ 2,290 bilhões, segundo Bruno Lacerda. Já a de Natal é de R$ 386 milhões.
Para zerar essa fila, primeiro é necessário pagar os precatórios da chamada “super preferencial”, que são para pessoas acima de 60 anos, doença grave e pessoas com necessidades específicas, para poder dar vazão a fila da ordem cronológica.
“Os precatórios emitidos até uma determinada data entram para o exercício subsequente. A fila cresce a cada ano. Nesse período de suspensão não chegou novos porque a partir de janeiro do ano que vem que vão chegar os novos. Hoje existem mais de 2,6 mil pessoas nessa fila da super preferência. E o valor que o Estado é obrigado a pagar não é suficiente para esgotar essa fila e entrarmos na ordem cronológica”, cita.
Fonte: Tribuna do Norte
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