Uma tradicional rede de farmácias que no ano passado foi acusada de homofobia por ter chamado um publicitário de "Gaylileu" aceitou fazer neste mês um acordo e pagou R$ 40 mil, a título de indenização por danos morais, para a Justiça arquivar o caso. A vítima recebeu metade desse dinheiro, e os outros R$ 20 mil foram para uma ONG que abriga jovens LGBTQIAP+ na capital paulista.
Em 2021, Galileu Araujo Nogueira passou a receber mensagens da Droga Raia por SMS do celular e cupons de desconto para medicamentos, com seu nome escrito com a inclusão da letra "y", formando a palavra "gay", ao lado da sugestão do remédio que ele usava. Antes disso, o nome do cliente era grafado corretamente nos recados que recebia.
Em março deste ano, o publicitário de 33 anos, que é homossexual, denunciou a discriminação que sofreu nas redes sociais, e o g1 divulgou o caso. Ele postou fotos dos cupons e as mensagens que recebeu da farmácia em seu perfil no Instagram:
"Droga Raia: Gaylileu o NORVOSAC 5 MG 30 S deve estar acabando. Compre pelo site ou na Droga Raia mais prox (p/sair envie PARE)", informa o SMS recebido em 19 de março de 2021 sobre o medicamento controlado que toma para hipertensão.
Bolsas de estudos
Com a indenização que recebeu, Galileu informou que irá dar bolsas de estudos para jovens LGBTQIAP+ que queiram se especializar em comunicação. O publicitário também usa suas redes sociais para mostrar seu trabalho como estrategista de marcas, além de dar aulas de construção de marca na Miami AdSchool.
A outra parte do valor da indenização vai ajudar a ONG Casa 1, que recebe gratuitamente pessoas de 18 a 25 anos que foram expulsas de suas casas pelas famílias por causa de suas orientações afetivas sexuais e identidade de gênero.
Com o acordo amigável entre as partes, a ação de indenização por dano moral que Galileu movia na Justiça contra a empresa foi encerrada. Ele cobrava R$ 44 mil de indenização, além de exigir que ela crie programas de treinamentos com funcionários.
Além disso, a condenação que a Droga Raia sofreu foi substituída por esse acordo. Em abril deste ano, a Justiça havia condenado a farmácia a pagar R$ 4 mil ao publicitário, mas esse valor nunca foi pago. E não será mais por conta do pacto que a empresa e Galilleu firmaram e que foi homologado em maio pela Justiça.
'Marco na luta contra homofobia no Brasil'
"O resultado da ação, pra mim, é um excelente marco na luta contra homofobia no Brasil. E acredito que ela pode inspirar outras pessoas da comunidade LGBTQIAP+ a não se calarem mais. A possibilidade de reverter a indenização, vindo de um ato de homofobia, e virando uma possibilidade de educação para comunidade é o que mais me deixa feliz no resultado desse processo", disse Galileu, que gravou um vídeo na sua rede social para tratar do acordo.
O que diz a Droga Raia
Por meio de nota encaminhada ao g1 por sua assessoria de imprensa, a Droga Raia informou que respeita a comunidade LGBTQIAP+ e trabalha pela inclusão dessas pessoas no seu quadro de funcionários.
"Ficamos satisfeitos com o desfecho, pois sabemos que isso poderá contribuir com a promoção contínua da diversidade, e porque estamos aprendendo juntos como construir uma sociedade mais inclusiva", informa o comunicado da rede de farmácias (leia abaixo a íntegra da nota).
Galileu contou que sofreu a homofobia no ano passado, quando foi a uma farmácia da Droga Raia na Rua Frei Caneca, conhecida pela presença de LGBTQIAP+ no centro de São Paulo. Chegando lá, o publicitário disse que viu seu nome grafado de maneira pejorativa, como 'Gaylileu', nos cupons de desconto para medicamentos. Depois passou a receber mensagens pelo celular com o mesmo nome que o ofendeu.
À época, o publicitário havia dito que foi "perturbador" descobrir que alguém que trabalha na Droga Raia trocou seu nome por preconceito pelo fato de ele ser gay.
"Na hora que recebi essa mensagem, pensei: 'Deve ter sido um erro de digitação', mas alguns segundos depois entendi que não, era homofobia. Não havia sentido ser um erro de digitação em algo que sempre foi escrito certo nas mensagens", disse Galileu. "O sentimento é bem perturbador."
Também em março , o advogado Giovani Ravagnani, que defende Galileu, havia dito que o que estava em disputa contra a Droga a Raia, na ação impetrada por ele na Justiça, não era o dinheiro, mas a responsabilidade da empresa com o ato de homofobia que ocorreu com seu cliente.
"É muito menos a indenização e muito mais trazer a discussão para ter programa de treinamento de funcionários para isso não ocorrer de novo", falou Giovani.
"A Droga Raia é uma empresa com mais de 115 anos, que se preocupa com a saúde e o bem-estar de seus clientes, aberta à diversidade, à pluralidade e a relações transparentes, portanto, somos contra qualquer ato de discriminação. Respeitamos a comunidade LBTQI+ e trabalhamos pela inclusão dessas pessoas em nosso quadro de funcionários, sempre preocupados com o bom atendimento dos nossos clientes em nossas farmácias.
Quando recebemos o relato do Sr. Galileu entramos em contato para marcar uma conversa pessoal e apresentar as iniciativas da empresa no campo da Diversidade, e mesmo com a sentença judicial determinando um valor bem abaixo do que estávamos negociando, entendemos que poderíamos manter o acordo nos valores combinados, aceitando a sugestão do cliente em destinar parte do valor à ONG Casa 1. Ficamos satisfeitos com o desfecho, pois sabemos que isso poderá contribuir com a promoção contínua da diversidade, e porque estamos aprendendo juntos como construir uma sociedade mais inclusiva.
Continuaremos investindo em treinamentos e conscientização dos nossos 50 mil funcionários para combater a discriminação, bem como no letramento de nossos executivos, que em 2021, tornaram-se sponsors nas agendas de gerações, gênero, LGBTI+, pessoas com deficiência e raça/etnia.
Apesar de todas as nossas iniciativas sabemos que ainda há muito para avançar. Estamos trabalhando para que as nossas farmácias continuem sendo referências no acolhimento às pessoas, mantendo o máximo respeito e cuidado com clientes, funcionários e a sociedade em geral."
Fonte: g1
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