Em depoimento de mais de oito horas de duração à CPI da Covid nesta terça-feira (22), o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) recorreu a diversas expressões para negar a existência de um “gabinete paralelo” que teria atuado à revelia do Ministério da Saúde durante a pandemia.
Terra chamou de “ficção”, “falácia” e “construção de narrativa” a hipótese de que houve um assessoramento alternativo, o chamado gabinete paralelo, trabalhando para o presidente da República.
O deputado, que se disse amigo do presidente Jair Bolsonaro, foi chamado a prestar depoimento sobre o envolvimento com o suposto núcleo de aconselhamento que teria indicado ao presidente medidas ineficazes para o combate ao coronavírus.
Desde o início da pandemia do coronavírus, Osmar Terra, que é médico, defendeu medidas ineficazes e fez previsões equivocadas sobre o impacto da doença. Ele previu 800 mortes por coronavírus e uma duração curta da doença – no último sábado, o Brasil ultrapassou a marca de 500 mil mortos.
Ao ser confrontado por suas projeções, o deputado admitiu que errou quando tratou de temas relativos à quantidade de vítimas, à segunda onda e à vacinação (leia mais abaixo).
À CPI, Osmar Terra também se disse favorável à vacinação e ao uso de máscaras, e contou que ficou internado na UTI e teve 80% do pulmão comprometido após ter contraído a doença.
Bolsonaro 'ouve todo mundo'
Nesta terça, Osmar Terra afirmou manter reuniões e participações “episódicas” em reuniões com o presidente a cada 15 dias ou uma vez por mês.
Sobre a pandemia, contou, Bolsonaro o ouviu “algumas vezes” e perguntou a ele "algumas coisas"
“De vez em quando eu falo com ele. Qual o problema? Se eu fosse tão influente assim, estaria em outra situação”, declarou Terra, que já foi ministro no governo Bolsonaro.
Terra, no entanto, disse não ter poder sobre as opiniões de Bolsonaro ou sobre as atitudes que ele toma.
“Ele ouve todo mundo, como todo mundo. O presidente da República não pode fazer isso? Ele pode, claro. Isso não significa que tem gabinete paralelo, que tem estruturas paralelas. Isso é uma falácia”, disse o deputado.
Senadores, no entanto, ressaltaram semelhanças entre o conteúdo e o momento das declarações feitas pelo presidente e as ideias expressadas por Terra em relação ao controle da pandemia, como a imunidade de rebanho.
“Impressionante é o ventríloquo, que geralmente fala o que o deputado fala também”, ironizou o senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), apelou ao deputado para exercer influência sobre Bolsonaro para que o presidente se vacine, a fim de dar exemplo.
Reuniões no Planalto
Terra também foi questionado sobre a ligação com pessoas apontadas como integrantes de um gabinete de aconselhamento paralelo – o deputado negou manter relações e disse ter conhecido parte delas em encontros promovidos pelo presidente.
Com o virologista Paolo Zanotto, por exemplo, o deputado disse que falou com ele uma única vez durante um evento no Planalto – no encontro, registrado e divulgado pelas próprias redes do presidente, Zanotto propôs a criação de um “gabinete das sombras”.
“Foi a primeira e única vez que eu conversei com ele porque ele estava sentado do meu lado. Transformar isso num gabinete secreto, que vaza vídeos, é um absurdo, não tem sentido. Eu posso dizer que não existe esse gabinete, esse gabinete é uma ficção. Se assessores do presidente lhe dão alguma recomendação, algum conselho, isso é natural”, afirmou.
O deputado contou que também conheceu a médica Nise Yamaguchi durante evento na Presidência – e afirmou que “nem por telefone” conversa com ela. Yamaguchi foi apontada como uma das pessoas que defenderam a alteração da bula da cloroquina, remédio ineficaz contra a Covid.
Sobre Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro e filho do presidente, disse que nunca conversou com ele.
“Em um ano e pouco que fui ministro e, agora, com as relações que eu tenho, de amizade, com o presidente, eu nunca conversei com o Carlos Bolsonaro. Eu o cumprimento quando ele está no gabinete do presidente ou ia numa reunião de ministério, sentava lá atrás, eu o cumprimentava”, disse.
Previsões erradas
Logo no início do pronunciamento, Terra criticou o que chamou de “discussão politizada” sobre a pandemia e disse que o inimigo em comum é o vírus. Segundo ele, a política infectou a ciência.
“Se alguém infectou, tenha certeza de que não foi nenhum senador daqui. A política não infectou a ciência. Alguns políticos, como Vossa Excelência, sim, infectaram a ciência”, afirmou o presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM).
O presidente da CPI fazia referência às declarações de Osmar Terra, que defendeu a imunidade de rebanho e colocou em xeque a vacinação contra o vírus. Antes da chegada dos imunizantes, dizia, a pandemia já teria chegado ao fim.
Durante a audiência, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentou algumas das previsões de Osmar Terra (vídeo abaixo) sobre o coronavírus – como a baixa quantidade de mortes, a pequena probabilidade de uma segunda onda no Amazonas e o fim da pandemia em meados do ano passado. “O senhor errou?”, questionou Tasso. “Sim”, admitiu Terra.
Antes, o deputado já havia feito uma espécie de "mea culpa" e dito que fez as análises com base em informações de epidemias anteriores.
“Eu não estava, eu não tinha, ninguém previu. Quem é que acertou o número de mortes?”, afirmou.
O deputado, porém, afirmou que “essa história de que nem todas previsões foram equivocadas não é verdade” e sustentou que acertou em alguns pontos, como a curva de contaminação do vírus.
Já ao final da participação na CPI, Osmar Terra fez uma nova previsão sobre o término da pandemia.
"As pessoas questionando quando é que termina essa pandemia. Eu disse: 'Vai terminar quando tiver – ou com vacina, ou sem vacina – um número grande de pessoas imunizadas'. E é isso que vai acontecer. Nós vamos somar as pessoas imunizadas com a vacina e termina. Quando que vai acontecer? Não vai demorar muito", disse.
Em tom irônico, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) respondeu: "Vamos torcer para que, dessa vez, vossa excelência acerte a previsão".
Em outro momento, em resposta à senadora Zenaide Maia (Pros-RN), Osmar Terra disse concordar com a afirmação de que a vacina é a "grande solução".
Fonte: G1
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