O epidemiologista Pedro Hallal declarou à CPI da Covid no Senado, nesta quinta-feira (24), que o Ministério da Saúde censurou dados do maior estudo epidemiológico já realizado sobre o coronavírus no país até o momento.
A pesquisa "EpiCovid-19" foi realizada pela Universidade Federal de Pelotas, sob coordenação de Hallal, e apresentada em uma entrevista coletiva no Palácio do Planalto em julho de 2020. Segundo o pesquisador, uma tela que mostrava a diferença no índice de casos por etnia foi retirada sem debate prévio.
"Eu era o investigador principal da pesquisa, eu preparei um conjunto de slides junto com o meu grupo da Universidade Federal de Pelotas, entreguei os slides para a Secretaria de Comunicação do Ministério da Saúde. E quando fui apresentá-los, um dos slides tinha sido retirado e eu fui comunicado 10 minutos antes. Se este episódio não caracteriza censura, eu peço desculpa aos senhores senadores e senhoras senadoras para me explicarem o que é censura, se não é este episódio", declarou Hallal.
O G1 questionou o Ministério da Saúde sobre a acusação de censura dos dados e aguarda retorno da pasta.
O slide supostamente censurado foi exibido por Pedro Hallal na exposição inicial aos senadores, nesta quinta. Veja na imagem abaixo:
"Eu vou pedir especial atenção dos senhores e senhoras senadoras a esse slide, porque esse slide tem uma longa história. Ele mostrou que as populações indígenas tinham cinco vezes, em média, maior risco de contaminação do que as populações brancas. Que as populações negras, sejam pretas ou pardas, tinham o dobro do risco de infecção do que as populações brancas", explicou o pesquisador em sua fala inicial.
Os índices no gráfico se referem à porcentagem de pessoas de cada etnia, incluídas em cada fase da pesquisa, que já tinham enfrentado um quadro de Covid. No caso dos indígenas, a pesquisa levou em consideração apenas os que vivem na área urbana, e não os indígenas aldeados.
As três fases listadas no gráfico foram realizadas entre maio e junho de 2020, segundo Hallal – antes de o estudo ter sido interrompido pelo Ministério da Saúde.
A pesquisa continuou a ser realizada pela Universidade de Pelotas, a partir do segundo semestre do ano passado, com financiamento do movimento Todos pela Saúde e da Fundação de Amparo à Pesquisa do governo estadual de São Paulo.
Dados incômodos
Hallal falou sobre a retirada do slide em resposta a uma pergunta formulada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e lida pelo relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL).
A pergunta dizia: "É fato que o Ministério da Saúde manifestava incômodo com os dados trazidos pelo estudo da Universidade Federal de Pelotas?"
Ao responder, o coordenador da pesquisa afirmou que representantes do Ministério da Saúde já haviam manifestado incômodo com a metodologia de divisão dos participantes do estudo entre etnias, com base em autodeclaração. As categorias listadas no slide são as mesmas usadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que também usa a autodeclaração no Censo.
"Nas reuniões preparatórias a essa apresentação no Palácio do Planalto, o Ministério da Saúde demonstrou a incomodação com o resultado da diferença entre os grupos étnicos. Aliás, um dos participantes da reunião disse que era um 'absurdo' usar etnia autorreferida, e eu expliquei a ele que essa era a metodologia usada pelo IBGE, amplamente consolidada na literatura", afirmou Hallal.
"Essa discussão aconteceu por dois dias, e o resultado final foi a exclusão do slide da apresentação que foi feita no Palácio do Planalto num episódio, senador Renan, que eu considero talvez o mais bizarro da minha carreira", prosseguiu.
Em entrevista à GloboNews na semana passada, Pedro Hallal disse que, a cada cinco mortes por Covid-19 no Brasil, quatro poderiam ter sido evitadas.
Fonte: G1
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