A saída de Pazuello se dá no pior momento da pandemia e depois de muita pressão do Centrão e de aliados no Congresso. Os dois ministros anteriores caíram por terem discordado da política do presidente Bolsonaro e defendido medidas como uso de máscara e distanciamento social.
O primeiro ministro da Saúde do governo Bolsonaro foi o médico e ex-deputado federal pelo Democratas Luiz Henrique Mandetta. A pandemia começou na gestão dele. Mandetta defendeu o isolamento social para conter o avanço do coronavírus e seguiu as orientações da Organização Mundial da Saúde, estratégia que desagradou o presidente Jair Bolsonaro. Mandetta foi demitido depois de passar pouco mais de um ano no governo.
No lugar de Mandetta entrou o médico oncologista Nelson Teich. Teich ficou no cargo por 29 dias. Pediu demissão em 15 de maio, também após divergências com Bolsonaro sobre o isolamento social e uso de medicamentos como a cloroquina, sem eficácia comprovada para combater a Covid.
O general Eduardo Pazuello já havia chegado ao Ministério da Saúde em abril de 2020 como secretário-executivo. Sem nenhuma experiência na área, ele assumiu o comando da pasta interinamente. Dias depois, Pazuello nomeou nove militares.
Em julho, quando especialistas e autoridades estrangeiras cobravam testagem em massa, Pazuello disse que ia aumentá-la, mas não deu prazo e o diagnóstico seguiu distante da maioria da população. Pazuello só foi efetivado como titular da Saúde em setembro.
Pazuello pôs em prática um discurso alinhado ao do presidente Bolsonaro. Na posse, por exemplo, defendeu o tratamento precoce da Covid.
Pazuello fez o que os dois antecessores, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, se recusaram: assinou uma nota técnica com orientações sobre o uso da cloroquina para tratamento da Covid.
Como Jair Bolsonaro, Pazuello apareceu, em diversos momentos, sem usar máscara ao lado de autoridades. A gestão de Pazuello ficou marcada pela lentidão nas negociações para comprar vacinas.
Pressionado, em outubro, Pazuello anunciou a governadores a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac, a vacina produzida pelo Butantan em parceria com a chinesa Sinovac.
“A vacina do Butantan será a vacina brasileira. Já fizemos carta em resposta ao ofício do Butantan e essa carta é o compromisso da aquisição das vacinas que serão fabricadas até o início de janeiro - 46 milhões de doses - e essas vacinas servirão para nós iniciarmos a vacinação ainda em janeiro”, declarou Pazuello.
Mas ele foi desautorizado por Bolsonaro no dia seguinte.
“Já mandei cancelar. O presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade. Até porque estaria comprando uma vacina que ninguém está interessado por ela, a não ser nós. Não sei se o que está envolvido nisso tudo, é o preço vultoso que vai se pagar por essa vacina da China”, rebateu Bolsonaro.
Recolhido, em recuperação da Covid no hotel do Exército, Pazuello recebeu a visita do presidente e deixou claro a relação de autoridade.
“Senhores, é simples assim: um manda e outro obedece. Mas a gente tem o carinho e dá para desenrolar”, defendeu Pazuello.
Apresentado como especialista em logística, em novembro, descobriu-se que o Ministério da Saúde armazenou em São Paulo um estoque com quase sete milhões de testes para a Covid que poderiam perder a validade, a um custo de R$ 290 milhões.
Mesmo diante de alertas de especialistas de que o Brasil iniciava uma segunda onda da pandemia, Pazuello negava e falava em repique da doença.
"Estamos falando de repique de contaminações e mortos em algumas regiões. Sim, é só acompanhar os dados no nosso site. No Sul e no Sudeste do país, o repique é mais claro. E no Norte e Nordeste é bem menos impactante, com algumas cidades fora da curva. No Centro-Oeste ele é bem mais no meio do caminho. Sim. Isso é um repique da nossa pandemia."
Em dezembro, Pazuello criticou as opções que os fabricantes de vacina contra a Covid ofereceram ao Brasil e disse que a oferta da maioria dos laboratórios era insuficiente para o Brasil:
“São muito poucas as fabricantes que têm a quantidade e o cronograma de entrega efetivo para o nosso país. Quando a gente chega no final das negociações e vai para o cronograma de entrega e fabricação, os números são pífios".
Em janeiro, Manaus enfrentava aumento dramático no número de casos, internações e mortes e falta de oxigênio hospitalar. A conduta de Pazuello na crise na saúde no Amazonas virou inquérito no Supremo Tribunal Federal.
Pazuello também passou a dizer que nunca defendeu o tratamento precoce para a Covid.
A escassez de vacina aumentou a pressão sobre o ministro. Pazuello pediu ajuda ao embaixador chinês para destravar a vinda de insumos da China para a produção das vacinas AstraZeneca pela Fiocruz, e CoronaVac, pelo Butantan.
E veio à tona a informação de que, em agosto de 2020, a Pfizer ofereceu ao governo brasileiro 70 milhões de doses que seriam entregues em dezembro de 2020. A negociação ficou travada porque os termos do contrato não agradaram ao governo Bolsonaro. Os termos do acordo foram aceitos por quase todos os países - apenas Brasil, Argentina e Venezuela não aceitaram as cláusulas.
Em fevereiro, a previsão era ter 46 milhões de doses até o fim de março. Em março, o ministro Pazuello apresentou o quarto cronograma diferente para entrega de vacinas. Depois, a estimativa caiu para 38 milhões; depois, para 30 milhões.
"Nosso objetivo é ter em março próximo a 25 milhões, 28 milhões de doses já realmente entregues para que a gente cumpra o Plano Nacional de Imunização"
Ainda ministro, ele reduziu pela quinta vez a previsão de vacinas para março - 22 a 25 milhões de doses. Com o avanço das novas variantes do coronavírus pelo país, os sistemas de saúde entraram em colapso.
Em meio à superlotação de UTIs, no dia em que o país perdeu 2.349 vidas - maior número de mortes em 24 horas desde o início da pandemia - Pazuello negou o colapso.
“Nosso sistema de saúde está muito impactado, mas não colapsou nem vai colapsar.”
Governadores e autoridades em saúde desmentiram o ministro. Eduardo Pazuello deixou o cargo depois de dez meses.
Fonte: G1
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