O setor privado diz ter, sim, acesso a vacinas da farmacêutica AstraZeneca e que poderia trazer esses imunizantes para o Brasil. Apesar de o laboratório negar a existência de doses para o setor privado, os empresários brasileiros têm detalhes do fornecimento das doses: são três lotes de vacinas, cada um com 11 milhões de doses e que estariam no Reino Unido, onde há uma fábrica ligada à AstraZeneca.
Dizem ainda que a negociação era com representantes da farmacêutica, que venderiam as doses por um valor acima do que é pago pelo setor público. A suposta existência dessas 33 milhões de doses chama a atenção num momento em que a farmacêutica está sendo pressionada pela União Europeia para cumprir o cronograma de entrega das doses contratadas.
“As vacinas têm carimbo e marca, elas são da AstraZeneca. Quem está negociando, e não é a gente, é com empresas do pool que foram os primeiros e que nos procuraram pra aumentar o número de demanda e conseguir mais lotes, quem sabe chegar aos 33 milhões. Essas pessoas estão negociando com pessoas ligadas a AstraZeneca/Oxford e há grupos compõem sócios da AstraZeneca. Não é um mercado paralelo, não tem mercado atravessador. Quem está negociando são os sócios da AstraZeneca. Se me perguntar o nome da pessoa, telefone, pra vocês fazerem o trabalho de vocês, eu não tenho essa informação”, disse José Velloso, presidente da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) em entrevista ao GloboNews Em Ponto.
“Por estratégia desse grupo negociador, não foi aberto para nós quem é a pessoa. Total do lote é de 33 milhões de vacinas da Astrazeneca/Oxford e eles estariam propensos a vender essas vacinas em lotes de 11 milhões", afirmou Velloso.
Procurada pelo blog, a AstraZeneca voltou a dizer que mantém o posicionamento anterior, segundo o qual não tem vacinas negociadas com o setor privado. “No momento, todas as doses da vacina estão disponíveis por meio de acordos firmados com governos e organizações multilaterais ao redor do mundo, incluindo da Covax Facility, não sendo possível disponibilizar vacinas para o mercado privado.”
A ideia dos empresários, que contaram com a autorização do presidente Jair Bolsonaro, para fazer a importação, era doar metade das vacinas para o SUS. Eles contam que teriam acesso aos lotes da AstraZeneca por meio de um investidor que colocou recursos na farmacêutica e que teria como pagamento do investimento o acesso a doses por um determinado preço — acima do que é pago pelos governos. O nome do investidor não foi divulgado.
“Acredito que se o nome for estampado nos jornais, além dele ser procurado por toda a imprensa e seria normal que isso acontecesse, ele também seria procurado e aumentaria a especulação e talvez a gente perdesse a oportunidade de comprar as doses porque com esse nome estampado, ele vai ser procurado pelo mundo.”
“A informação que chegou, por meio desse pool de empresas, que existe um negociador ligado ao grupo de controle da AstraZeneca, e que essas vacinas foram um pagamento da AstraZeneca para esse grupo de controle para o desenvolvimento das vacinas. Como todos sabemos, qualquer desenvolvimento tecnológico, você tem um risco muito grande. Quando você vai desenvolver uma nova tecnologia, um novo produto, se ele não der certo, você perdeu dinheiro, o dinheiro virou pó. É um investimento de alto risco. A informação que nós temos é que no controle, o grupo majoritário no controle da AstraZeneca, que são investidores, sócios da empresa, colocaram dinheiro na empresa pra desenvolver as vacinas e que esse investimento seria retornado na forma de vacinas.”
O governo precisava dar a autorização para as empresas porque as farmacêuticas têm um entendimento com os países de que só repassariam as vacinas para o setor privado depois de o mercado público estar abastecido.
Segundo Velloso, “a informação que nós temos é que antes da AstraZeneca ter a vacina, ter desenvolvido a vacina, então, portanto, antes de começar a vender a vacina, ela já tinha o comprometimento de entregar doses de vacinas para esses acionistas e esses acionistas que têm a vacina a pronta-entrega e poderiam entregar aqui no Brasil”.
O blog questionou a AstraZeneca se a empresa recebeu aporte de recursos para o desenvolvimento de vacinas que tinham como contrapartida a entrega de doses a determinado preço. Eles não responderam.
Imunização
Velloso contou como seria a imunização com as doses adquiridas pelo grupo.
“Nós estaríamos imunizando as pessoas da linha de frente no combate a Covid, aqueles enfermeiros, médicos, maqueiros, motoristas de ambulância, pessoal da limpeza, todo esse pessoal para quem está faltando vacina. Então, a ideia é antecipar essas vacinas, não é furar fila, é tirar da fila os mais necessitados, que precisam de vacina. E estamos nós discutindo quem é a pessoa que está comprando.”
Ele afirmou, no entanto, que com a repercussão ruim e a possibilidade de ação ser vista como “fura-fila”, várias empresas estão desistindo da ideia. O grupo chegou a ter entre 20 e 25 companhias, de diferentes setores (de mineração a varejo).
“Se chegar nessas 33 milhões de vacinas, vamos chegar no valor de R$ 4,4 bilhões. Estamos fazendo esse levantamento. Antes da importação, vai haver contratos, isso é uma importação, vai ter contrato assinado entre o exportador e o importador, essas vacinas vão ter que chegar ao Brasil, vão ter que ser aprovadas pela Anvisa, elas vão ser distribuídas pelo SUS e vamos fazer o pagamento. Tudo vai ser conhecido. Vamos conhecer quem é a pessoa do outro lado, quem está negociando, quais são as cláusulas, só vem vacinas pro Brasil, fazer importação, fazer remessa de dinheiro através do BC, depois que o contrato estiver assinado. Estamos numa fase ainda embrionária que é ver se conseguimos montar 3 lotes de 33 milhões de vacina. Até segunda-feira estava mais fácil. Entre ontem e hoje, ainda hoje, muitas empresas estão ligando e saindo. Empresas cotadas na bolsa ou empresas que vendem bens de consumo logicamente que estão assustadas, mesmo que seja para o bem, para doação, tirar da fila 8 milhões de pessoas, as empresas começam a ficar preocupadas e que isso manche a imagem delas.”
O presidente da Abimaq falou sobre o preço das vacinas em questão, uma vez que o setor privado pagaria mais caro pelas doses disponibilizadas aos governos.
“Estas doses que estamos falando representam 0,02% do mercado. Dizer que 0,02% do mercado vai inflacionar os 99,99998% do mercado, isso não é crível.” E completou: “Então quer dizer, o preço, U$S 23, eu até digo pra você, não pelo custo, porque o custo deve ser muito menor do que isso. Mas o preço de mercado ainda é um preço baixo. Agora dizer que 11 milhões, ou 22, ou 33, dependendo de quanto a gente conseguir comprar, vai estar inflacionando o mercado? Isso não é verdade.”
Fonte: Blog da Julia Duailibi
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