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segunda-feira, outubro 12, 2020

Moro defende rever trecho do pacote anticrime que levou à soltura de André do Rap



O ex-ministro da Justiça Sergio Moro defendeu nesta segunda-feira (12), em entrevista à GloboNews, que seja revisto o trecho do pacote anticrime que levou à soltura do traficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap.


O habeas corpus foi concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello com base em um trecho do pacote anticrime – em vigor desde janeiro – que determina reavaliação das prisões preventivas em todo o país a cada 90 dias. Essa reavaliação não foi feita no caso do traficante libertado.


O projeto do pacote anticrime foi idealizado pelo então ministro Moro e por uma comissão de juristas, em 2019, mas essa regra foi incluída pelo Congresso Nacional. Moro ainda chegou a recomendar o veto do trecho, que acabou sendo sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro e entrou em vigor.


"Este é o momento de discutir a revisão dessa parte da lei, ou pelo Congresso, ou pelos tribunais", disse Moro. Segundo o ex-ministro, "daqui a pouco pode ter assassino sendo solto" com base no mesmo dispositivo.


Segunda instância

Na entrevista à GloboNews, Moro também defendeu que a soltura de André do Rap poderia ter sido evitada de outra forma: com a restauração da prisão após condenação penal em segunda instância.


Há onze meses, o STF mudou o entendimento vigente e estabeleceu que os condenados só podem começar a cumprir pena quando o processo transitar em julgado – ou seja, após esgotados todos os recursos.


O Congresso avalia projetos de lei que autorizam a prisão após condenação em segunda instância. Desse ponto em diante, os recursos apresentados não poderiam pedir a reavaliação das provas e dos fatos daquele caso, mas só questões de aplicação do direito.


Por isso, há juristas e autoridades que defendem o início da execução da pena a partir da condenação na segunda instância, mesmo que os recursos continuem a tramitar.


O traficante André do Rap já tem uma condenação penal em segunda instância. Por isso, se esse entendimento estivesse sendo aplicado, a prisão dele seria definitiva, e não preventiva.


"Essa [prisão após segunda instância] é uma pauta importantíssima, aí não tem mais prisão preventiva. Esse indivíduo nunca ia ser solto, porque já ia estar cumprindo pena, sem qualquer necessidade de nós pensarmos em falar em rever prisão preventiva", afirmou Moro.

Moro sugeriu, na entrevista, que o presidente Jair Bolsonaro aproveite a existência atualmente de uma base aliada maior e mais organizada no Congresso do que na época da votação do pacote anticrime.


"O presidente hoje tem um contato mais próximo com o parlamento, tem um controle maior. Penso que poderia, fica aqui uma sugestão, um conselho construtivo, utilizar esse poder e toda essa popularidade para tentar rever algumas dessas pautas", disse o ex-ministro.


Moro afirmou ainda que, como ministro da Justiça, atuou durante a tramitação do pacote anticrime para evitar inserções de temas que, na visão dele, seriam ruins para o texto.


"Fiz diversas reuniões no Congresso, com parlamentares, conversei amplamente dentro do Poder Executivo sobre esses temas. Talvez a falha tenha sido minha de não ter conseguido convencer as pessoas de que esses dispositivos não eram os melhores. Mas eu diria que eu, particularmente, tenho a consciência tranquila de que fiz tudo que podia para evitar algumas inserções", afirmou.



O caso André do Rap

André do Rap é um dos chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo. Ele foi libertado no sábado (10) após a concessão de um habeas corpus pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello.


Horas depois, o presidente do STF, Luiz Fux, suspendeu a decisão e determinou o retorno de André à prisão. No entanto, investigações apontam que ele viajou em um jatinho particular para o Paraguai.


Moro disse discordar da decisão de Marco Aurélio Mello. Segundo o ex-ministro, mesmo por esse entendimento, a solução ideal seria levar o caso ao juiz que determinou a prisão preventiva inicialmente.


"Me parece que a melhor solução, e eu não quero entrar em nenhuma controvérsia aqui envolvendo o Supremo Tribunal Federal, seja o entendimento de que isso [a revisão da prisão tem que ser provocado. Isso tem que ser exigido pelo juiz emissor da decisão, de primeira instância, normalmente", defendeu Moro.


"Se a questão for levada diretamente à corte recursal [o STF], que a corte recursal emita uma decisão pedindo que o juiz [de primeira instância revise, decida, aprecie a questão. E não simplesmente entender que [a prisão] se torna ilegal pelo mero decurso do tempo", disse.


Sugestões de Moro

Na entrevista, o ex-ministro fez ainda sugestões para tentar resolver o imbróglio jurídico. Veja algumas delas:


Interpretação da lei pelos tribunais

Na avaliação de Moro , o caminho mais curto é buscar uma correção via interpretação pelos tribunais. Ele defendeu que, a partir do julgamento em primeira instância, já não se aplicaria mais a necessidade de revisão a cada 90 dias.


"Ela está presa preventivamente, mas foi julgada. Normalmente, o juiz, na sentença, decide pela manutenção ou não da prisão preventiva e a sentença é o momento que o juiz tem essa oportunidade de fazer uma maior reflexão sobre o caso. E aí eu não vejo necessidade de isso ficar sendo revisto a cada 90 dias", disse.


Pedido da defesa

Outra possibilidade, na visão de Moro, é que os tribunais passem a entender que, não havendo uma decisão do juiz de primeira instância sobre a manutenção da prisão preventiva, isso não signifique a ilegalidade da prisão – mas, sim, a necessidade de um pedido da defesa para que o juiz analise a situação.


"Se a defesa vai ao tribunal para pedir que a prisão é ilegal porque o juiz se esqueceu de revisar é muito mais adequado que a defesa requeira diretamente ao juiz da primeira instância e não pular etapas dentro desse procedimento", afirmou.


Revisão da lei no Congresso

Para ele, o melhor caminho, embora mais longo, é que o Congresso, por meio de um projeto de lei, revise alguns dispositivos do pacote anticrime.


"Nesse caso específico, deixe isso expresso, que a revisão não é de oficio, que a revisão após a sentença não é mais necessária e que eventual falta de revisão tem que ser provocada ao juiz do processo e não diretamente às cortes de justiça", disse Moro.


Prisão em segunda instância

Mais uma saída, segundo o ex-ministro, seria a retomada da execução penal em segunda instância ou por uma mudança de entendimento do STF ou pela aprovação no Congresso de propostas legislativas, como a proposta de emenda à Constituição (PEC) 199, em tramitação na Câmara.


"Se tivesse sido aprovada essa PEC como foi prometido, esse indivíduo não teria sido solto. Se tivesse sido aprovado o projeto de lei 166 de 2019, do Senado Federal, que é mais fácil, esse indivíduo não teria sido solto", afirmou.


Fonte: G1

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